Muito se falou sobre a confusão na Botafogo SAF/Eagle/John Textor. O caso é bem difícil de entender e suspeito que ninguém tenha o panorama completo. Porém, há documentos oficiais, em 2 processos judiciais. A partir deles, farei um fio IMENSO (+)
Como se sabe, Textor está em litígio com seus sócios na Eagle, a holding que controla os times da sua “MCO” – Crystal Palace, Lyon, Molenbeek e Botafogo. Essa desavença societária terá reflexos diretos no Botafogo.(+)
Textor, como pessoa física, comprou 90% da SAF Botafogo em 2022, pagando R$ 400MI, divididos em diferentes eventos (R$ 50MI em jan/22, R$ 100MI em mar/22, R$ 100MI até mar/23, R$ 100MI até mar/24 e R$ 50/MI até mar/25). Foi barato o Botafogo, hein? (+)
Textor passou a deter 90% da SAF já em ago/22. Em nov/22, Textor, com anuência do clube, transferiu suas ações para a Eagle Football Holdings, com sede em Londres. Textor, é claro, controlava a Eagle, era seu representante. Mas a “dona” da SAF passou a ser a Eagle. (+)
Enquanto Textor consolidava sua posição na SAF, em out/22 a Eagle, controlada inteiramente por ele, tomou um empréstimo de US$ 425MI (ou R$ 2,25BI, na cotação da época) da Ares Capital, que exigia em contrapartida alguns direitos de garantia para o fundo de investimento. (+)
Em jan/23, a Eagle e Ares, com a anuência da SAF, celebraram contrato de Penhor - todas as ações da Eagle na SAF estão penhoradas em favor da Ares. Nesse contrato, dentre outras restrições, a Eagle não poderá deliberar nada que possa na aplicabilidade do direito de garantia. (+)
Além disso, caso a Eagle incorra em um chamado “Evento de Antecipação” (isto é, um gatilho que determine a cobrança do empréstimo), a Ares poderá vender apropriar-se e/ou apreender as ações da SAF Botafogo. (+)
Em abril/25 ocorreu uma reunião na Eagle. Por ela, é possível saber que a Ares enviou à Eagle 3 notificações de inadimplência (em out/24, dez/24 e fev/25). O objetivo da reunião era consolidar os termos do que chamaram de “Acordo de Substituição” entre a Eagle e a Ares; (+)
Talvez parte dos documentos assinados naquele dia não estEJA nos processos, mas, do que está, é possível identificar que na ocasião foi nomeado como Diretor Independente da Eagle o Sr. Cristopher Mallon – um advogado de Londres, especialista em reestruturação de empresas; (+)
Os estatutos da Eagle também foram alterados. Desde maio/25, todas as decisões da diretoria devem incluir a opinião do Diretor Independente – no caso, o advogado Cristopher Mallon; (+).
