O @_makavelijones escreveu um artigo, em tese contra o “revisionismo histórico”, sobre o Pacto Molotov-Ribbentrop para o blog da Boitempo. No entanto, o texto contém, justamente, revisionismo histórico. Convido vocês a refletirem comigo no fio 🧶👇🏼
blogdaboitempo.com.br/2019/10/25/con…
O primeiro ponto que merece destaque é a visão de que a eclosão da guerra se dá em razão do sistema capitalista, à época colonial e imperialista. A URSS, por sua vez, representaria a luta anticolonial e antirracista. Pois bem: esse papel soviético é no mínimo discutível...
Essa visão romantizada da União Soviética não condiz com a verdade. Stalin reprisou um modelo colonial no Leste Europeu, inclusive proibindo países de fabricar produtos acabados em alguns casos; usou o nacionalismo russo para perseguir outros povos; e ignorava a questão racista.
Além das contradições soviéticas, que se declarava anti-imperialista mas praticava o imperialismo para manter sua zona de influência, a visão marxista – exclusivamente econômica – sobre a guerra atrapalhou até mesmo no processo de desnazificação da Alemanha Oriental.
Em dado momento, na paranóia com ingleses e franceses, Jones diz que a “Segunda Guerra Mundial seria uma frente única das potências liberais e nazifascista contra o socialismo soviético”. Isso nunca existiu. A política vigente na França e na Inglaterra era a do apaziguamento.
Contudo, o escopo do texto de Jones Manoel é sobre o Pacto Molotov-Ribbentrop. É nele que vou focar daqui em diante. Vamos começar com o que é verdade, mesmo que batendo em espantalho: de fato, Stalin sempre soube que o Pacto de Não-Agressão era temporário e a guerra inevitável.
Os esforços para o acordo tiveram início em maio de 1939, mês em que Stalin demitiu Litvinov, seu chanceler, por ser judeu; e, em junho Hitler, passara a não citar mais a URSS em discursos. Para os nazistas, era essencial garantir a neutralidade soviética para invadir a Polônia.
Stalin, além do motivo já mencionado de ganhar tempo para reorganizar seu Exército, vislumbrava a atraente possibilidade de as potências capitalistas europeias guerrearem entre si e embarcarem na destruição mútua. Sob esse ponto de vista, a não-agressão temporária era razoável.
Outro detalhe do texto é que Jones Manoel passa muito tempo mostrando que Stalin não foi pego de surpresa pela ofensiva nazista, dispondo inclusive de espiões confiáveis na Alemanha. Mas é importante destacar que, ingenuamente, ele achou que poderia adiar ainda mais a guerra:
Mas o que é verdadeiramente problemático é o esquecimento, conveniente, ao longo do texto, que o Pacto Molotov-Ribbentrop não se limitava à não-agressão. As cláusulas secretas abrangiam também a partilha da Polônia e a anexação (imperialista?) da Letônia, Lituânia e da Estônia.
A União Soviética acordou com a Alemanha uma divisão de zona de influências que envolvia a anexação de três nações independentes e da partilha de mais um país. Jones ignora totalmente esse fato até o penúltimo parágrafo (de 70!) – e tenta justificar de alguma forma. Difícil, né?
Fazer um artigo sobre o Pacto Molotov-Ribbentrop e falar do protocolo secreto em apenas um parágrafo, o penúltimo, num texto com mais de 70 parágrafos, parece ser má-fé. E o revisionismo, criticado pelo autor, acaba sendo praticado ao tratar o tratado como apenas “não-agressão”.
Foi um bom debate, Jones! Abraços
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