Você sabe quem é Elon Musk. Mas você já ouviu falar em Joshua Norman Haldeman?
Joshua era o avô de Musk, e ele tem uma história bastante curiosa – suspeito que você irá gostar de conhecê-la.
Saca só:
Joshua era esse sujeito aqui. Ele nasceu nos Estados Unidos, em 1902, mas cresceu no Canadá, onde virou quiroprático.
Ao longo da vida, Joshua teve 5 filhos – entre eles, as gêmeas Maye e Kaye.
Em 1971, Maye deu à luz ao seu primeiro filho: um menino chamado Elon Musk.
Antes de falar sobre Joshua é preciso entender esse movimento social aqui: a Technocracy Inc.
De forma bem resumida, esse grupo defendia uma mudança do sistema político para um modelo apolítico usando cientificismo para organizar a sociedade.
Confuso? Explico melhor:
O Movimento Tecnocrata foi fundado nos EUA, em 1933, pelo engenheiro Howard Scott, como uma crítica não-marxista ao capitalismo.
Em linhas gerais, a Technocracy Inc defendia:
1. O fim da democracia representativa: no lugar de políticos, a sociedade deveria ser governada por engenheiros e especialistas técnicos.
2. A abolição do dinheiro: a economia deveria ser baseada em certificados de energia, distribuídos igualmente para todos os cidadãos, e não num sistema de preços.
3. Um planejamento econômico rigoroso: a produção e distribuição dos bens e serviços deveriam ser controlados por técnicos, garantindo eficiência e eliminando desperdícios.
4. A adoção da automação no trabalho: as máquinas fariam a maior parte do trabalho de produção.
5. A autossuficiência: os recursos naturais e a capacidade industrial da América do Norte eram mais do que suficientes para fornecer uma vida decente para todos os habitantes da região.
Ao fim, todas as necessidades das pessoas – como saúde, educação, moradia ou alimentação – seriam atendidas pela Technocracy Inc. Os bens custariam de acordo com a energia necessária para produzi-los.
A promessa era que se você desse a todas as pessoas os mesmos certificados de energia, e eles cobrissem as suas necessidades básicas, a ganância acabaria.
O movimento tinha como símbolo oficial um círculo vermelho e cinza (que remetia ao yin e o yang), representando o equilíbrio entre a produção e o consumo.
A Tecnocracia nasceu na Grande Depressão, defendendo o fim das classes sociais. Como dizia Howard Scott:
"Quando se trata das ideias da tecnocracia, estamos tão à esquerda que fazemos o comunismo parecer burguês."
Scott criticava o comunismo por “não ser radical o suficiente”.
A Technocracy Inc teve seu auge nos anos 1930, quando chegou a ter mais de meio milhão de membros.
Só o New York Times escreveu 120 artigos sobre o movimento em 4 meses, entre 1932 e 1933.
Nesse tempo, os eventos do grupo reuniam milhares de pessoas.nytimes.com/search?dropmab…
Os anos 1930 experimentaram uma explosão da literatura de ficção científica, e o gênero teve um papel importante na formação e disseminação das ideias do Movimento Tecnocrata.
Entre os entusiastas do grupo estava o socialista H. G. Wells – um dos maiores autores do gênero.
Os membros da Technocracy Inc tinham hábitos bem peculiares, típicos de um culto.
Entre outras coisas, dirigiam carros pintados de cinza e usavam uniformes cinza – como forma de demonstrar compromisso com a racionalidade e a igualdade.
Quando Elon Musk anunciou X Æ A-12 como nome de um filho, essa ideia não era nova.
Membros da Technocracy Inc adotavam números nos nomes para demonstrar compromisso com a impessoalidade do movimento.
Um deles virou "10450-1" – o seu nome de batismo era Joshua Norman Haldeman.
Joshua Norman Haldeman, o avô de Elon Musk, era o líder da Technocracy Inc no Canadá.
Mas no sonho distópico do seu movimento não haveria um Canadá. Em seu lugar haveria Technate – uma massa de terra do Panamá até o Polo Norte, passando por Groenlândia, México e Canadá.
Segundo a Technocracy Inc:
Technate (a Nação Tech) “abrangerá todo o continente americano, do Panamá ao Polo Norte, porque os recursos naturais e os limites naturais desta área fazem dela uma unidade geográfica independente e autossustentável”.
archive.org/details/TheTec…
A Technocracy Inc não defendia livre comércio e entendia que o território de Technate atendia todas as demandas da população.