Há outras deliberações importantes nos documentos da “Transação”: p. ex., o Diretor Independente deve ter acesso à gestão do Botafogo para “estabelecer um plano de negócios e um orçamento para 2025 que se concentre na redução da dívida e das responsabilidades contratadas” (+)
Ou, de forma mais direta, deve ser tomada “qualquer medida” para permitir a gestão dos negócios pelo Diretor Independente, incluindo “mudanças na gestão e na equipe, contração de dívidas, definição de orçamentos e negociação de jogadores”. (+)
Acuado pelo cenário contratual, Textor reagiu. Recebeu o apoio do Botafogo FR, o acionista minoritário da SAF, que mandou uma carta malcriada para à Eagle, aos cuidados de Cristopher Mallon, dizendo que “não reconhecerá e nem tolerará” qualquer na diretoria da SAF Botafogo. (+)
Já a SAF Botafogo enviou uma carta ao Lyon em 18/07, cobrando o pagamento de €120MI em 30 dias, relativos à empréstimos “intercompanhias”, €27MI pela venda de Almada e € 43MI pela venda de Igor Jesus, tudo em 30 dias e à vista. (+)
O ato mais ousado de Textor foi promover às pressas mudanças societárias profundas na SAF. Às 23h da noite de 17/07, uma AGE reuniu os 2 acionistas da SAF, o BFR e a Eagle, ali representada pelo próprio Textor, que já não podia agir sem a aprovação do Sr. Cristopher Mallon. (+)
Nessa AGE foi aprovado o aumento de capital da SAF Botafogo em R$ 650MI. Hoje, o capital social da SAF é de R$ 356MI, dos quais a Eagle detém 90%, ou seja, R$ 320MI. Ora, se o novo capital será de cerca de R$ 1BI, a Eagle passará a ter apenas 35% e deixará ser controladora. (+)
E de onde virá o novo controlador? Na mesma data, um pouco mais cedo, uma reunião do Conselho de Administração da SAF Botafogo, presidido por Textor, traz a resposta (em uma SA o Conselho de Administração cuida da orientação geral dos negócios da companhia). (+)
O Conselho aprovou a venda de créditos da SAF com a Eagle por conta de empréstimos (€150MI) para uma empresa nas Ilhas Cayman (também “Eagle”, para causar bastante confusão), por € 100MI. Ou seja, a SAF abriu mão de 1/3 do que teria a receber de sua acionista. (+)
Em seguida, a mesma Eagle “Cayman” empresta à SAF €100MI, através de um “mútuo conversível”, contrato onde a SAF ao invés de pagar à Eagle “Cayman”, entrega participação acionária para liquidar a dívida – no caso, as “novas” ações, vindas do aumento do capital social. (+)
Mesmo podendo converter o empréstimo em ações, a Eagle Cayman recebeu, em garantia, cotas de TV, patrocínios comerciais, vendas de direitos econômicos de atletas, bilheteria e sócio torcedor. Todas as receitas da SAF estão empenhadas para a Eagle Cayman. (+)
Dias depois, a SAF Botafogo ingressou com ação de execução dos contratos de mútuo com a Eagle, alegando ser credora de R$ 152MI e pedindo, em garantia, o arresto das ações que a Eagle detém na SAF, para impedi-la de “alienar as ações detidas na SAF BOTAFOGO a terceiros”. (+)
Essa liminar de arresto foi deferida. Reproduzo a decisão: “DEFIRO o arresto cautelar das ações de Eagle Football Bidco na Saf Botafogo, em ordem a impedir nova oneração ou alienação da respectiva participação acionária”. (+)
Por seu turno, a Eagle também processa a SAF Botafogo e o clube. Alega que Textor usurpou seus poderes ao tomar decisões em nome da Eagle, que agora é representada por seu Diretor Independente, Sr. Cristopher Mallon. (+)
A Eagle pediu uma liminar para (a) suspender os atos da AGE e da reunião do Conselho da SAF (b) proibir a realização de novos atos societários pela SAF sem a presença do Sr. Mallon. Por enquanto, a liminar não foi deferida. (+)
Ufa! Terminei a narração dos fatos. Agora, vou passar a dar minha opinião.
