Na última quarta, 21, o Conselho Nacional de Arquivos discutiu (à revelia de boa parte de seus integrantes, diga-se) a minuta de portaria do Ministério da Gestão e da Inovação que convoca a II Conferência Nacional de Arquivos (Cnarq).
O documento merece algumas considerações. 🧶
A minuta convoca a 2ª Cnarq, com o tema "Arquivos: agentes da cidadania e da democracia". O tema teria sido definido pelo Comitê Impulsor da Cnarq, criado em julho. Mas não foi anunciado antes, nem debatido pelo Plenário do Conarq, nem levado à consulta pública. [+]
Pela minuta, a 2ª Cnarq será coordenada pelo Arquivo Nacional "em conjunto com o Conselho Nacional de Arquivos". A presidência será do MGI. Aqui vale uma análise mais apurada. [+]
Faz sentido que o AN seja o coordenador da Cnarq? Faz! O AN é uma secretaria executiva do MGI. E, se tomarmos os exemplos das conferências de saúde ou de cultura, vamos ver que a parte operacional delas geralmente é feita por uma secretaria executiva de ministério.
Mas... [+]
É bom lembrar que, apesar de ser uma secretaria executiva, o AN também é uma instituição arquivística ("a" instituição do Executivo Federal). Logo, é também agente da Cnarq, como o são os arquivos estaduais e municipais, os serviços dos demais poderes e a sociedade civil. [+]
Essa é uma peculiaridade importante, porque, na composição da 2ª Cnarq, o AN aparece como a instituição responsável por indicar os nomes dos integrantes da Comissão Organizadora Nacional (21 representantes) e da Coordenação Executiva Nacional (7 representantes). [+]
Um adendo importante é que, conforme a minuta, o Conarq participará da indicação dos 21 integrantes da Comissão Organizadora, mas não da Coordenação Executiva. [+]
Dado que o AN é secretaria executiva, mas é também agente envolvido na Conferência, o melhor seria que o Conarq fosse o órgão responsável pela indicação dos representantes das comissões.
Pode isso? Pode! É assim com a Coordenação Executiva da Conferência Nacional de Cultura.[+]
A vantagem de indicações saídas do Conselho é que elas evitam o estresse do excesso de discricionariedade.
Ou, em português claro: evitam que a presidência do Conarq simplesmente escolha pessoas sem consultar o Plenário – como aconteceu na nomeação do Comitê Impulsor, aliás. [+]
Seguimos na minuta, agora com um ponto fundamental. Diferente de boa parte das conferências nacionais mais recentes, a minuta apresentada prevê a aprovação de um regimento interno para a Cnarq, mas não apresenta uma proposta para este regimento.
E esse é um tema complicado. [+]
O regimento interno da conferência é seu coração. Ele define como a conferência vai funcionar, quais serão as atribuições das comissões, as etapas, o calendário, a forma de escolha de delegados e convidados, as instituições participantes.
Enfim, o regimento é tudo. [+]
Só que a minuta apresentada na quarta passada nem chega perto do regimento. Sabemos que estão previstas etapas, que elas devem ocorrer até 2 de junho, que devem respeitar o defeso eleitoral e que serão publicizadas pelo Conarq e, de novo, pelo Arquivo Nacional (?).
E só. [+]
Não está claro, por exemplo, como serão definidas as etapas temáticas, uma novidade no campo arquivístico. Também não há qualquer indício sobre como ocorrerão as etapas municipais e intermunicipais – ponto nevrálgico para o debate de políticas públicas arquivísticas no país. [+]
O que parece, sinceramente, é que a parte das etapas foi simplesmente copiada do regimento interno da Conferência Nacional de Cultura, sem levar em consideração o fato de que estamos diante de uma realidade totalmente distinta.
O SINAR é MUITO diferente do SNC. [+]
Outro detalhe importante: a minuta prevê que o regimento interno da Cnarq não será aprovado pelo Conarq, mas sim pela Comissão Organizadora Nacional.
Algo que não parece fazer muito sentido.
Para finalizar, a minuta termina com o Art. 8º, que diz que o MGI custeará a 2ª Cnarq com seus próprios recursos. Ok, acreditamos. Mas o papo de reuniões passadas do Conarq era de que os custos da Conferência sairiam de um acordo firmado entre o AN e o PNUD.
Ficou confuso. [+]
A minuta apresentada é importante, mas deve ser debatida com atenção. Ela empodera demais o Arquivo Nacional, coloca o Conarq em segundo plano e, o principal, não vem acompanhada do regimento interno da Conferência – que poderia ter sido proposto pelo Comitê Impulsor. [+]
Por competência dos conselheiros (que não tinham tido acesso ao documento), a minuta não aprovada no dia 21 – vai ser debatida novamente em 13 de março. Mas o plano era aprová-la, como está nos "considerandos" do documento. [+]
Essa minuta precisa ser discutida, compreendida e, se for o caso, contestada. Um passo equivocado nesta arrancada pode simplesmente transformar um desejo da área em problema.
Sem falar na quantidade de tensões desnecessárias geradas.
@threadreaderapp unroll
• • •
Missing some Tweet in this thread? You can try to
force a refresh
Em novembro de 2020, a Prefeitura de São Paulo (SP) abriu chamamento para submeter o Arquivo Público do Município a uma parceria com a iniciativa privada. [+]
O edital previa parceria "para execução dos serviços de digitalização e microfilmagem, preservação digital e gestão documental-arquivística, [...] remodelagem ou requalificação das edificações, a administração predial e exploração imobiliária do Arquivo Público do Município" [+]
A proposta causou polêmica e provocou protestos por parte do Conselho Consultivo do Arquivo Histórico da cidade e também do Conselho Nacional de Arquivos, que manifestou "preocupação" com o caso. gov.br/conarq/pt-br/a…
Noticiamos hoje, no @girodaarquivo, que o @ArquivoBrasil recebeu o acervo de Pedro Ernesto Baptista, ex-prefeito do Distrito Federal. Os documentos foram doados por Maria Helena Lemos Mossé, neta do político falecido em 1942. Aproveito a notícia para algumas reflexões. 🧶
A doação do acervo de Pedro Ernesto começou em 2019. Dois anos depois, o AN noticiou o recebimento de "cartas" do ex-prefeito. gov.br/arquivonaciona…
A política de aquisições do Arquivo Nacional (aprovada em 2017) diz que uma doação deste tipo precisa ser analisada por uma comissão específica, responsável por julgar o estado do acervo e o mérito de seu recebimento.
Ainda preciso ler, mas me parece que este Guia lançado pelo @arquivoestadosp é um dos materiais mais importantes da Arquivologia brasileira nos últimos anos. Além de ser objetivo e operacional, ele trata de um problema há muito sonegado: as massas documentais acumuladas. [+]
A ascensão dos debates sobre documentos e arquivos em formato eletrônico/digital fez com que muitas instituições abandonassem de vez a discussão sobre este problema tão antigo quanto pendente. Ainda há milhares de metros lineares de arquivos sem tratamento no Brasil. [+]
Trabalhar em uma perspectiva aplicada e embasada nos preceitos legais da Arquivologia é o único jeito de enfrentar este problema – que traz todo o tipo de prejuízo à vida pública brasileira. É só a partir da avaliação que poderá haver recolhimento e patrimonialização. [+]