Em 1939, o grupo publicou uma defesa do isolacionismo, clamando para que os norte-americanos não enviassem soldados para a Europa, acossada por Hitler.
No ano seguinte, Haldeman previu um “colapso” da sociedade:
“A Technocracy Inc está se preparando para uma Nova Ordem Social que está por vir. Se você é um Tecnocrata, está fazendo tudo o que pode para estender a Organização e se disciplinar para atingir seus objetivos?”
Três meses após esse artigo, o avô de Musk foi preso no Canadá e a Technocracy Inc foi banida no país, acusada de subversão. Os canadenses desconfiavam que o grupo simpatizava com o nazismo.
Joshua tentou entrar nos EUA, mas – mesmo sendo cidadão americano – foi impedido.
Pouco tempo depois, o avô de Elon Musk se mudou para a África do Sul, onde o apartheid estava sendo implementado. Por lá, dedicou imensos esforços procurando a “Cidade Perdida” no Deserto do Kalahari.
Em 1951, ele escreveu um artigo para um jornal no Canadá defendendo o apartheid, declarando que os negros sul-africanos eram “primitivos”:
“Os nativos são muito primitivos e não devem ser levados a sério... Alguns são muito inteligentes em um trabalho de rotina, mas os melhores deles não podem assumir responsabilidades e abusarão da autoridade. O atual governo da África do Sul sabe como lidar com a questão nativa.”
Ao longo da vida, ele também escreveu coisas como:
“Os fatos da história mostram que o homem branco sempre desenvolveu o país em que habita para o benefício de todos os envolvidos.”
“O povo negro da África tem estado em contato próximo com a civilização desde os primeiros tempos, mas, por conta própria, não construiu nada e não descobriu nada, nem mesmo a roda.”
Joshua era um antissemita de carteirinha e, nos anos 1940, foi líder de um partido antissemita canadense chamado Social Credit Party. O avô de Elon Musk dizia que os judeus lideravam uma conspiração "para estabelecer uma ditadura global”, e acreditava que a África do Sul estava destinada a liderar a “Civilização Cristã Branca” na sua luta contra a conspiração judaica e as “hordas de pessoas de cor” que os judeus controlavam:
“Ela [a África do Sul] cumprirá esse destino se o povo cristão branco se unir; se eles perceberem as forças que estão por trás desses ataques mundiais; se as pessoas fizerem um estudo sobre quem são seus verdadeiros inimigos e quais são seus métodos; se ela combater seriamente os males do internacionalismo que já estão criando raízes cancerígenas em nossa sociedade”.
theatlantic.com/technology/arc…
Nos anos 1960, o avô de Musk também publicou um livro sobre saúde chamado The International Conspiracy in Health.
Na obra, criticava as vacinas (que "os promotores do Governo Mundial sempre apoiaram") e o flúor na água (parte do "programa de lavagem cerebral da Conspiração").
É claro que Elon Musk não é responsável pelas opiniões do avô. Mas algumas pessoas sugerem – como Jill Lepore, professora de História em Harvard – que o avô (morto quando Elon tinha 2 anos) influenciou a formação intelectual do neto.
newyorker.com/news/daily-com…
Numa visão bastante pessimista sobre Musk, Lepore diz que, influenciado pelo avô, o neto cresceu obcecado por ficção científica, entendendo que o futuro distópico da tecnocracia poderia ser “emocionante”.
podcasts.apple.com/us/podcast/elo…
Em 2019, Musk brincou que estava “acelerando o desenvolvimento da Starship para construir a Tecnocracia Marciana”.
Nesse tempo, quando questionado por seus seguidores como se descrevia, a resposta de Musk era:
“Um socialista.”
Musk dizia ser “socialista” – mas não do tipo que “muda recursos do mais produtivo para o menos produtivo, fingindo fazer o bem”.
Segundo ele: “o verdadeiro socialismo busca o bem maior para todos”.
Qual é a influência do avô nas ideias do neto? Poucas pessoas podem responder. Mas o desejo do grupo de Musk em construir uma oligarquia tecnocrata americana é bastante conhecido – embora o tema mereça outra thread, com uma luz mais sombria.
Se a história não repete, ela rima.
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