a) Textor pode sair da SAF Botafogo a qualquer momento. Ao contrário do divulgado, a liminar que “congela os ativos” (nas palavras da imprensa) apenas impede que a Eagle venda sua participação. Ora, como a “dona” da SAF é a Eagle (e não Textor), basta que ela queira tirá-lo. (+)
b) A Eagle cometeu um erro grave: não traduziu os documentos que sustentam sua versão (prometeu fazê-lo em 10 dias). Desconfio que foi por isso que sua liminar não foi deferida. Mas, qdo traduzidos, os documentos provarão que Textor não representa mais a Eagle. (+)
c) Repito: é mera questão de tempo para a Eagle conseguir provar que nada pode ser feito em seu nome (especialmente decisões societárias) sem a aprovação do Sr. Cristopher Mallon – que não é especialista em futebol, mas sim em recuperação de empresas. (+)
d) Outro caminho para remover Textor é a Ares executar as ações da Eagle que foram penhoradas em seu favor. Em janeiro de 23! Com anuência da SAF Botafogo. A Ares Capital, notem, tem o direito de vender essas ações “de qualquer forma ou ambiente”, está escrito no contrato. (+)
e) SE a SAF Botafogo já transferiu os créditos que possui contra a Eagle Football para a Eagle Cayman, então a ação de execução onde foi concedida a liminar precisa ser extinta, a SAF não tem mais legitimidade para cobrar essa dívida, quem deve cobra é a Eagle Cayman. (+)
f) Os 2 empréstimos que a SAF cobra da Eagle, totalizando € 23MI, foram inteiramente destinados ao Lyon. Ocorre que a SAF também cobra diretamente ao Lyon outros €120MI. Foram umas 40 transferências entre a SAF e o Lyon em 24 e 25. Será que não há sobreposição de cobrança? (+)
g) A manobra de aumento de capital para reduzir a participação da Eagle é escandalosa e será anulada. Textor concordou com a delegação de poderes decisórios ao Diretor Independente e não poderia representar a Eagle na AGE da SAF Botafogo. Não tem como isso prevalecer. (+)
h) Por outro lado, as decisões tomadas pelo Conselho de Administração (os negócios com a Eagle Cayman) podem ser escandalosas e desleais com a acionista controladora, mas são legais. Os atos de gestão da companhia brasileira não precisam da aprovação do Diretor Independente. (+)
i) Porém, a Eagle, insisto, DONA da SAF Botafogo, pode a qualquer momento assumir a gestão efetiva da companhia, nomear novo Conselho de Administração, novos diretores e impor seu plano de negócios (voltado para a redução de dívidas). (+)
j) Lição final: mesmo com resultados esportivos opostos, Vasco e Botafogo provam que transformar instituições centenárias em SAF é uma TREMENDA ROUBADA! Estão, ambos, amarrados às disputas societárias e dívidas de quem lhes prometeu o paraíso. (+)
Comentário final: o tema é bem complexo e muita coisa deve ter escapado. Principalmente porque boa parte das fontes está em inglês e isso torna tudo mais espinhoso. Já me desculpo pelas imprecisões que posso ter cometido. Fim da novela!
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A entrevista de Filipe Luís que expôs a situação do Pedro é uma quebra de paradigma e convida à reflexão de vários aspectos que ela embute. Disse, logo após assistir, que FL tinha produzido a obra-prima das coletivas pós-jogo. 48 horas depois, reforço a sensação. 🧶
Hoje o Pedro se manifestou. De forma até surpreendente, confirmou todos os fatos expostos por FL. Disse não ter vaidade e assumia que seu rendimento estava abaixo dos companheiros, reconhecendo que estavam claros os motivos pelos quais não devia ter sido relacionado. (+)
Portanto, como dizemos, os advogados, os fatos são incontroversos. Pedro estava com rendimento abaixo de todos. Em suas próprias palavras, a explicação para não ser convocado para o jogo era "simples e clara". Caso encerrado? Não no Brasil! (+)
Minhas impressões das eleições do Flamengo. Não é uma análise, a @FrenteFlaMaior deve fazer uma hoje e eu repostarei. Aqui estarão apenas observações aleatórias. Vamos a elas🧶
