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Jan 3 45 tweets 6 min read
Bom dia, Ministro da Educação @CamiloSantanaCE

Criado pela lei 9.131, de 24 de novembro de 1995, o Conselho Nacional de Educação (CNE) completou vinte e cinco anos em 2022 com muitos desafios para superar.
A hierarquia do ordenamento jurídico ensina que os atos administrativos regulamentadores não podem escapar ao comando da lei.
A Lei nº 9.131/95, de 24/11/1995, que criou o Conselho Nacional de Educação, estabeleceu as competências do órgão por seu art. 7º:

Art. 7º O Conselho Nacional de Educação, composto pelas Câmaras de Educação Básica e de Educação Superior, terá atribuições normativas, ...
...deliberativas e de assessoramento ao Ministro de Estado da Educação e do Desporto, de forma a assegurar a participação da sociedade no aperfeiçoamento da educação nacional.
O Governo não achou a identidade de sua relação com o CNE, assim como o CNE não conseguiu achar sua identidade.
Há uma certa contradição nisso e talvez por isso não seja esdrúxulo que alguns o vejam como um Conselho Ministerial de Educação.
Os 24 Conselheiros — 12 da Câmara de Educação Básica e 12 da Câmara de Educação Superior — trabalham em um certo vácuo de ausência de apoio técnico. Os poucos técnicos que temos são abnegados, fazem milagres.
Conselheiros são secretários de si mesmos. Se sequer o órgão tem estrutura para trabalhar, é compreensível que o CNE não tenha encontrado a sua verdadeira identidade, seu verdadeiro papel. E isso não é diferente nos estados federados.
Os governos brasileiros, federal e estaduais, têm alergia à ideia de órgãos autônomos, sejam agências reguladoras, sejam universidades, sejam conselhos educacionais.
Por isso, por exemplo, universidades brasileiras não gozam de autonomia verdadeira. Acho que os políticos brasileiros pensam que autonomia seja equivalente a soberania. E soberanos, como sabemos, no nosso caso, são mesmo os políticos.
Estamos longe de entender a importância de órgãos técnicos autônomos, mas responsáveis frente à sociedade e a seus representantes.
Neste sentido, é de certa forma irônico observar que foi uma certa autonomia do Banco Central que deu ao Brasil a estabilidade da qual hoje se beneficia o país.
A formação de professores no Brasil tem vivido sucessivas alterações e reformulações normativas e, em decorrência disso, têm surgido muitas dúvidas e perplexidades sobre a interpretação da legislação no momento da contratação de docentes.
A prática tem demonstrado que as situações de desconforto legal persistem, provocando interpretações variadas e muitas vezes impossibilitando a contratação de professores em regiões carentes de profissionais licenciados.
O CNE não tem tempo para discutir as suas próprias questões porque está amarrado no relato de processos. Ele não aprofunda seus estudos porque não tem assessoria técnica.
Não tem competência para avançar nos grandes temas regulatórios da administração pública ou da legislação adequada, porque também não tem assessoria jurídica nenhuma.
No caso do CNE, é relevante observar que os conselheiros são todos nomeados pelo Presidente da República, com mandato certo, mas sua voz, assim como, por exemplo, seu direito a um Estatuto próprio, ...
...dependem da boa vontade do ministro da educação, da burocracia e dos Secretários do MEC.
A nomeação presidencial é pomposa e importante, claro, mas as circunstâncias práticas diminuem muito o valor objetivo e simbólico do mandato, cujo exercício integral pode ser diminuído, senão impedido, ...
...por uma nota técnica de um integrante do terceiro escalão do MEC sobre qualquer de nossos pareceres que, por isso, podem deixar de obter homologação ministerial.
Portanto, depois de nomeado pelo Presidente da República, todo e qualquer conselheiro, normalmente um professor ou dirigente escolar com larga experiência e trajetória acadêmica e profissional, normalmente portador de título de doutor, ...
