Thread by @fef32ffwffrgdg

Vou resumir os últimos 37 anos da política brasileira segundo minha memória, que até é boa, mas sempre tem uns gaps!

Em 1984 um monte de artista famoso no palanque com um monte de político famoso exigindo eleições diretas para presidente! O nome da emenda constitucional era "Dante de Oliveira", que eu achava que era uma senhora. Foi lindo, mas Floodou!

Sim. No tweet anterior tinha foto da Christiane Torlone com o João Dória em evento das Diretas. Mas teve também Lula, Casagrande, Osmar Santos e Dr Sócrates!

Logo em janeiro de 1985, teve eleição indireta para presidente (o primeiro civil em 21 anos). Eu lembro que foi meio que esquema de Playoff e a final foi Tancredo Neves x Paulo Maluf. Também lembro que tinha umas promoters no congresso as "Malufetes". Tancredo venceu!

Em março, no dia anterior à posse, Tancredo é internado e quem assume a presidência é Sarney, que não tinha preparo nenhum para o cargo. Tancredo morreu em abril, comoção nacional, Coração de Estudante tocando na TV enquanto o povo chorava.

Vocês acham que Teoria da Conspiração é coisa nova? Nessa época falaram que o Tancredo tinha tomado um tiro de 22 (arma de matador) na Catedral de Brasília. Na missa, faltou luz e os presentes juram que ouviram um tiro. Só a Glória Maria viu. Por isso mandaram ela para o exterior

Nessa época, o Brasil tinha dois grandes inimigos: INFLAÇÃO E DÍVIDA EXTERNA! A inflação era uma parada muito louca. Era tipo assim: de manhã o pão custava Cr$1.000 e de noite já tava Cr$1.250. No início do mês você recebia o salário e uma semana depois ele não valia mais nada!

O Ministro da Fazenda, Dilson Funaro, fez um plano para acabar com a Inflação e a Divida Externa: deu calote no FMI, congelou e tabelou os preços de tudo, cortou 3 zeros da moeda e mudou o nome de Cruzeiro para Cruzado.

O Dilson Funaro era inclusive dono da Trol, empresa de brinquedos que produzia o Playmobil e o TCR!

O Sarney, que começava todo discurso com "Brasileiros e Brasileiras...", pediu para a gente fiscalizar se os estabelecimentos comerciais estavam cumprindo os preços da tabela. Para denunciar, você ligava na Superintendência Nacional de Abastecimento (SUNAB), no telefone 198.

Eu lembro que liguei para a SUNAB para denunciar a cantina da escola que estava vendendo Coca mais caro que na tabela. Mas descobri que era um engano. O preço da tabela era da Coca KS e na cantina era de máquina, que era mais cara mesmo!

Com o congelamento de preços, os mercados e açougues passaram a tirar os produtos das prateleiras porque não compensava vender por aquele preço. Minha mãe comprou uma peça de alcatra no mercado negro (mais cara que a tabela). Quem vendeu foi o empreiteiro do prédio que eu morava.

Bom, resumindo, a inflação voltou, o ministro foi demitido e entrou outro em 1987. Bresser Pereira, um tio que resolveu acabar com a Inflação e com a Divida Externa com a mesma estratégia: calote na divida e congelar tudo. Lógico, floodou de novo!

Entrou um novo ministro, o Mailson da Nóbrega. Ele tinha uma missão: exterminar a Inflação. O que ele fez? Congelou os preços e salários, cortou 3 zeros da moeda e trocou o nome de Cruzado para Cruzado Novo! Não preciso falar que floodou também!

Só para vocês terem uma ideia de como era mambembe, as notas de Cruzados eram carimbadas com o novo valor em Cruzeiros Novos. Então a nota de 100.000 cruzados vinha carimbada com o valor de 10 Cruzados Novos.

Imagina viver em um país que tem nota no valor de 100.000 e essa nota não vale porra nenhuma!

Hoje me pergunto se os Ministros da Fazenda do governo Sarney quando entravam não perguntavam para o anterior o que tinha dado errado! Mas vida que segue e a HIPERINFLAÇÃO comendo solta em 1987.

Em 1988, o Ulysses Guimarães levanta a nova constituição brasileira! A próxima eleição seria direta e todo mundo queria ser presidente!

