O papel político e filosófico da Perspectiva Linear - A Thread
A ideia dessa thread veio a partir de um comentário que eu li no facebook que me irritou, que afirmava que a arte europeia era "superior" as outras artes por causa da invenção da perspectiva linear. Puá.
Apesar de ter espumado de ódio no momento que li, eu me lembrei de alguns livros que li que entendem a perspectiva linear não como APENAS uma ferramenta, e sim como um artifício político e filosófico que caiu como uma luva em um contexto como o da Renascença. Vamos do começo:
Tirando logo isso da frente, SIM, foram os italianos na Renascença do século 15, mais especificamente o arquiteto Brunelleschi, que formalizou MATEMATICAMENTE o conceito da perspectiva linear com um ponto de fuga. Isso não significa que antes disso ninguém sabia que as coisas +
+ se distorciam com a distância (pelo contrário, temos vários exemplos anteriores de tentativas claras de perspectiva), mas ANTES de Brunelleschi nunca havia existido a ~necessidade~ de comprovar matematicamente o fenômeno, nem entender suas "regras" para funcionar perfeitamente.
Claro, isso não é consenso entre historiadores. Muitos acreditam que os primeiros estudos em perspectiva foram feitos na Grécia Antiga, mas não existe nenhuma comprovação documental disso, além de alguns estudos primários que demonstram uma visão não formal da perspectiva +
+ tal qual existiu durante a Idade Média e pré-renascimento. Também acredita-se que essa insistência em creditar a "criação" da perspectiva a Antiguidade Ocidental é uma questão mais política do que factual. As expressões mais simples +
+ de perspectiva, como a perspectiva atmosférica e isométrica, foram "descobertas" de forma independente em diversas partes do mundo, em culturas que nunca tiveram contato até então, o que torna muito difícil creditar alguma civilização pelo feito.A formalização do conceito veio+
+ A partir de uma NECESSIDADE cultural da Renascença. Quase tudo no mundo foi inventado porque em algum momento alguém precisou. Brunelleschi era um arquiteto vivendo sob uma conjuntura política de mudanças: a influência cultural da Igreja estava diminuindo, enquanto+
+ tentava-se resgatar valores filosóficos greco-romanos (por isso "Renascença"), cujo foco não fosse Deus, e sim...O HOMEM. Nesse contexto, não é de se surpreender que uma ferramenta que lida especificamente com o PONTO DE VISTA do Homem, o Observador,tenha ganhado tanta força.
Eu não posso afirmar se Brunelleschi sabia que suas observações seriam usadas para consolidar o pensamento Humanista da Renascença, mas foi basicamente o que aconteceu: a perspectiva linear caiu como uma luva nessa nova forma de pensar, e não demorou muito até ser considerada +
+ indispensável para os novos padrões estéticos da arte europeia em geral. E todos nós sabemos que, historicamente, europeus tem uma tendência em considerar tudo sob a perspectiva do próprio umbigo, então é claro que o "Humanismo" europeu e todos os seus valores englobavam uma +
+ parcela muito específica da humanidade, então não demorou muito pra Perspectiva Linear, bem como outras técnicas de arte ocidental, serem consideradas a Única e Verdadeira forma de fazer arte, como na real sempre foi como eles pensaram mesmo antes da formalização das técnicas.
É interessante pensar sobre isso através do prisma da perspectiva linear, porque de fato é uma técnica que oferece ao apreciador apenas um "ponto de vista", não apenas da pintura, mas também do mundo. A técnica reflete o pensamento, e o pensamento reflete no uso da técnica.
Concluindo: a perspectiva linear é uma ferramenta que foi criada para servir a um contexto político e cultural específico, e achar que o seu uso comprova a superioridade intelectual de uma arte/civilização é, literalmente, propaganda eurocêntrica.
Porque não existiu esse contexto, por exemplo, na China Imperial? A arte chinesa era majoritariamente pintada em rolos compridos, verticais ou horizontais. O objetivo dessas pinturas era fazer o olho do observador "correr" pelo comprimento do papiro. Utilizar-se de uma técnica +
+ que direciona o olhar artificialmente não era interessante para o estilo de pintura dos chineses. A perspectiva atmosférica era muito mais popular e adequada aos materiais e ao formato, por conseguir traduzir profundidade e vastidão apenas com a intensidade das pinceladas.