...pode valer menos que um jovem técnico em assuntos educacionais do MEC, portador de um diploma de graduação e pertencente ao terceiro ou quarto escalão hierárquico do ministério, que discorde do parecer, ou escolha deixá-lo a dormir em alguma gaveta.
O ex-ministro da Educação, Fernando Haddad, iniciou uma mini reviravolta no funcionamento do conselho. Incomodado pelo que classificou como "corporativismo" no colegiado.
Haddad, anunciou o afastamento de várias entidades do processo para a indicação de novos conselheiros, entre elas a tradicional Associação Brasileira de Educação (ABE) e a entidade que reúne todos os reitores de universidades federais (Andifes).
Coincidência ou não, a lista com os nomes dos indicados para a renovação bianual do CNE, trouxe à tona uma polêmica que, muito provavelmente, não era esperada pelo ministro.
Sob a justificativa de tornar o Conselho Nacional de Educação mais técnico (jamais político), o MEC limitou o número de entidades com direito a indicar nomes para o órgão.
A falta de divulgação dos nomes indicados por cada entidade, porém, coloca em dúvida a transparência do processo de escolha. Assim, fica no ar a pergunta.
Entre o perfil técnico e o jogo político, quais critérios norteiam as indicações e a nomeação dos conselheiros?
O Estado brasileiro tem ojeriza à autonomia. Esse estatuto é um dos tristes marcos do período do CNE. Ou seja, o CNE é mais, em verdade, um CME, Conselho Ministerial de Educação, do que efetivamente nacional.
No dia 11 de maio de 2008, há quase dois anos, o CNE aprovou o Parecer CNE/CP nº 3/2008, que reexamina o Parecer CNE/CP nº7/2007, com a proposta para o ministro homologar um parecer, concordando que o estatuto fosse exarado por decreto presidencial.
Essa matéria está voltando para lá e para cá há 18 anos.
E este parecer está agora de volta ao CNE, enviado para reexame pelo gabinete do ministro que simplesmente diz que o CNE não pode ter um estatuto aprovado pelo Presidente da República, só pode ter um regimento aprovado pelo ministro.
Ou seja, o CNE é mais, em verdade, um CME, Conselho Ministerial de Educação, do que efetivamente nacional.
É claro que uma das ambições que o CNE abriga é a de ter um Estatuto aprovado por decreto presidencial, que regulamentasse a lei que o cria.
Muitos conselhos da órbita federal têm seu estatuto aprovado por decreto do Presidente da República, e certamente não seria demais pedir que o CNE tivesse seu estatuto também desta forma.
O CNE – Conselho Nacional de Educação deve ser um órgão de Estado. Por exemplo, quando o CNE vota um parecer de credenciamento da abertura de uma faculdade, o documento vem do MEC, já analisado pelas secretarias.
No CNE, é discutido e preparados o parecer e enviados para homologação. Chegando ao gabinete do ministro, pensa que vai mesmo ao ministro para análise e homologação? Não vai não!
O mesmo parecer é mandado de volta para a análise das secretarias, que já haviam recebido antes o processo, e depois o encaminham para a secretaria jurídica.
O MEC ouve a burocracia, que não é qualificada para isso como são os conselheiros, para só então homologar ou enterrar, pelo silêncio, o parecer.
Qualquer parecer do CNE morre num escaninho da burocracia, se assim se desejar. Nesse sentido, o CNE é refém da burocracia do MEC, que se manifesta duas vezes sobre cada assunto avaliado pelo CNE, antes de ir ao CNE e depois de voltar do CNE.
Isto faz sentido? Claro que não, e claro que sim. Claro que não, se pensarmos na existência legal de um verdadeiro CNE.
Claro que sim, se pensarmos no predomínio burocrático sobre o estratégico e na incompreensível dificuldade que todo ministro tem com órgãos eventualmente autônomos em seus ministérios.