Em 1989 começa a aparecer um jovem político alagoano, então governador, que se recusava a pagar salários milionários de funcionários públicos fantasmas. Aparecia direto no Jornal Nacional, na Veja, etc! Esse cara, Fernando Collor, virou herói nacional.

A eleição de 1989 foi minha primeira experiência (e a de muitos brasileiros) com o pleito nacional. Praticamente todos os grandes políticos do país eram candidatos!

Maluf se pegando com o Brizola, Lula acusando Collor, Covas lançando o melhor Jingle de todos os tempos, Ronaldo Caiado citando Nostradamus montado em um cavalo branco (é sério).

Era a estreia do Enéas, mas tinha o Marronzinho e o Roberto Freire ainda era Comunista! Tinha o Gabeira e o Aureliano Chaves! E, QUASE TEVE O SILVIO SANTOS!

Na época da eleição, eu tinha 13 anos e pegava minha prancheta do Capitão América e ia para as ruas de Copacabana fazer pesquisa!

Bem, o Collor venceu e esse fio eu vou contar aos poucos. Amanhã eu continuo...

Collor venceu e no dia seguinte fez o que dizia que Lula faria se fosse eleito: confiscou a grana da galera. Todo mundo que tinha mais de NCz$50.000 em conta ou poupança, teve o excedente confiscado pela Zélia Cardoso de Melo.

A história de que o PT faria o mesmo se deve ao fato de que esse plano foi oferecido aos dois candidatos do 2º turno. Em geral, a grande maioria dos economistas (de Esquerda e Direita) consideravam um bom plano.

Teve também o congelamento de preços tradicional, a moeda mudou de Cruzados Novos para Cruzeiro, mas não cortou os 3 zeros! Floodou também e em meses, a inflação já estava completamente descontrolada de novo!

O Ministério do Collor era bastante peculiar! Tinha um ministro do Trabalho sui generis, o Antonio Rogério Magri, sindicalista da Central Geral dos Trabalhadores (CGT) que usava termos nada ortodoxos.

Num dia ele dizia que "o Plano Collor é Imexível", no outro dizia que sua cadela (que foi ao veterinário em carro oficial) também era um ser humano como todo mundo! Ele foi pego recebendo propina de US$30.000 e foi demitido!

Tinha o casal Zélia Cardoso de Melo (Economia) e Bernardo Cabral (Justiça) que protagonizaram um "tórrido romance" embalado por Bésame Mucho e narrado detalhadamente pelos jornalistas políticos de Brasília! Como teria dito o presidente "isso é nitroglicerina pura".

Alguns highlights do cotidiano do Governo Collor: o cooper de manhã, vestindo camisetas com mensagens motivacionais eram uma rotina diária!

Outra marca, eram os eventos radicais como andar de Jet Ski, voar de caça F-5, lutar Karatê, atirar de fuzil... Ele foi o precursor do estilo Putin de "masculinidade".

Como dissemos anteriormente, Sarney começava os discursos com "Brasileiros e Brasileiras...". Color começava seus pronunciamentos prolixos com "Minha Gente..."

Nessa época também tinha Teorias da Conspiração e prováveis fake news. Falavam que a Cláudia Raia ajudava "seu amante" Collor, botando supositório de cocaína no rabo dele e falava-se de rituais de magia negra na Casa da Dinda (como chama a casa do Collor em Brasília) entre outros

Collor fez menos do que se esperava e logo começaram a aparecer escândalos de corrupção. O primeiro que eu lembro foi a reforma da "Casa da Dinda" com sobras de campanha. Collor não foi morar no Palácio da Alvorada para demonstrar humildade, mas...

Depois teve a denúncia do motorista Eriberto, a delação do irmão Pedro Collor sobre o esquema PC Farias, o Fiat Elba... O lance do Pedro, diziam as más línguas, tinha a ver com o envolvimento de Fernando com a belíssima Thereza Collor, esposa de Pedro. Mas acho que era só boato!

Com a Economia na merda e os escândalos de corrupção, Fernandinho viu sua popularidade despencar! Os caras pintadas, estudantes contra Collor, liderados pelo atual vereador do Rio, Lindbergh Faria, foram para as ruas protestar.