Em resumo, não existia a NECESSIDADE CULTURAL de desenvolver um sistema de perspectiva linear dentro da cultura chinesa, que tinham outras prioridades artísticas que não eram melhores nem piores que as prioridades da arte italiana no mesmo período.
Mesmo quando a perspectiva linear foi introduzida pelos alemães na China e no Japão lá pelo século 17, AINDA ASSIM o uso da técnica não ficou largamente popular, porque, novamente, as prioridades artísticas eram fundamentalmente diferentes entre esses países.
Esse discursinho de Perspectiva É Superior também é muitas vezes usado para minimizar vários períodos da própria arte ocidental, como a arte medieval, que TAMBÉM tinha outro conjunto de necessidades culturais que não tornou a perspectiva, realismo e anatomia prioridades.
Enfim. Perspectiva é massa, mas NÃO É uma técnica "superior". Entender sua função política dentro da história, bem como entender as diferentes necessidades artísticas de outras culturas é MUITO importante para qualquer artista se desprender do eurocentrismo que domina nossa área.
Eu preciso muito dividir essa informação com vocês.
É sobre essa pintura de uma bunda feita pelo artista Hieronymus Bosch
Vamos lá 👇
Essa bundinha faz parte de uma obra bem maior: O Jardim das Delícias Terrenas é uma das obras mais conhecidas de Bosch, um artista holandês do final do medievo!
A obra é um tríptico, representando o Jardim do Éden a esquerda, e o Inferno a direita. No meio estão cenas de "prazeres terrenos", sexo, bebida, etc.
"Ah porque tanta gente que quer pagar de artista gosta tanto de Van Gogh"?
Antes de tudo, isso nada tem a ver com Van Gogh em si!
Tal como outros artistas, Van Gogh foi escolhido para virar uma "marca", e é pesadamente promovido por museus e lojas como um produto. Aqui mora+👇
+ o problema: dentro do capitalismo marcas são,infelizmente, referências na construção da identidade pessoal de todo mundo, pra mais ou pra menos.
Então tem gente q acha q se "apresentar" com esses simbolos os dá algum nivel de identificação em relação ao q eles querem ser,+
+ e principalmente uma ideia de que se usar esses símbolos a pessoa será aceita pela "comunidade". O negócio é que a comunidade artística não funcionam exatamente como outros tipos de áreas de trabalho.
Eu tinha 30 anos quando descobri que existe um poeta romano chamado Gaius Valerius Catullus, que escreveu o que é considerado O POEMA MAIS OBSCENO JÁ ESCRITO EM LATIM. A coisa é tão séria que esse poema só foi traduzido oficialmente na sua integridade no SÉCULO 20 🤡👇Vem ver
Pelo que entendi, esse poeta tinha um namorado, um tal de Juventius, que traiu ele com um outro poeta chamado Marcus Furius Bibaculus. Esse Marcus, junto com um outro cara chamado Aurelius, criticaram os poemas do Gaius dizendo que eram "leves demais". Gaius ficou puto, +
+ não sei mais se pela crítica ou pela traição, e resolveu lançar esse poema que é catalogado como CATTULUS 16. Eis o poema traduzido em português 👁️👁️ O cara lançou o equivalente a "vou comer teu c& com farinha" antes de cristo sabe, uma lenda
Esse é "O Homem Chinês", um busto esculpido pelo francês Jean Baptiste Carpeaux, em 1872! E existe uma história bastante bizarra relacionado a ele, que foi apontado pela minha colega Teri Hu, em um grupo sobre descolonização:
Pelo que pude pesquisar, Carpeaux fez esse busto a partir de um modelo vivo! A escultura foi posteriormente usada como molde para um de seus trabalhos maiores, a "Fonte das Quatro Partes do Mundo", feita em colaboração com outro escultor, Eugene Legrain
A escultura tem quatro mulheres, que representam 4 partes do mundo. Inicialmente a escultura que representava a Ásia deveria ser um homem, mas por razões de "equilíbrio e harmonia" foi alterado para um corpo feminino. E é aí que mora a bizarrice: