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Análise ponto por ponto de "Os erros da Estratégia Nacional para o Hidrogénio (EN-H2)", aka, manifesto Anti-hidrogénio.

Fonte do manifesto: tertuliaenergia.pt
O Manifesto anti-H2, assinado por várias personalidades, apresenta em 30 pontos uma crítica à recente apresentada “Estratégia Nacional para o Hidrogénio”, ou EN-H2.
De entre as personalidades destacam-se:
- Mira Amaral, engenheiro e ex-ministro;
-Henrique Neto, empresário e candidato a presidente da república;
- José Luís Pinto de Sá – professor do IST, autor do blogue (a-ciencia-nao-e-neutra.blogspot.com) e conhecido crítico da política energética Portuguesa ();
- Clemente Pedro Nunes - Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico e autor do artigo da “Quimera do Hidrogénio” recentemente publicado no ECO (eco.sapo.pt/opiniao/as-pot…)
Na análise serei o máximo imparcial possível, apresentando apenas evidências técnico-económicas sem tecer opinião.
Marco argumentos validos com ✔️, inválidos com❌ e imprecisos com ❓.
Os primeiros 9 pontos não se referem directamente ao tema do H2 verde. São apenas um conjunto de considerações sobre o plano de recuperação económica pós-Covid-19.
✔️Os custos para o consumidor não são quantificados nem estimados no EN-H2. Não existe uma estimativa de qual será o custo de produção do H2, sendo impossível estimar o custo do seu consumo, quer directo ou indireto (ex: através da queima em centrais termoeléctricas a gás).
✔️As tarifas feed-in (sobrecusto PRE), bem como a necessidade de activação dos back-up por causa da intermitência das fontes de energias renováveis intermitentes (IRES), fizeram aumentar o preço da electricidade.
(cont.)
Ao contrário de um aumento de impostos, normalmente progressivo, os elevados preços de electricidade de facto afectaram desproporcionalmente mais as classes desfavorecidas.
✔️Muitos países desenvolvidos e até com melhores condições de clima p/utilização de IRES, tal como Austrália e EUA, preferiram esperar pelo momento certo para entrar neste mercado, isto é, até as economias de escala tornarem estas fontes competitivas em relação às concorrentes.
(cont.)
Portugal hoje em dia está longe de ter uma pegada de carbono tão baixa como a França nuclear, apesar do grande investimento que fez em energias renováveis. Para efeitos comparativos os 22 000 M€ que o manifesto refere dariam para pagar 4 centrais nucleares cada uma de...
(cont.)... potência instalada de 1 GWe. Estes 4 GWe produziriam com um factor de capacidade de 85% cerca de 29.7 TWh por ano. Mais do dobro do que os 7 GW de IRES (PV + vento) produziram em 2019 (13.6 TWh).
(cont.) Ou seja, de grosso modo apenas seriam necessárias duas centrais desta dimensão para produzir a mesma energia, sendo óbvio que a opção nuclear teria custado metade aos consumidores portugueses.
❓Esta frase carece de prova. Quando a energia proveniente de IRES é vendida ao estrangeiro por um valor mais baixo que a tarifa, o sobrecusto daí resultante continua a recair no consumidor Português?
❓Para países já desenvolvidos será mais fácil realizarem estes investimentos. Depois de mitigados os grandes emissores, poder-se-ia focar nos mais pequenos. No entanto alguém tem de dar o primeiro passo. O argumente é valido em teoria, mas na prática o facto é que os...
(cont.)... grandes poluidores têm mostrado inércia em querer fazer a transição energética.
Infelizmente o manifesto utiliza para o caso Português o mesmo argumento usado por Trump para sair do acordo de Paris (ver imagem).
❌Países como a Alemanha 🇩🇪, França 🇫🇷, Bélgica 🇧🇪, Japão🇯🇵 e China 🇨🇳 já têm planos para uma economia de hidrogénio. Portugal não está sozinho nesta estratégia.
lci.fr/sciences/video…
✔️Apesar da adjectivação enviesada utilizada neste excerto, é verdade que as tarifas feed-in serão mantidas.
(cont.) A proposta que consta no EN-H2 consiste em dar a opção ao produtor beneficiário da tarifa feed-in de alterar a sua produção para hidrogénio verde em vez de injectar a energia produzida na rede eléctrica.
❌O manifesto dá a opinião que são os promotores que têm de suportar os custos de desenvolvimento. No entanto se assim for a tecnologia nunca será viável e a descarbonização nunca se fará.
(cont). Infelizmente a aquecimento global não vai esperar que se sejam os promotores a financiarem sozinhos esta tecnologia sem incentivos.
❌Este ponto mostra falta de coerência. No ponto 15 é alegado que não há nenhum país interessado na tecnologia. Mas neste excerto já se fala de investimentos pioneiros na 🇧🇪.
❓Este argumento pode ser inválido. Instalar uma maior capacidade de produção de hidrogénio pode ter vantagens de rentabilidade económica no que toca às economias de escala.
✔️Uma vez que no EN-H2 não é quantificado o impacto no preço por kWh da adição de H2 na rede de gás natural, não é possível fazer comparações. No entanto o manifesto estima que o H2 produzido por energias renováveis será até 3x mais caro que o gás natural.