Em 1992, pouco antes do impeachment, Collor fez um apelo "NÃO ME DEIXEM SÓ", mas a galera deixou ele sozinho mesmo e o congresso abriu processo de reyira-lo do cargo. Ele até renunciou na última hora, mas o Senado ignorou e continuou votando o impeachment.

O Governo Collor nos deixou alguns legados. A liberação da importação de automóveis, que modernizou a indústria automotiva nacional foi um deles.

Outra herança foi o Marco Aurélio Mello, primo de Collor, que foi nomeado Ministro do STF por ele e que tá aí fazendo merda até hoje!

Collor também revelou ao mundo Roberto Jefferson. Um tipo de parasita fisiológico que se agarra às bolas dos governantes e tenta sugar o máximo que pode! Na época, ele parecia o Mocotó, da Malhação!

As confusões da Família Collor também renderam dois ensaios da revista Playboy. Um, da Wanya Guerreiro, suposto interesse romântico de PC Farias e Pedro Collor e outro de uma linda estudante cara pintada que infelizmente não lembro o nome, mas saiu na edição 207, das Trigêmeas.

Se alguém souber o nome da "Cara Pintada" me avise, porque não consegui lembrar de jeito nenhum e, mesmo pesquisando, não achei!

Com Collor impedido, assumiu mais uma vez o vice. Dessa vez, foi Itamar Franco, um mineiro que gostava de Fuscas, Carnaval e, óbvio, Pão de Queijo. Mas isso fica para outro dia...

O governo Itamar foi curto. Lembro de poucas coisas marcantes, mas uma delas mudou o Brasil.

Itamar Franco, como lembrou um seguidor, era "mineiro" mas nasceu no meio do Oceano Atlântico. Suas características mais marcantes eram o imenso topete e a pouca liturgia no cargo.

A primeira medida de Itamar que eu me lembro foi a retomada da fabricação do Fusca no Brasil, o que ia na contramão do que preconizava Collor. Até hoje, os Fuscas fabricados nessa época são chamados de Fusca Itamar!

O segundo fato mais marcante desse mandato foi um click do Carnaval de 1994. O presidente foi para a Sapucaí assistir o desfile das Escolas de Samba junto a seu Ministro da Justiça. Ambos estavam no camarote em estado de embriaguez e assediando as passistas...

Uma dessas passistas foi a modelo Lilian Ramos, que deu trela para o PR e acabou parando dentro do camarote. Quando levantou os braços, foi flagrada sem calcinha ao lado do presidente.

Hoje em dia, devido aos disparates extremos do PR, esse evento pode parecer uma bobagem, afinal, Itamar era solteiro, desimpedido e estava de folga. No entanto, na época não foi bem assim.

A foto do carnaval quase derrubou o presidente - ele agiu de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo - e fez cair o Ministro da Justiça, Maurício Corrêa, que pouco tempo depois foi recompensado com uma indicação para o STF.

Durante o governo do Topete, tivemos também um plebiscito peculiar para decidir qual modelo de governo o brasileiro queria: Presidencialismo ou Parlamentarismo e Monarquia ou República.

Na época, vimos uma campanha da ~Família Real~ sob o slogan "Vote no Rei" e o jingle que dizia "Quem já foi Rei não perde a majestade" mostrando total incoerência, visto que o último monarca brasileiro foi Imperador e havia morrido há mais de 1 século!
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Monarquistas tiveram pouco mais de 13% dos votos. Dá para ver que na época já tinha gente completamente sem preparo...

Mas eis que Itamar, que recebera vaias no sambódromo e não tinha uma popularidade lá muito alta, deu a volta por cima. Itamar tinha convidado o então Ministro das Relações Exteriores, Fernando Henrique Cardoso para ser o novo Ministro da Fazenda (Economia).

Em 1993, FHC instituiu o Cruzeiro Real para substituir o Cruzeiro. Foi aquela história que vocês conhecem: muda o nome, corta 3 zeros... Mas não teve congelamento de preços. As cédulas tinham efígies de brasileiros típicos. Nesse ano, a hiperinflação chegaria a 2.300%.

Paralelo a isso, era criado o Plano Real, que, BEM RESUMIDAMENTE, adotou o câmbio fixo com o valor da moeda equivalente ao do dólar, equilíbrio das contas públicas e mudança da moeda SEM CORTAR OS 3 ZEROS!

