Rudá Ricci Profile picture
Sociólogo, trabalho com educação e gestão participativa. Presido o Instituto Cultiva

Feb 8, 18 tweets

Bom dia. Postarei um fio sobre o "equilíbrio dinâmico" da política nacional. A fala de Hugo Motta sobre o ato terrorista de 8 de janeiro gerou grande agitação nas redes sociais. Contudo, a intenção não parece ter sido muito além disso: agitação. Vamos ao fio:

1) Vou começar com a "régua ideológica" da política brasileira. Para tanto, começo diferenciando esquerda de direita e ambas do extremismo. Esquerda é denominada a força (ou forças) política que luta pela igualdade social.

2) Já a direita enfatiza a diferença entre indivíduos (forte de fracos, inteligentes de pouco inteligentes, ambiciosos de indolentes) que eles classificam como base da "liberdade individual". Por aí, direita justifica a desigualdade social como fundada na diferença.

3) A divergência entre esquerda e direita é clássica. A direita acusa a esquerda de intervir na natureza humana, penalizando os bem-sucedidos e premiando os indolentes. A esquerda acusa a direita de perpetuar a desigualdade social e propor um projeto elitista e desumano.

4) Extremismo é o conceito definido pela ciência política (cito Bobbio como referência) para classificar as forças (de esquerda ou direita) que pregam a eliminação do contrário (ou ameaçam e chantageiam) com uso de violência (verbal ou física).

5) Agora já dá para apresentar a "régua ideológica" brasileira. Não temos extrema-esquerda no Brasil, embora exista um extremo nesta régua. Há muita confusão nas redes sociais a respeito. Extremismo não é uma posição nesta régua, é o uso ou pregação do uso da violência

6) Neste caso, esquerda brasileira seria PSTU, UP, PCBR, PCB, parte do PCdoB, parte do PSOL e parte do PT. No PT, temos dirigentes nitidamente de esquerda, como Valter Pomar e Genoíno. Mas, este não é o caso da corrente majoritária (de Lula)

7) Temos, ainda, forças que estão um pouco mais ao centro que a esquerda. Portanto, misturam algo da esquerda com algo da direita. São as forças socialdemocratas e social-liberais.

8) Socialdemocratas e social-liberais valorizam a agenda social e os interesses dos empresários (que a imprensa denomina de "mercado"). A diferença é de ênfase. Socialdemocrata prioriza a agenda social de promoção do bem-estar e subordina os interesses de mercado a esta agenda

9) Já o social-liberalismo inverte as variáveis da socialdemocracia: prioriza os interesses e o desenvolvimento empresarial, subordinando a agenda social a esses interesses. O lulismo está aqui.

10) Portanto, a agenda lulista está mais ao centro, pendendo à direita que parte do PCdoB, de correntes do PT e parte do PSOL. Para ficar mais claro, Boulos sempre apresentou uma agenda socialdemocrata em suas campanhas, mas nas eleições do ano passado, sua postura foi lulista.

11) A recente demissão do economista David Deccache da assessoria do PSOL na Câmara de Deputados tem relação com esta divisão interna no PSOL entre ala lulista (social-liberal) e as outras.

12) Voltemos à régua ideológica. A direita clássica pode ser resumida ao Centrão. O Centrão foi autodenominado assim durante a Constituinte de 1987. Eram forças oriundas da ARENA. Há autores que jocosamente denominam o Centrão de "Arenão".

13) O Centrão, atualmente, é uma mistura dessa direita oriunda da Arena, com os interesses pulverizados do baixo-clero. A somatória é uma desgraça fisiológica e de captura do Estado, balançando da direita para o extremismo, dependendo das condições de pressão e temperatura.

14) A fala de Hugo Motta sobre o ato terrorista de 8 de janeiro se localiza justamente aqui, como membro histórico do Centrão, aliado de Eduardo Cunha desde sua fase imberbe.

15) No Brasil há extrema-direita, o bolsonarismo. O bolsonarismo prega perseguição, defende o uso da tortura e faz ameaças de ataque violento, além de incentivar a violência política.

16) Ora, dado que o Centrão vem da Arena, o partido dos ditadores militares, há pontos de contato com o extremismo bolsonarista. Não se trata de uma identificação total, mas de um "equilíbrio dinâmico" entre o lulismo (que paga a fatura) e o bolsonarismo (que ameaça Lula).

17) A tese aqui é simples: Motta e Alcolumbre (também do Centrão) jogarão balões de ensaio todo santo dia. Se algum pegar, eles penderão para este lado; se não pegar, ficarão parados. Este é o jogo. Esta é a "régua ideológica" brasileira. (FIM)

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