#CNE
Foram várias reformas por que passou o Ministério da Educação, visando a simplificação dos seus procedimentos. Os burocratas do MEC, inventaram índices, condições de oferta, Sinaes, Conaes, IGCs, CPCs, CCs AIEs (Avaliação Institucional Externa), ...
... produziram especiosos e detalhistas, senão ineficazes, instrumentos de avaliações, além de Enade, Enem, provinhas e provões, decretos-pontes, reformas universitárias, dilúvios de portarias ministeriais, micro (ou nano) regulatórias, enfim, uma parafernália de mudanças.

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Jan 4
Boa noite, senhor Secretário de Educação @ProfRenatoFeder

Está na hora de mudar isso: A educação é o caminho, antes que o país afunde de vez na ignorância, miséria e violência.
Melhorar a educação brasileira, de um modo geral, pode ser uma utopia? Depende, naturalmente, da existência de uma política séria, no setor, conduzida por pessoas competentes e desinteressadas de proveito pessoal ou político.
Hoje, o único punido no sistema de ensino brasileiro é o aluno reprovado. Isso é covardia. Nada acontece com professor, diretor, secretário/ministro de Educação, prefeito ou governador quando eles falham.
Read 29 tweets
Jan 4
@CamiloSantanaCE

Branca Alves de Lima/ Patronesse da Educação brasileira planaltoempauta.com.br/branca-alves-d…
gibanet.com/jose-paulo-de-…

Sr. Ministro da Educação/ME - @geraldoalckmin ouviu o áudio no fim da matéria. Ouça.
Mestre @RalphRangel_

Boa noite.
Read 4 tweets
Jan 4
@CamiloSantanaCE
Estamos diante da irreversibilidade da lei da educação brasileira. Não custa, pois, acentuar alguns aspectos que poderiam ter merecido melhores definições, como é o caso da educação especial, tratada de modo superficial.
É muito grande, no Brasil, o número de deficientes visuais, auditivos, motores e psicológicos, todos merecendo na escola os cuidados que são dispensados, com tanto carinho, nas nações mais desenvolvidas.
Por outro lado, no caso da educação infantil ( de 0 a 6 anos de idade) não basta a simples referência que se faz no instrumento legal.
Read 9 tweets
Jan 4
O que encontraremos se de fato fizermos o esforço de ir para o espaço? Há vida alienígena lá, ou estamos sós no universo?
Por que devemos ir para o espaço? Qual é a justificativa para despendermos todo aquele esforço e dinheiro na obtenção de alguns poucos pedacinhos de rocha lunar Não há causas melhores aqui na Terra?
A raça humana existe como espécie separada há cerca de 2 milhões de anos. A civilização teve seu início cerca de 10 mil anos atrás e a taxa de desenvolvimento tem aumentado regularmente.
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Jan 3
Ministro da Educação @CamiloSantanaCE

Hoje, o único punido no sistema de ensino brasileiro é o aluno reprovado. Isso é covardia. Nada acontece com professor, diretor, secretário, ministro de Educação, prefeito ou governador quando eles falham.
Livros didáticos articulados – Além de considerar precipitada a unificação das disciplinas do ensino médio, considero também prematuras as metas do PNLD – as quais preveem a distribuição de livros e material didáticos articulados com outras áreas do conhecimento.
É impossível atingir a meta. O Brasil não tem escritores para escrever esses livros e não estão explícitos os possíveis escritores e atores que poderão contemplar a interdisciplinaridade de textos para o ensino básico.
Read 38 tweets
Jan 2
Boa noite, Ministro @CamiloSantanaCE
As escolas brasileiras têm um punhado de papéis reunidos sob o nome de “proposta político-pedagógica” - (P.P.P), seja lá o que isso queira dizer: começa com uma frase do Paulo Freire e termina citando Rubem Alves.
Na esteira do “método”, Paulo Freire publicado, em 1968, no exílio chileno, seu livro “Pedagogia do Oprimido”, que pretendia ser a apresentação e defesa do “método”. Até hoje é elogiado pelas esquerdas, que em geral, como costuma acontecer, não leram o livro.
A escola está preocupada em ensinar, e não em fazer o aluno aprender a pensar.
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