Acho que parte do sucesso do Plano Real foi porque alguns dos economistas da equipe também fizeram parte do Plano Cruzado e sabiam o que tinha dado errado!

Mas, FHC, precisou sair do Ministério da Fazenda para concluir seu plano pessoal - ser Presidente. Para seu lugar, Itamar botou o cover de Sr Burns, Rubens Ricupero, que botaria o Real na rua em julho e seria protagonista de mais um highlight desse governo.

Ricupero estava em um programa de TV dando entrevista para o jornalista Carlos Monforte, seu cunhado, e antes de ir ao ar, batia papo e dizia "Eu não tenho escrúpulos; o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde."
(02:48)

Acontece que a conversa foi transmitida para um seleto público no país: todo mundo que tinha antena parabólica! O caso ficou conhecido como "Escândalo da Parabólica" e o ministro caiu 5 dias depois.

Para o lugar de Ricupero, foi chamado o jovem economista cearense Ciro Gomes, então no PSDB.

O sucesso do Plano Real em acabar com a Inflação foi o bastante para eleger Fernando Henrique no primeiro turno da eleição de 1994. Já Itamar entregou um país melhor do que recebeu. E, por hoje é só!

Na Eleição de 1994, FHC teve 54% dos votos no 1º turno, vencendo Lula (PT), que teve 27%, mas o destaque foi Enéas Carneiro (PRONA), que ficou em 3º, com 7,38% e que superou figurões como Orestes Quércia (PMDB, hoje MDB) e Leonel Brizola (PDT).

FHC trouxe um Brasil sem hiperinflação, que era o principal problema do país nos anos anteriores e acumulara 13 trilhões e 342 bilhões por cento de 1979 a 1994. Acreditem, isso foi uma vitória do caralho!

O governo FHC começou bem. Como um sonho, na realidade. A inflação tinha caído e o Dólar valia o mesmo que o Real. Se fosse um filme, teria que acabar aqui com "...e viveram felizes para sempre!"

Mas a realidade é que a vida é um pouco mais sórdida e a política é mais imunda que a própria realidade. O 1º escândalo dessa época, acho que foi do SIVAM - Sistema de Vigilância da Amazônia, que iria monitorar, por meio de satélites, o espaço aéreo amazônico.

Para a compra de equipamentos do sistema, foi aberta uma licitação. Duas empresas estavam no páreo, uma americana, outra francesa. Acontece que a Isto É teve acesso a ligações telefônicas envolvendo funcionários de primeiro escalão do governo e da empresa americana.

E não foi só isso. Teve espionagem envolvendo a CIA e a NSA. Grampo telefônico, ligações de FHC para Clinton, tráfico de influência e uma CPI barrada pelo congresso, que àquela altura, era em sua maioria governista.

Mas o episódio acabou fedendo para o Ministro da Aeronáutica, Brigadeiro Mauro Gandra e para o chefe do cerimonial da Presidência da República, embaixador Júlio César Gomes, que rodaram.

Depois teve o escândalo da Pasta Rosa. E, não, essa pasta não tinha a ver com promoters que fazem programa após os eventos.

Resumindo muito, o escândalo não foi diretamente ligado ao governo federal no início, mas a um de seus maiores apoiadores: Antônio Carlos Magalhães, o Toninho Malvadeza e o PFL (atual DEM), partido do vice, Marco Maciel.

Inclusive, o Marco Maciel, dizia-se à época, "de frente, parece que está de lado e, de lado, parece que já foi embora."

O Banco Econômico, muito mal das pernas, sofreu uma intervenção do BC. Acontece que o Banco Econômico é da Bahia e a Bahia era de ACM. Ele ficou putasso e saiu gritando aos quatro ventos que ia fazer e acontecer.

Na auditoria do Econômico, agentes do Banco Central acharam uma pasta cor-de-rosa na sala do Angelo Calmon de Sá, dono do banco. Essa pasta tinha uma lista de políticos que receberam doações ilegais para campanha.

Alguns nomes dos beneficiados eram José Sarney (MDB), José Serra (PSDB e Ministro do Planejamento), Luis Antonio Magalhães (PFL) e seu pai ACM, que teria recebido 40% da verba de campanha do Econômico. E vocês achando que o PT inventou esse negócio de corrupção.

Além de os políticos serem aliados do FHC, teve o agravante do Econômico ser beneficiário do PROER - Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional e recebeu R$3 bi. Resumindo, Programa de ajudar Banco com Dinheiro Público.

