Quase todos os estudiosos do futebol recomendam pensar a violência do no futebol a partir de práticas como essa aqui.
Isso diz mais sobre uma cultura masculina urbana do que sobre rivalidade clubística/esportiva. Futebol é só um pretexto.
Toda cidade tem sua versão de prática de "lúdica" de violência. Pode ser gangue, pode ser bonde, pode ser usando festas ou rivalidades de bairros como pretexto. Nada de novo na história da humanidade. Vide o "baile de corredor" no Rio de Janeiro.
Aliás, o futebol como jogo nasceu praticamente como uma grande rinha entre centenas de homens de cidades diferentes.
O jogo durava dias, deixava inúmeros feridos e consistia em levar uma bola para um arco na cidade do adversário. O que muda isso é a normatização (esporte).
A gente podia ir bem mais longe. O que foi criminalizado como "maltas dos capoeiras" na virada do século XX pode ser entendido como uma versão específica da cultura de formação de grupos interessados no confronto físico. As maltas eram mais visadas por uma razão racial, lógico.
E por que não entender as ideias de artes marciais mistas como uma tentativa de criação de um verdadeiro mercado da mesma "cultura masculina urbana" de violência? Wrestling, jiu jitsu, capoeira, boxe... Por que existiria tanta oferta de lutadores se não fosse por isso?
Há também o sentido da "cultura do risco", como diz Kike Toledo, esse apreço pouco compreensível pelo perigo.
Vai da guerra de espadas do São João (que não se limita a Cruz das Almas) até o costume do surfe de busu/trem, ou do pixador que faz rapel.
Se não vai na mão, pode ir também no chifre. "Corrida de toros" é uma prática que atravessou gerações, com tantas fatalidades, basicamente pela gosto pelo risco.
Tava buscando uma imagem pra ilustrar isso aqui: as brincadeiras violentas da infância/juventude.
Baba-porrada, cuecão, badogue, agora tem até trocação organizada. Quem não viveu isso na época da escola? Cultura masculina de violência.
É perda de tempo ficar analisando casos de violência relacionada a futebol (apenas) como um produto da rivalidade clubística, por causa do resultado de um jogo, se "não são torcedores, são marginais".
Não é a origem, nem o fim da prática. Para combater o problema também é necessário entender sua substância.
E também é preciso, cada vez mais, distinguir a "violência de multidão" dessa "cultura do confronto físico" que falei até aqui.
Na multidão, o mais pacífico dos indivíduos fica sujeitado a ter a mais violenta das atitudes, porque a multidão transmite a sensação de invisibilidade, de proteção; e porque a multidão suscita atitudes das mais irracionais.
Por causa disso, o futebol TAMBÉM é um ambiente propício para essa outra vertente da violência no futebol que é a "violência de multidão". Que ninguém sabe quando vai acontecer, mas que pode com a própria ação policial (e é o mais comum em estádios!).
O futebol é um ambiente ABSOLUTAMENTE propício tanto para a prática planejada de violência lúdica. quanto para o estouro da violência das multidões.
Quanto ao primeiro, isso se dá pela simbologia principal: dois lados rivais, com cores distintas, frente a frente, com histórico de enfrentamento muitas vezes centenário, transmitido por gerações por uma história oral totalmente carregada de viés.
É atrativo à violência. E continuará sendo enquanto persistir essa cultura masculina que vê PRAZER (sim, prazer) no confronto físico e na própria celebração enquanto macho.
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St Pauli se tornou, por razões até nobres, uma grife de "clube de esquerda" em um futebol altamente mercantilizado e contraditório.
Coube reforçar, algumas vezes, que a origem do clube nada tem a ver com "esquerda". Pelo contrário, é um clube de raízes aristocráticas e militares, com um passado de muitos membros adeptos ao nazismo.
A mudança de figura do St Pauli tem correlação com o movimento altermundialista e com a tática das ocupações.
O clube foi "ocupado" e isso foi possível por ser um clube pequeno.
Fiz esse vídeo há alguns anos pra traçar as diferenças entre St Pauli, Livorno e Rayo Vallecano, pra facilitar a discussão. Uma coisa é o clube e sua história pregressa, outra coisa é a forma como a torcida consegue transformá-lo.
Talvez coubesse falar do Celtic.
O apoio irredutivel dos ultras do St Pauli (e de várias outras curvas da Alemanha, especialmente as de esquerda) - com inexistência de gestos de solidariedade aos mortos civis inocentes palestinos -, é um fenômeno propriamente alemão. Difícilmente isso vai acontecer em outros países.
Há um padrão no processo de constituição das SAFs no Brasil. Quanto mais fechado e anti-democrático o clube, menos transparente é o processo de sua venda.
O caso do Galo beira ao escândalo, pela forma que vem sendo tocado. Não à toa qual a torcida criou o #ManifestodaMassa. 🧶
Em clubes mais democráticos, como o Bahia, qualquer conselheiro eleito junto aos sócios poderia pedir acesso ao contrato, para avaliar as condições da venda da SAF. Isso forçava os dirigentes do clube e as firmas representantes do lado da venda e da compra a serem escrutinados.
O Galo segue um padrão muito parecido com a SAF do Cruzeiro em sua condução. Além da pouca transparência, há atropelo nas competências do conselho deliberativo e tentativa de estabelecer mecanismos de pressão externas aos críticos (mídia, influencers, política).
Para uma leitura mais crítica, sugiro a análise dos tantos diferentes casos em "Clube Empresa: abordagens críticas globais", que organizei em 2020, com mais de 20 autores.
Note que à época ainda não estava aprovada a "Lei da SAF".
Se as fontes da Josimar estão certas, o resumo daquela reportagem é que a SAF do Vasco (e todos os outros clubes) está pendurada em um castelo de areia.
A empresa opera de alavancagem em alavancagem, de "cheap money", ampliando o portifólio pra projetar imagem de sucesso. +
E assim sucessivamente. Você apresenta qualquer bom número pra um gerente de um banco de investimentos e ele autoriza bilhão pra você sair comprando tudo que vê pela frente.
A dúvida é se isso vai ser exitoso e se sustentar.
No capitalismo contemporâneo, o mais comum é: NÃO.
Repito: caso as fontes estejam certas.
Agora cabe aos órgãos do Vasco encontrarem essas respostas (não só especulação) e exigirem da 777 uma saída negociada.
Exemplo: devolve o controle e parte do capital para não precisar honrar com os "supostos bilhões" prometidos