Com mais da metade do colégio eleitoral votando, tivemos a maior eleição da nossa história. É lamentável que apenas 3272 votos sejam capazes desse feito. Ampliar o colégio eleitoral é uma medida urgente. (+)
Conversei com gente de muitos lugares: Joinville, Foz do Iguaçu, São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Manaus, Salvador, Washington, Amsterdam... gente que investiu bastante dinheiro só para votar. Espero que tenha sido a última eleição sem voto a distância. +
Leilão do Gasômetro, a novela. Vou fazer uma sequência de posts trazendo algumas informações. Alguns podem ser relativamente grandes, é muito assunto para falar. (+)
O leilão é alvo de 3 questionamentos distintos:
- o da Caixa, alegando violação do princípio da impessoalidade. A Caixa não conseguiu a liminar em 1a instância, recorreu e também não conseguiu em 2a instância. Logo, essa ação não é empecilho para o leilão;
- o do advogado Vicente Custódio, que alega que a União deveria autorizar previamente o leilão. A 1ª instância concedeu liminar e suspendeu o leilão. No entanto, o Município recorreu e a 2ª instância acaba de cassar a liminar. Assim, não há mais nenhuma decisão impedindo;
- por fim, a União Federal, "pegando carona" na ação do advogado Custódio, pediu a manutenção da suspensão. E esse argumento é mais preocupante. Explico a seguir. (+)
O terreno pertencia à União. Em 2013, foi cedido para o Município sob a condição de uma contrapartida: o Município deveria realizar obras em um imóvel na Rua Melo e Souza, esquina com a Rua Francisco Eugênio - 2 anos depois, foi feito um aditivo para que as obras fossem realizadas na Rua Santa Luzia, 11. (+)
Essa nota do BAP expõe uma fragilidade importante do candidato e ao mesmo tempo convida a uma reflexão sobre a construção do estádio, que deveria ser uma "matéria de Estado", ou seja, um consenso entre todos os atores da política rubro-negra e debatida amplamente. (+)
Há 2 meses, a @FrenteFlaMaior criou um grupo de estudo para debater o impacto financeiro do estádio. Iniciativas assim deveriam ser estimuladas pelo clube, afinal a construção do estádio exigirá sacrifícios e precisamos estar cientes deles. Infelizmente, o tema está sendo tratado com muita paixão e pouca racionalidade. (+)
Nos encontros com sócios, BAP teria dito, mais de uma vez, que o Flamengo deveria esperar "uns 8, 10 anos" para construir seu estádio. Era uma opinião com bons argumentos (embora eu não concorde com ela). Com o vazamento do assunto e a péssima repercussão, divulgou essa nota. (+)
Sei que é Carnaval e que a política está fervendo no Brasil e no Flamengo, mas cabe refletir sobre esse cenário das cotas de TV, a partir das informações do @rodrigocapelo. Vamos a um fio. (+) ge.globo.com/negocios-do-es…
A se confirmar esse cenário de divisão de venda dos direitos com os clubes da Libra de um lado e os clubes do Forte Futebol do outro, o valor a ser arrecadado pela turma do FF tende a ser bem menor. (+)
Na Libra estão Flamengo, Corinthians, Palmeiras, São Paulo, Santos, Grêmio, Atl MG, Bahia. Bem mais da metade da audiência está aí. No FF, de relevante tem Fluminense, Inter e, vá lá, Athletico. E há um grupo aliado do FF, com Vasco, Botafogo, Cruzeiro e Coritiba. (+)
Resisti a dar minha opinião sobre o caso Gabigol, mas uma das minhas filhas (12a) me perguntou em desespero se ele iria para o Corinthians e sinto que, sim é hora de falar em um 🧵 E já começo antecipando o final: Fica, Gabigol. (+)
Pq não queria falar? Pq, tendo sido candidato a presidente, o que eu penso como torcedor não é aquilo que eu faria se fosse dirigente. A decisão de renovar ou não com um atleta jamais deve passar pela opinião ou desejo de um dirigente torcedor. JAMAIS!!! (+)
Um torcedor não tem acesso às métricas de desempenho do atleta. Não sabe como ele está fisicamente. Não vê o quanto ele rende nos treinos. Não analisa os jogos com métodos. Não tem parâmetros de comparação. São esses critérios que devem conduzir à tomada de decisão. (+)