Ou seja, nós pagamos as doações de campanha. Parece familiar?

Um a parte: os bancos estavam mal das pernas porque suas atividades lucrativas eram baseadas na hiperinflação e com a estabilização da moeda, eles não podiam lucrar tanto às custas do povo. Então, o governo resolveu ajuda-los!

Como dizia-se na época, o caso acabou em Pizza. O PGR da época, Geraldo Brindeiro, arquivou o caso. Aliás, Brindeiro ficou conhecido como ENGAVETADOR GERAL DA REPÚBLICA. E vocês achando que o Bolsonaro inventou o PGR cachorrinho na coleira.

Outro a parte: segundo a Wikipedia "De 626 inquéritos criminais que recebeu, engavetou 242 e arquivou outros 217. Somente 60 denúncias foram aceitas. As acusações recaíam sobre 194 deputados, 33 senadores, 11 ministros e quatro ao próprio presidente FHC."

Outro escândalo do governo FHC foram as privatizações de empresas estatais. Eu particularmente não sou contra privatização em geral. Depende de cada caso. O problema é que nessas privatizações, os amigos do rei se deram bem.

A privatização mais emblemática foi da Companhia Vale do Rio Doce. A empresa era avaliada em R$30 bi e foi vendida por R$3,3 bi. Um ano depois, os novos donos divulgaram lucro de R$1bi.

Um fato irrelevante do governo, mas que chamou muita atenção e ficou gravado na minha memória, foi a meia furada do FHC. O país se perguntava se ele não tinha um trocado para comprar uma meia nova.

O que FHC certamente não tinha, era direito a um segundo mandato. A Constituição de 1988 não previa reeleição, mas o presidente precisava de mais tempo para implementar seus planos. Para isso, ele precisava de mais 4 anos.

A Emenda Constitucional 17, de 1997, permitiu um segundo mandato para FHC. Mas a que custo? Alto, com certeza. Para aprovar a emenda, entrou em curso um mega esquema de compra de votos. E vocês achando que o Lula inventou isso! Heheheheh

Além da tradicional distribuição de cargos e emendas parlamentares, teve pagamento em cash. Em gravações, os deputados federais Ronivon Santiago e João Maia, ambos do Acre (PFL, hoje DEM), diziam ter recebido R$ 200 mil em dinheiro para votar a favor da reeleição.

Apesar das denúncias, o PGR - aka Engavetador Geral da República - não aceitou as denúncias contra FHC.

Bom, os escândalos pouco importam, porque a economia ia bem. Como eu disse nessa thread -

https://twitter.com/cancerjack/status/1301537315274272768?s=21

- o brasileiro não se indigna com corrupção. O brasileiro só reage quando falta dinheiro no bolso.

Assim sendo, FHC se reelegeu em 1998, derrotando Lula ainda no primeiro turno, com 53% dos votos.

FHC foi reeleito com base na estabilização da economia, mas a economia não estava tão estabilizada e já no primeiro mês do 2º mandato, o Real se desvalorizou e a Inflação voltou a crescer.

O governo sabia que não era possível segurar a inflação e o câmbio por muito mais tempo, mas conseguiu segurar tudo até o presidente estar reeleito. E vocês achando que a Dilma inventou o estelionato eleitoral!

O dólar que tinha câmbio fixo, passou a ter câmbio flutuante, assim sendo, ele passou de R$1,20 em dezembro de 98, para R$2,16 em março de 99. Bateu uma saudade desse problemão, né?

A Inflação também voltou a crescer! Não como nos tempos de Sarney e Collor, mas o bastante para preocupar todo mundo. Em 1998, o Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M) foi de 1,79%. Em 1999, foi de 20,10%.

Mas verdade seja dita, o período FHC não foi tão ruim como parece nessa thread. Algumas iniciativas na área social foram importantes. A Rede de Proteção Social criada em 1995, começou a ganhar corpo no segundo mandato.

Lá em 1995, o então Governador dos Distrito Federal filiado ao PT, Cristovam Buarque, criou um programa que garantia renda para famílias que mantivessem crianças de 7 a 14 anos na escola. O nome do Programa era Bolsa Escola.

