Quem riscou o fósforo? As queimadas na Amazônia já estão no centro de uma crise internacional e Bolsonaro é responsável, sim. O governo pode se esquivar o quanto quiser, mas há fuligem nas mãos do presidente e seus ministros. Como? Segura que vem thread.
Bolsonaro sempre deixou claro o descompromisso com o meio ambiente. No plano de governo, o texto de 81 páginas não tinha nenhuma proposta para a área a não ser extinguir o Ministério do Meio Ambiente, que ficaria submisso à pasta da agricultura.
vos.social/ecoo/eleicoes-…
Após eleito, Bolsonaro se apressou em cumprir a promessa. Eventualmente recuou, mas dando letrinha. Queria para o ministério “[…] uma pessoa voltada para a defesa do meio ambiente sem o caráter xiita, como feito nos últimos governo”.
www1.folha.uol.com.br/ambiente/2018/…
À parte a ignorância no uso do termo “xiita”, a escolha de Bolsonaro para a pasta do Meio Ambiente foi mais um testemunho do descaso. Ricardo Salles, do Partido Novo, tinha uma condenação por fraude ambiental. A cereja do bolo era o panfleto da campanha a deputado federal.
No dia da posse, em 1º de janeiro, Bolsonaro assinou uma medida provisória que transferia a responsabilidade pela demarcação de terra indígenas ao Ministério da Agricultura. A decisão era tão problemática que até Bolsonaro admitiu que foi um erro.
www1.folha.uol.com.br/poder/2019/08/…
Ao longo de janeiro, a narrativa do descaso foi intensificada com o esvaziamento da pasta do Meio Ambiente; com críticas ao que ele chama de “indústria da multa ambiental”; com a suspensão de contratos com ONGs; e com propostas de flexibilização do licenciamento ambiental.
Em fevereiro, essa narrativa foi posta a prova com o desastre de Brumadinho, em que 242 pessoas morreram. Isso porque uma das bases do discurso de Bolsonaro era justamente a desregulamentação do setor privado e restrição das ações de fiscalização.
vos.social/podcast/bendit…
Mas a tragédia não foi suficiente para se repensar o plano de ação na área ambiental. Nos primeiros 100 dias de governo foram liberados 152 novos agrotóxicos. A lista inclui produtos do mais alto “risco toxicológico” e que são proibidos em outros países.
greenpeace.org.br/hubfs/agrotoxi…
Bolsonro chegou aos seis meses de governo com a informação de que o desmatamento havia crescido 88% em junho - na comparação com o mesmo período do ano passado (Inpe).
vos.social/podcast/bendit…
O presidente reagiu da pior forma possível. Enquanto Salles disse que era "sensacionalismo", Bolsonaro disse que os números eram falsos e ironizou dizendo que era o “capitão motosserra”
Em julho, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, os números foram ainda piores. O desmatamento cresceu incríveis 278% em relação ao mesmo mês em 2018. E qual foi a resposta do governo? Demitir o diretor do Inpe, Ricardo Galvão.
vos.social/voos-literario…
Isso deu espaço a uma “narrativa do desmatamento” que funcionou como uma espécie de autorização moral para negligenciar o meio ambiente em nome do progresso. E isso trouxe tem repercussões também na economia e política internacional.
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Os números do Inpe foram um alerta sobre o problema da Amazônia, mas Bolsonaro continuou ridicularizando o tema. Chegando ao cúmulo de sugerir “fazer cocô dia sim, dia não” para reduzir a poluição ambiental.
A negligência com a preservação ambiental já ameaçava a concretização do acordo entre o Mercosul e a UE, mas a Alemanha resolveu tomar medidas práticas e congelou o repasse de R$155 milhões do Fundo Amazônia. A resposta de Bolsonaro? “Vai deixar de comprar a prestações”.
Mas a Alemanha não foi a única. A Noruega também congelou o repasse de R$ 133 milhões ao Fundo. Bolsonaro, além de chamar a atenção para o fato de que a Noruega não pôs fim á caça às baleias, sugeriu que o país usasse a verba para reflorestar a Alemanha.
E foi em meio a essa crise que começaram as queimadas na Amazônia, que agora estão fora de controle. A primeira reação de Bolsonaro foi culpar, sem provas, as ONGS. Ele sugeriu que as organizações ambientais estavam incendiando a floresta para poder culpá-lo.
O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, disse que “as nações européias mentem sobre o desmatamento no Brasil” e que não viajaria para ver as queimadas de perto. “Eu vou ver coisa mais importante.”
O ministro das relações exteriores, Ernesto Araújo, disse que o Brasil está sendo alvo de uma campanha internacional feroz e injusta. Segundo ele, a “crise ambiental” é apenas uma arma do “arsenal de mentiras da esquerda”.
O ministro da educação, Abraham Weintraub, entrou na discussão dizendo que a crise é falsa. Que é uma combinação entre agricultores europeus com a esquerda, ONGs e artistas revoltados com o fim da mamata. Porque loucura pouca é bobagem.
Todas essas declarações foram feitas após a NASA - sim, a NASA - divulgar imagens de satélite mostrando os estragos do incêndio na Amazônia, cuja fumaça se espalha por vários estados. “Apesar de ser temporada de queimadas no Brasil, o número de incêndios deve ser recorde.”
O problema é que o dinheiro não é suficiente e o Exército deve entrar em cena para a ajudar a conter o fogo. Mas o presidente, que dispensou os recursos da Alemanha e da Noruega, reclamou justamente da falta de recursos.
Mas a crise não para por aí. O tema já está sendo tratado como de extrema relevância para a comunidade internacional. Tanto que o presidente da França publicou um tuíte em que diz: “Nossa casa está queimando”. Macron convocou os líderes do G7 a discutir a emergência da situação.
Bolsonaro, acertadamente, chamou atenção para o pensamento colonial da mensagem de Macron. Mas o filho que pretende ser embaixador preferiu outra abordagem e compartilhou vídeo chamando o presidente Francês de idiota.
O problema é que Bolsonaro não percebe que se a soberania brasileira sobre a Amazônia está ameaçada, a responsabilidade é dele. E tem um detalhe muito importante: GUIANA FRANCESA, que faz fronteira com o Brasil. Sim, a Amazônia também é da França, embora o território seja menor.
Por esses e outros motivos, pode-se dizer que Bolsonaro riscou o fósforo. Enquanto a Amazônia queima, o presidente se esquiva.
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