A mulher que desenvolveu 2.500 personalidades após ser abusada e torturada pelo próprio pai desde criança:
AVISO: O caso a seguir retrata abuso sexual, pedofilia e tortura. Caso se sinta desconfortável, não prossiga com a leitura.
Em setembro de 2019, 6 indivíduos testemunharam em juízo contra Richard Haynes, acusado de mais de 300 crimes, incluindo tortura e múltiplos estupros. Essas testemunhas, todavia, falaram como a mesma pessoa: o caso da mulher que criou 2500 personalidades para resistir a abusos.
Jeni Haynes nasceu em 1970, em Londres (Reino Unido). Além de seus pais, ela possuía um irmão e uma irmã. Em 1974, se mudaram para Sydney (Austrália). Com quatro anos completos, Richard Haynes, pai de Jeni, já havia iniciado a abusar da filha.
Jeni, em depoimento ao tribunal, explicou que os abusos de seu pai “eram calculados e planejados. Era intencional e ele desfrutava cada minuto”. As violações semi-diárias consistiam em estupros, espancamentos e torturas – tanto físicas quanto psicológicas.
O sadismo de Richard era fixado em Jeni: os abusos eram reservados unicamente a ela. Ele escondia suas práticas perversas da família, e ameaçava a filha para que ela não revelasse o segredo entre eles: se ela o denunciasse, ele mataria toda a família, incluindo o gato de Jeni.
A vítima também relatou como eram os abusos: “Ele me ouvia implorar para que parasse, ele me ouvia chorar, ele sabia da dor e do terror que estava me infligindo. Ele via o sangue e o dano físico que havia causado. E no dia seguinte optava por fazer tudo de novo”, recordou.
Richard também fez a filha acreditar que ele era capaz de ler sua mente, e a ordenava a não pensar sobre a situação a que era submetida. “Minha vida interior foi invadida pelo meu pai. Eu não conseguia sequer me sentir segura dentro da minha própria cabeça”, contou.
Além de ser abusada em casa, o contato de Jeni com terceiros era restrito. Ela não podia participar de atividades extracurriculares no colégio, pois se fosse “vista” em público, ou melhor, se destacasse de qualquer forma, Richard a puniria – ainda mais do que o usual.
Essa restrição se estendia até à assistência médica: seus traumas físicos e psicológicos passaram anos sem serem tratados. Em razão disso, aos 51 anos, Jeni possui lesões irreparáveis na visão, queixo, intestino, ânus e cóccix, além de Transtorno Dissociativo de Identidade (TDI).
O TDI foi o mecanismo de enfrentamento desenvolvido por Jeni para lidar com os constantes abusos. Como não se sentia segura em sua própria mente, e para esconder tudo que considerava “importante e bonito” de seu pai, ela criou sua primeira personalidade alternativa: Symphony.
Nas palavras de Symphony, uma menina de quatro anos, dessa forma, quando fosse abusada por Richard, ele não estaria “abusando de um ser humano pensante”, mas sim de um alter ego. Daí, com o passar do tempo, Symphony criou outras personalidades para a auxiliar.
As centenas – e eventuais milhares – de personalidades tinham o objetivo comum de proteger Jeni do abuso. Para tanto, assumiam o fardo de lidar com diferentes elementos, como um ataque particularmente cruel, uma imagem ou cheiro perturbador, ou até quem sofreria o ataque do dia.
Em entrevista ao programa “60 minutos”, Jeni contou que, durante a juventude, ela pensava que o comum era possuir diversas personalidades. Além disso, ratificou que a importância do trabalho de cada indivíduo: “eu não crio pessoas para brincar”.
Os abusos ocorreram de 1974 a 1981, ou seja, dos quatro aos onze anos de Jeni, período no qual seu pai foi dos 20 e muitos aos 30 e alguns anos. No fim daquele ano, se mudaram de volta para o Reino Unido. Em 1984, a mãe de Jeni, Pat, se divorciou de Richard.
Mesmo após sair de casa e denunciar os abusos que sofreu, independentemente de quem fosse, sua história era recebida com ceticismo. Foi apenas em 2007, quando Jeni informou a situação que passou ao detetive Paul Stamoulis, que foi iniciada uma investigação.
Após 10 anos de trabalho para montar um caso contundente contra o pai de Jeni, em 2017, ele foi preso e levado a julgamento. Richard foi indiciado por 367 crimes, incluindo múltiplos estupros a menor de 10, sodomia a menor de 14 e ataque indecente a menor de 16.
Para responder às denúncias, Richard foi extraditado de Darlington (Reino Unido), onde cumpria pena de sete anos por outro crime. À época, com 74 anos, ele vivia com a família estendida de Jeni, para quem dizia que a filha era mentirosa e manipuladora, conforme artigo da BBC.
Jeni não testemunhou pessoalmente contra o pai: quem o fez foram as personalidades que mais sofreram e lembravam dos abusos. Ela recebeu a autorização em março de 2019, e descreveu cada uma das testemunhas – além de Symphony – em entrevista à BBC:
Os relatos foram extremamente detalhados: “Minhas memórias como pessoa com Transtorno Dissociativo de Identidade estão intocadas como quando se formaram", contou Jeni. Psicólogos e especialistas convocados atestaram a credibilidade dos depoimentos pelas diferentes personalidades.
A Corte autorizou que mais de 30 indivíduos falassem sobre as experiências de Jeni, mas não foi necessário: na 11ª hora de relatos, Richard decidiu confessar 25 dos crimes pelos quais fora indiciado. “Os piores deles”, descreveu Jeni, se referindo aos atos confessados.
A sentença foi proferida no dia 6 de setembro de 2019. A juíza Sarah Huggett, do Tribunal local de Downing Center, condenou Richard a 45 anos de prisão, pelos crimes que admitiu e por outras dezenas que inclui na decisão. Por conta da idade, é provável que ele morrerá na cadeia.
Questionada posteriormente, a magistrada afirmou que os crimes descritos eram “profundamente perturbadores e pervertidos" e "completamente abomináveis e chocantes", e adicionou que sentença alguma poderia refletir a gravidade dos danos causados por Richard.
Sobre a condenação, Jeni declarou: “eu acho que é mágico. Ele vai pegar um ano de prisão para cada ano da minha vida que ele destruiu depois que eu fiz quatro anos. Mesmo quando acabou não foi totalmente finalizado pois ele sempre estava na minha consciência. Estou em êxtase.”
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