FHC curtiu a ideia e implantou o Bolsa Escola nacionalmente, via Ministério da Educação. Junto a ele haviam outros programas como o Auxílio-Gás (Ministério de Minas e Energia) e o Bolsa Alimentação (Ministério da Saúde) E vocês achando que o Lula inventou programas sociais!

Outro destaque muito positivo foi a implantação dos Medicamentos Genéricos, em 2001. A implementação foi feita pelo então Ministro da Saúde, José Serra, mas o idealizador foi o Deputado Federal Eduardo Jorge (na época no PT, hoje no PV).

Mas aí teve a época do Apagão. Ao que tudo indica, o Brasil com a economia estabilizada, passou a consumir mais e assim, gastar mais energia elétrica. No entanto, não houve um investimento na infraestrutura energética do país.

2001 choveu muito pouco, o que fez diminuir sensivelmente a produção de energia nas hidrelétricas. O governo teve que fazer uma campanha de racionamento. Caso a campanha falhasse, seriam programados blackouts (apagões) em todo país.

Os apagões não chegaram a acontecer. Não foi preciso. O racionamento deu certo. Entretanto, um mega blackout aconteceu em 2002 por conta de uma falha monstra no sistema. Nove estados e o DF ficaram horas sem energia elétrica.

Juntando planos econômicos, meias furadas, escândalos de corrupção e
Apagões, FHC deixou um país melhor do que era antes. O PIB cresceu, algumas ideias de programas sociais foram implantadas, a renda aumentou, a inflação não disparou e o país passou bem por 2 grandes crises.

A ideia do PSDB era, lógico, permanecer no poder. Para isso, escolheram José Serra (que já tinha sido Ministro do Planejamento e da Saúde) como candidato. Mas essa eleição fica para outro dia.

Lembrando que faço esse fio da seguinte maneira. Eu puxo na minha memória alguns fatos marcantes dos governos e pesquiso alguns dados para detalhar. Eu não me lembro de cabeça, por exemplo, o IGP-M e o câmbio de 1999.

Essa parte da thread é sobre o período das eleições de 2002 e não sobre um governo em si. Acho que foi um marco importante para a história política do país. Então vamos lá!

Luis Inácio Lula da Silva, torneiro mecânico, retirante nordestino, líder sindicalista, um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores, radical e já havia concorrido 3 vezes à presidência da república sem no entanto lograr êxito.

Em 2002, lá estava ele novamente como candidato do PT.

No início do ano, José Serra ainda não era uma figura conhecida do grande público e quem avançava nas pesquisas como opção à Lula, era a governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL, hoje DEM), filha do ex-presidente José Sarney.

Em fevereiro, Roseana Sarney já tinha conquistado um empate técnico com Lula em pesquisa Datafolha. Porém, Roseana teve seus planos interrompidos por um pequeno detalhe.

Em março, a Polícia Federal fez uma operação em uma empresa de Roseana e apreenderam R$1,34 milhão não declarados. O marido da candidata, Jorge Murad, sócio da empresa, deu 7 versões diferentes para a origem do dinheiro.

As imagens da operação da PF vazaram nos meios de comunicação e, diante do escândalo, Roseana retirou sua candidatura em abril!

Roseana Sarney não era mais um problema para Lula, mas o mercado sim.

O Mercado tinha pavor de Lula e que ele, como crítico ferrenho de FHC e do Plano Real, cagasse a economia e saísse aplicando calotes. Com Lula aparecendo forte nas primeiras pesquisas, o Risco Brasil (que mede a confiança de investidores no Brasil) subiu.

Como eu mencionei, Lula estava em sua 4ª tentativa de chegar ao Planalto, tendo sido derrotado por Collor em 1989, e 2 vezes por FHC no 1º turno. Diz um ditado atribuído à Albert Einstein que "Insanidade é fazer sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes".

Então, Lula resolveu fazer diferente. Para isso, foi redigida em junho de 2002 a "Carta ao Povo Brasileiro" - que pode ser lido aqui na íntegra www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/u… - criticava duramente a política econômica e social de FHC.

A carta falava em mudança, mas acenava ao mercado, garantindo que ele respeitaria os contratos nacionais e internacionais. Era uma tentativa de cachimbo da paz entre Lula e o Setor Financeiro. Parte do Mercado comprou a ideia.