Para confirmar este número comece-se por analisar o preço do gás natural. O preço dos futuros de gás natural oscilam sazonalmente entre os 10 €/MWh e 30 €/MWh. Para o hidrogénio ser 3x mais caro, significaria que seria comprado no máximo a 90 €/MWh.
galp.com/pt/pt/empresas…
Uma vez que 1 MWh de H2 necessita de 1.33 MWh de eletricidade, o preço da electricidade para produzir este H2 seria de 120 €/MWh. Este valor é 20% acima do valor médio estimado pela ERSE para o sobrecustos dos PRE em 2020 (102.5 €/MWh).
expresso.pt/economia/2019-…
(cont.) Confirma-se o valor apresentado pelo manifesto, apesar de ser ~20% acima do sobrecusto dos PRE.
❌ Existem já automóveis movidos a hidrogénio, tais como, Toyota Mirai, Hyundai Nexo, Hyundai ix35, Honda FCX Clarity, etc...
Existe também uma aposta da BMW neste tipo de veículos.
❓Não foi clara esta confusão aquando da minha leitura deste relatório. O manifesto devia ter indicado onde esta foi realizada.
✔️Para complementar este ponto importa referir que este processo de armazenamento de energia é altamente ineficiente. Considere-se por exemplo um dos 3 grupos da central do Ribatejo (400 MWe).
(cont.) Para produzir electricidade neste grupo é necessário fornecer cerca de 750 MW de calor (53% de eficiência).
Esse H2 foi produzido com electricidade oriunda de IRES por intermédio de electrolisadores com eficiência de 75% Ou seja, é necessário 1 GW de ...
(cont.) eletricidade renovável para extrair 0.4 GW de electricidade da central do Ribatejo (rendimento de 40%). Isto sem contar com perdas na compressão ou liquefação, transporte e armazenamento do H2, que podem representar perdas adicionais até 30%.
✔️Neste argumento não é claro:
- porque é usado o valor de 25 €/MWh. Como referi nos pontos 10 e 19, não consta no EN-H2 nenhum valor em relação ao custo de produção do H2;
- o factor de capacidade utilizado (50%);
- como os autores do manifesto obtém o valor de 1.7 €/kg.
Para verificar estes valores resolvi fazer uma análise económica do investimento. Pressupostos:
- investimento de 2.85 mil milhões de € é realizado em 2021
- projecto dura até 2050;
- taxa de juro de financiamento de 2%;
...
...
- despesas de manutenção e operação anuais de 0.1% do investimento total, isto é, 14 M€;
- retorno do investimento em 2041 (NPV = 0);
- custo da electricidade para produção de H2 de 25 €/MWh.
...
- exclusão os custos de compressão, armazenamento e purificação da água para utilização no eletrolisador.
- perfil de evolução de produção indicado na figura 27 do EN-H2.
Este investimento tem um IRR (Internal Rate of Return) de 6% com um preço do hidrogénio de 3.88 €/kg, isto é 116 €/MWh. Isto é mais de 3 vezes superior ao preço do gás natural.
Este valor é semelhante ao previsto pela Bloomberg NEF e apresentado há 3 dias pela Scottish Development International (best case 3.72 $/kg ou 3.22 €/kg). É também idêntico ao limite superior indicado pelo manifesto (2 a 3 vezes superior a 1.7 €/kg).
Para tornar se obter o tal valor idêntico a 1.7 €/kg ou 57 €/MWh seria necessário:
- ter uma IRR = 0%;
- estender o ano de retorno para 2050;
- considerar uma taxa de juro do financiamento 0%.
Ao preço resultante de 1.9 €/kg , a electricidade produzida numa central de gás custaria 105 €/MWh, o dobro do preço de referência da ERSE. Este valor confirma os cálculos dos autores do manifesto.
✔️Em pleno funcionamento a central produzirá cerca de 6.3 kg/s de H2. Para isto é necessário 56 L/s de água pura e destilada. Não é claro como os 20 €/MWh foram calculados. É verdade que a água teria de ser purificada ou destilada e não são referidos esses custos na EN-H2.
❌Não é verdade que não existem águas residuais na região. A ETAR de Ribeira de Moinhos situada a 7 km da refinaria da GALP, produz, segundo o site das Águas de Santo André (adsa.pt/atividade/agua…), cerca de 250 L/s de efluente que é lançado ao mar através de um emissário.
(cont.) Na EN-H2 fala-se de possível sinergia entre os sectores das águas residuais e do hidrogénio, no entanto não apresenta soluções técnicas comprovadas que a justifiquem, nem contabiliza os custos para purificação das águas.
Os pontos 27 a 30 comparam o investimento em causa com a aposta em energias renováveis, que foi feita nos anos 2000, e afirma que o dinheiro seria mais bem empregue noutras áreas.
Termina com a conclusão de que deviam ser primeiro os países mais ricos a realizar esse investimento, uma vez que podem suportar os custos, e não países pobres como Portugal que apenas viriam a sua competitividade esmagada por aumento dos custos de produção.
A adopção em massa de novas tecnologias raramente é feita por países em vias de desenvolvimento, pois o fardo do investimento nessas tecnologias ainda em fase de maturação é demasiado grande.
Em suma o manifesto anti-hidrogénio tem alguns pontos válidos na critica que faz à falta de analises técnico-financeiras da EN-H2. No entanto peca em não apresentar soluções alternativas de mitigação do aquecimento global. Remete esse fardo para os países desenvolvidos.
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