Por que o Brasil não teve uma Wall Street? 150 anos atrás tivemos a chance de criar um mercado de capitais sólido e competitivo, que poderia ter lançado o país na segunda revolução industrial e transformar a rua do Ouvidor na Wall Street Tropical. Mas não foi. Por que? Segue:
Em meados do séc 19 uma das principais atividades da economia brasileira não era nem o açúcar nem o café. Eram os escravos. Como sabemos o trabalho e a base de qualquer processo produtivo. E no Brasil havia um grupo expressivo de capitalistas que compravam e vendiam esse trabalho
Com o fim do tráfico de escravos em 1850 uma quantia enorme de capital excedente buscava por um destino. Era hora de criar um sistema financeiro pujante para absorver esse capital e direciona-lo às atividades produtivas e a Industria. Um exemplo dessa luta foi o barão de Mauá.
Para investidores dos setores comerciais, alocar recursos no setor agrícola — dominado por famílias tradicionais e poderosas- era uma opção pouco provável. Onde alocar todo esse capital desviado do lucrativo e agora proibido comércio de escravos?
A resposta encontrada não foi no mercado de capitais doméstico, mas na dívida pública imperial. O Brasil era reconhecido suas contas públicas em ordem. A dívida publica em Apólices era considerada o investimento de portfólio mais seguro do hemisfério sul.
A boa conduta nas finanças públicas foi justamente o motivo do país não desenvolver um setor financeiro privado forte. Para se abrir uma empresa S/A no Brasil era necessário um pedido direto ao Conselho de Estado — gabinete ultimo antes do Imperador.
Em Londres na mesma época abrir uma S/A em regime de era uma simples medida burocrática realizada em cartórios. A Bolsa Rio de Janeiro operava sob estrito controle estatal e o setor bancário amargava uma triste coadjuvância à sombra do todo-poderoso Banco do Brasil
Toda essa morosidade e custos nos processos em se abrir uma empresa S/A no Brasil eram enormes. E havia um motivo para isso. Ao Estado interessava mais canalizar todo esse capital oriundo do tráfico de escravos para suas impecáveis contas públicas do que para o setor privado
Vender apólices, e ações do Banco do Brasil tinha necessariamente que ser o melhor investimento de portfólio do país para manter os ativos do governo em alta. Outra razão era canalizar o capital para determinadas empresas e setores considerados estratégicos (Ferrovias especificas
Com isso o Brasil perdeu um momento ímpar para desenvolver uma legislação amigável ao investimento no setor privado. Isso só mudou em 1888 e gerou a primeira bolha da Bolsa do Rio. Para saber mais, conferir o maravilhoso livro do Summerhill:
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Um dos aspectos que gosto de reiterar nas aulas é a ligação direta entre questão climática e econômica. E se for via um pouco de história da arte melhor ainda. É o caso do belo "Vista de Delft" de Vermeer que demonstra essa ligação direta.
O que chama atenção no quadro são os dois barcos atracados no lado direito. São barcos de pesca de arenque. Mas o que tem demais? Os holandeses não foram sempre pescadores e armadores? Sim, mas até o XVI não de arenque.
Esse pesqueiros de arenque são testemunha da mini era glacial que afetou a Europa nos séculos XVI-XVIII. Com a queda das temperaturas, boa parte dos cardumes de arenques circulantes no mar do norte buscavam aguas mais aquecidas, margeando então as aguas holandesas.
Fio de Livros sobre História das Organizações e das Firmas. Pra quem quiser saber um pouco mais origens históricas da firma, da ideia de empresa e do impacto dessa ideia-conceito que mudou a história econômica global, deixo aqui 5 dicas de livros acessíveis e abrangentes!🧵👇
MICKETHWAIT, WOOLDRIGE. The Company: a short history of a revolutionary Idea
Livro curto e muito bem escrito sobre o surgimento da ideia de empresa, da antiguidade ao século XX. Foco no modelo S/A como a ideia mais revolucionária da história do capitalismo. Excelente introdução!
CHANDLER, MAZLISH. Leviathans: Multinational Corporations and the new Global History
Focado no surgimento das Multinacionais, essa coletêna analisa o surgimento do modelo no XIX, dos tipos de governança e seus impactos sociais e culturais ao longo do XIX e XX.
Job application e Postdocs la fora. Pedem Cartas de recomendação. De quem? Quem veio de universidade pequena, fora dos grandes centros, como vai competir com carta de professores pop e laureados? Afinal, +
pra que serviria uma carta de recomendação se não como critério competitivo de escolha de uma banca que não te conhece (mas pode conhecer o prof)? De que vale um professor desconhecido de pequena U dizer "Fulano é bom"? É moeda fraca, não compra nada, sabemos disso.
E assim se reproduz mais um ciclo acadêmico de méritos presumidos e mantenedores da desigualdade. "Bons currículos" são muito parecidos com redes de banqueiros e políticos que eu estudo. Orientado por fulano, com cicrano na banca. Essa roda é muito pesada, difícil de romper.
Hoje faz 4 anos (!) que defendi minha tese de doc pela @PUCRS. O tempo voa! Descontando as angústias de uma tese, foi um período maravilhoso, com muitos arquivos, viagens e uma ideia instigante. Nela eu analisei as estratégias de 🇧🇷 e 🇵🇪 para emitirem divida em Londres 1850-1880
Entre 1850-80 Brasil e Peru foram os maiores mutuários da AL. Além disso tinham títulos com menores riscos de toda a região. Mas como dois países tão diferentes institucionalmente e com reputações tão dispares alcançaram mesmo resultado por 30 anos em paralelo?
Enquanto o Brasil gozava de uma posição política e fiscal sólida, o Peru passou por momentos críticos de golpes, isolamento político, conflitos internos e arrocho fiscal. Então eu perguntei: Por que o mercado precificava Brasil e Peru muito similarmente?
Em agosto vou apresentar meu trabalho sobre Bonds municipais latino-americanos nos mercados internacionais (1880-1929) no XIV Jornadas de Investigacion de Historia Económica da @audhe_uy. O paper preliminar traz o cenário amplo desse tipo de investimento, muito popular no período
No Brasil a constituição de 1891 permitiu que Estados e Municípios lançassem bonds nos mercados sem anuência do Governo Federal. Foi uma febre. Desde cidades importantes como São Paulo até menores como Pelotas lançaram bonds em termos favoráveis.
O paper preliminar traz um comparativo entre São Paulo x Brasil e Buenos Aires x Argentina. Ali mostro que os municipais, além de menos voláteis, tinham spreads menores e eram mais bem elogiados na imprensa especializada.
Essa semana trabalhamos as origens do mercado de capitais no BR no século XIX, e falamos de marco regulatório.
Boa parte do atrofiamento do nosso setor veio de uma lei publicada em 1860, chamada "Lei dos entraves" (1/n)
Após uma crise bancária de monta em 1857, o senado conservador (fazendeiros exportadores) visando maior estabilidade cambial, culpavam empresários e "especuladores" da bolsa pela crise. Aprovaram em 1860 uma lei que praticamente alijou a nascente Bolsa de Valores do Rio
A Lei dos Entraves tinha 3 pontos sobre empresas:
-Responsabilidade ilimitada dos acionistas
-Permissão legislativa para se abrir uma empresa S/A (Senado, Câmara e Conselho de Estado!)
- 1/4 de capital realizado para poder aceder ao mercado secundário.