Outra parte não estava convencida e o Risco Brasil atingiu 2.436 pontos em setembro, recorde do indicador. O dólar disparou e, em outubro, bateu R$3,95 - o que equivale a uma cotação de R$10,79 hoje. A Inflação também foi pro caralho, terminando o ano acima da meta estabelecida.

Outra mudança foi a escolha do candidato à vice-presidente. Nas eleições anteriores, Lula escolheu políticos da Esquerda (José Paulo Bisol/PSB 89, Aloizio Mercadante/PT 94, Leonel Brizola/PDT 98). Em 2002, optou por José Alencar, político e empresário, à época, filiado ao PL.

Enquanto Lula lutava para se vender como um candidato menos radical, José Serra e Ciro Gomes (na época no PPS) disputavam o 2º lugar nas pesquisas, que levaria um dos dois ao 2º turno com Lula. datafolha.folha.uol.com.br/eleicoes/2002/…

Acontece que, em um programa de Rádio na Bahia, Ciro Gomes, que já era esquentado, perdeu as estribeiras. O programa era ao vivo, com participação dos ouvintes e estava sendo filmado. Estava formada a Tempestade Perfeita.

Os ouvintes eram agressivos com Ciro Gomes e um deles disse que "do jeito que ele fala, parece que vai ser presidente da Suíça". Eis que Ciro, PUTO DA VIDA, lança algo como "Suíça não tem presidente, tem primeiro ministro, seu BURRO".

Ciro Gomes disse depois que tudo foi parte de uma armação dos estrategistas de José Serra. Ele explica sua versão nesse vídeo.

As imagens do programa automaticamente passaram a ser veiculadas dioturnamente no Programa Eleitoral de José Serra. Que acusava Ciro de desrespeito ao eleitor e Lula de ser culpado pela alta do dólar.

O resultado do 1º turno foi Lula em primeiro lugar, com 46,44% dos votos, seguido de Serra, com 23,19%, Anthony Garotinho com 17,86% e Ciro Gomes, com 11,97%. O candidato do PT conquistou quase 40 milhões de votos e por pouco não vence no 1º turno.

No 2º turno, Ciro e Garotinho apoiaram Lula, deixando Serra sem muita margem para manobras políticas. No final, Lula recebeu 61,27% dos votos, sendo o segundo presidente mais votado da história, perdendo para Ronald Reagan, na eleição de 1980.

Curiosamente, Lula se vangloriava desse feito, dizendo que teve mais votos do que FHC já teve um dia. Já FHC lembrava o opositor que a façanha se dera em um 2° turno, com apenas dois candidatos, enquanto ele havia vencido Lula em dois pleitos no primeiro turno.

E essa foi a história resumida de como o "Lula, sindicalista radical", se transformou no "Lulinha Paz e Amor", aceitável pelo Mercado e chegou ao poder depois de 4 eleições presidenciais!

Eu nunca votei, ou pensei em votar no Lula. Não obstante, devo confessar que o discurso de encerramento da campanha dele foi o mais emocionante nesses últimos 37 anos que estou relatando.

Em São Bernardo, cidade de onde despontou para o mundo, ele disse:
"A partir de domingo, pela primeira vez, um metalúrgico, torneiro mecânico, vai virar presidente do país mais importante da América Latina... Que ninguém ouse duvidar da classe trabalhadora".

Esse discurso remetia a uma outra frase dele, proferida em 1979, na grande greve dos metalúrgicos do ABC: "Que ninguém, nunca mais, ouse duvidar da capacidade de luta dos trabalhadores".

A transição do Governo FHC para o Governo Lula foi exemplar, dizem. FHC indicou nomes para assessorarem Antonio Palocci, que coordenou a transição, e sua equipe formada por Luis Gushiken, Aloizio Mercadante e até José Dirceu.

Fernando Henrique ligou para os principais líderes mundiais para garantir que não haveriam mudanças radicais. Lula foi à Washington se encontrar com George Bush, então presidente americano.

Ao final da transição, Lula ligou para FHC que, ao que me lembro, já estava em seu apartamento em Paris e disse que alguém queria lhe agradecer. Passou então o telefone à Palocci que agradeceu todo o esforço combinado.

No primeiro mandato, já em 2003, Lula ampliou e unificou os programas sociais de FHC, criando o Bolsa Família, que muitos, Eu incluso, confesso, viam como assistencialismo e compra de votos. Hoje o PBF é quase unanimidade como ferramenta de diminuição da pobreza.

Em 2004, foi criado o Prouni, programa do Ministério da Educação que permitiu acesso das classes mais vulneráveis à Educação Superior, não só em Instituições Públicas, como em Universidades Privadas, por meio de bolsas de 50% e 100%.

Na área econômica, impulsionado pelo inacreditável crescimento da China (por volta de 10% ao ano), o Brasil aumentou o PIB e a Renda per Capita. A Economia estava 1000 grau!

Os críticos dizem que o país cresceu porque o cenário mundial era favorável e todos cresciam. Inclusive, diziam que o Brasil crescia menos do que seus vizinhos como Chile, Argentina.

De fato, em um ranking de 25 países emergentes feito pela Folha, em 2006, o Brasil ficou 24° lugar em crescimento do PIB. Mas aí você pode ver o copo meio cheio ou o copo meio vazio.

A inflação deixada por FHC foi de 12,5% (lembrem que existiu o risco Lula em 2002). A média entre 2000 e 2002, era 7,5% e ao final do primeiro mandato de Lula, estava 3,14%.

O desemprego caiu de 10,5% em dezembro de 2002, para 8,4% em dezembro de 2006.

Eis que em 2005, surge Roberto Jefferson, eterno presidente do PTB, dando uma entrevista à jornalista Renata Lo Prete, então editora da Folha de S Paulo. O deputado denunciava um esquema de compra de votos no congresso que ele denominava como "MENSALÃO".

A princípio, Jefferson isentava o presidente de qualquer culpa, afirmando que o esquema era feito sem que ele soubesse. Depois essa narrativa caiu por terra e ele passou a acusar diretamente Lula pelo Mensalão.

No meio da turbulência, Roberto Jefferson apareceu de olho roxo dizendo que foi um acidente doméstico. Estava numa escada procurando um CD do Lupicínio Rodrigues quando caiu e o armário caiu em cima dele, deixando o hematoma e 12 pontos.

Outro fato folclórico aconteceu com José Adalberto Vieira, assessor do deputado petista José Nobre Guimarães (irmão de José Genoíno, ex-presidente do PT), que foi flagrado pela PF no aeroporto de Congonhas (SP), com R$ 209.000 numa maleta de mão e US$ 100.000 em sua cueca.

Nesse escândalo também surgiram figuras pitorescas como Delúbio Soares, um dos tesoureiros do PT presos e o Marketeiro Marcus Valério, que seria o operador do esquema.

Nove semanas depois das denúncias de Jefferson, Lula se manifestou durante uma viagem à Paris, dando uma entrevista para uma jornalista brasileira - Melissa Monteiro - que trabalhava numa emissora francesa. Prestem atenção nisso!

A versão mais divulgada é que a jornalista teria sido "contratada" para fazer a entrevista. As perguntas parecem ter sido convenientemente feitas com antecedência. Foi quase como um pronunciamento oficial em forma de entrevista. Nada confirmado, acho!

A Globo comprou os direitos de exibição da entrevista e a veiculou no Fantástico, com Glória Maria deixando claro que a emissora não tinha qualquer interferência nas perguntas.

Na entrevista, Lula diz "O que o PT fez, do ponto de vista eleitoral (Caixa 2, compra de votos) é o que é feito no Brasil sistematicamente." Ou seja, ele assumiu crime eleitoral em rede nacional.

Nesse momento eu achei que ele estava selando seu destino político. Pensei "caralho, burrão, assumiu!" Mas o burrão era eu e não ele. Aquela entrevista foi a base da defesa dele e aquela era uma jogada política diabolicamente genial.

Ali eu aprendi que, ao contrário do que eu tinha ouvido a vida inteira, Lula não era um inepto. Pelo contrário, era e ainda é um prodígio político.

Outra coisa que aprendi foi que o Brasileiro não se importa com corrupção. O PSDB queria deixar o PT sangrar até a eleição de 2006 para então vencer nas urnas um Lula enfraquecido. Erro Crasso!

A economia ia de vento em popa, o desemprego em baixa, inflação pequena, indústria e comércio bombando. Enfim, a grana estava entrando no bolso do brasileiro e não seria um mega esquema de corrupção que iria atrapalhar!