Conforme prometido - ou ameaçado? - vou agora analisar em directo o ep. 2 da nova série da RTP, "A Rainha e a Bastarda".
Fica aqui feito o alerta de SPOILERS para quem apenas for ver o episódio na tv (a partir das 21h).
Depois da qualidade duvidosa do primeiro episódio, isto só poder melhorar... espero eu. Aqui vamos! #ARainhaeaBastarda
Começamos bem. É realmente muito simpático da parte das tropas leais a D. Dinis deixarem o infante D. Afonso acabar o discurso antes de atacarem. Quem disse que na Idade Média não havia maneiras?
Eu realmente gostava de conseguir ouvir os diálogos sem serem abafados por sinos
Wtf. Tipos da Occitânia em Portugal e a falar Francês em vez de langue d'oc? Se estes tipos são Cátaros eu passo-me. Ainda vão pintar a rainha Santa como assassina
Uma autópsia à bastarda?!!!!! E o conde de não sei onde a colher "indícios" a lA Sherlock Holmes! Temos CSI Odivelas!!
E eles a darem-lhe com a majestade. É um título que só é usado em Portugal na segunda metade do século XVI!
"As santas não choram" diz o D. Dinis à mulher! Isto é que é quebrar a célebre "fourth wall". Mas por que raios iria ele chamar-lhe santa?!
E agora a Madre Cascais diz-lhe em Latim que não é santa nenhuma! Pois não, as pessoas só são canonizadas DEPOIS DE MORTAS. A D. Isabel foi beatificada no séc. XVI e canonizada no séc. XVII...
Bom, se ignorarmos o facto de Maria Afonso na realidade não ter sido assassinada, D. Isabel até parece bastante suspeita.
Se eu bebesse um shot cada vez que a Madre Cascais diz "menina", entraria em coma alcoólico nos primeiros 10 minutos do episódio.
Portanto, estão a pintar a rainha santa como herege... Alguém avise o Papa Chico!
Diz-me que não fazes a mínima ideia como decorria uma cerimónia fúnebre medieval sem dizeres nada. A ter passado uns dias no rio, a desgraçada teria sido enterrada na igreja mais próxima e, anos depois, teriam então as suas ossadas sido trasladadas para um túmulo definitivo.
D. Dinis está a gritar com um cadáver à frente de dezenas de pessoas. Depois admiram-se de o filho D. Afonso querer o trono...
"Música! Festa! Alegria!". É definitivamente isto que se deve gritar num velório...
"És algum imbecil, imbecil?!" - Que mimo, que originalidade. E ainda o Dinis era poeta...
E pronto, mais danças pseudo-orientais. O Edward Said está a dar voltas na tumba.
E agora o D. Dinis é o rei Lear? Isto é tudo tão medíocre. Também gostava de saber onde está a decorrer a acção. Onde está a corte do D. Afonso? Leiria? Coimbra? Saturno? Fica a incógnita
"O rei pediu-te para descobrir a bastarda?" - A frase que dá início a uma cena de sexo. Mas que preliminares são estas, senhores!
O D. Dinis era tão avançado par a sua época, que até tem guaritas (!!) nos castelos. Mas a sério, não havia um bocadinho do castelo sem um elemento que não é de todo medieval?!
E saem chibatadas no lombo da rainha! Eu estou a demorar mais a tempo a ver isto porque a) tenho de recuar alguma vezes para tentar ouvir o diálogo; e b) escrever os tweets no PC porque o meu telemóvel é do Jurássico, e por isso volta e meia o Twitter não abre.
E mais outro título mal utilizado. Em Portugal, só no séc. XV se começa a utilizar príncipe/princesa para designar o herdeiro do rei. Até lá é tudo infantes, e mesmo esta designação vai conviver com a de príncipe até muito tarde.
Afonso IV! Ninguém lhe chamava Afonso IV, muito menos em infante! Quando era referido, já em rei, era Afonso, quarto deste nome, quando se davam ao trabalho de sequer numerar! Toda a gente sabia quem era o rei!
Camponês sem nome: Alteza, o seu filho e herdeiro tomou uma vila qualquer e diz que vai ser rei em breve.
D. Dinis, a meio de uma guerra civil contra o herdeiro pelo controlo do trono:
E agora os hereges (?) do sul de França, provavelmente a mando da rainha, a darem chibatadas à Madre Cascais. Santa Isabel adorava BDSM.
A cereja no topo do bolo: MATARAM O PEDRO I. Sim, o bebé recém-nascido, filho do infante Afonso, morreu. Estamos em 1320, e o único filho do casal, nascido em Abril, foi o futuro D. Pedro I. Será que isso quer dizer que neste universo Inês de Castro casou com o Khan da Mongólia?
E pronto, terminou. Ao contrário do D. Pedro I, e já agora das réstias de credibilidade da série, eu sobrevivi! Quem diria que o 2º episódio seria pior - muito pior - que o 1º! A conclusão é a mesma: A Rainha e a Bastarda não ensina nada - mesmo nada - sobre a Idade Média.
Resumo do ep. 2: A rainha Isabel é herege, adora chicotes e toma banho na capela.
D. Dinis chora a morte da filha e fica surpreendido por uma guerra civil envolver guerra.
O infante Afonso não gosta dos meios-irmãos e poderá ter manddo matar a meia-irmã, mas ninguém sabe porquê..
Ninguém sabe por que foi morta a bastarda, até porque não faz sentido matar uma monja (guião self-aware?).
O futuro D. Pedro IV morre depois de passar 2 minutos numa carroça (morte por exposição à pobreza?).
E pronto, é isto. Para a semana há mais!
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Num dia como hoje, a 4 de Março de 1394, nasceu na cidade do Porto o Infante D. Henrique, uma das figuras mais célebres da História portuguesa, e também uma das mais mitificadas.
Por isso, deixo aqui uma breve tentativa de desmontar um desses mitos: a imagem do Infante 🧵👇
Todos conhecemos bem a figura do homem do bigode e do chapeirão borgonhês. Ela está presente nos livros e nas estátuas erigidas, sobretudo, no séc. XX.
No entanto, esta imagem não corresponde de modo algum ao Infante real e histórico.
Até meados do séc. XIX, o Infante era praticamente sempre representado como um guerreiro barbudo envergando armadura, por vezes também com espada e com uma cruz de Cristo ao peito. É o que sucede, por exemplo, nesta estátua no Mosteiro dos Jerónimos, datada de inícios do séc. XVI