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1 - Proponho um parênteses no tema que nos ocupa há semanas para nos debruçarmos de novo sobre os dias agitados que antecederam a detenção de Rui Pinto, em Budapeste, a 16 de Janeiro de 2019.
2 - O motivo invocado pelas autoridades portuguesas para a emissão do mandado de detenção que resultou na captura do denunciante português foi, como sabemos, uma queixa da Doyen e do Sporting com mais de 3 anos. Em teoria, o processo anda apenas em torno disso.
3 - Com base em informação pública, na altura, sugeri nesta Thread a hipótese de as verdadeiras motivações das autoridades portuguesas serem outras. Doyen e Sporting, assuntos adormecidos há anos, pareciam ser apenas pretextos de ocasião.
4 - É que Rui Pinto era também o suposto autor de um leak massivo da PLMJ, uma das principais sociedades de advogados, ocorrido dias antes da detenção. Ao virar da esquina podiam estar segredos de Estado e informação de criminalidade económica de grande escala.
5 - O valor da informação de Rui Pinto — todos sabíamos há muito — extravasa largamente o domínio do futebol, onde tudo começou. A investigação Luanda Leaks veio confirmar isso, bem como publicações mais recentes sobre o universo empresarial do BES.
6 - O que não sabíamos é que a trama era bem mais densa e tornava ainda mais forte a intuição inicial sobre a relação entre os leaks da PLMJ e o súbito interesse das autoridades portuguesas por um português emigrado na Hungria. Segue-se uma pequena cronologia:
7 - Segunda-feira, 7/1/2019 — Primeira divulgação pública diretamente relacionada com os processos BES e Operação Marquês, ambos resultantes da exfiltração de caixas de e-mail da PLMJ.
8 - Terça-feira 8/1/2019 — Expresso publica primeira notícia com base nesse leak. Soam os alarmes na PLMJ, que no mesmo dia entra com providência cautelar com o intuito de impedir o jornal de publicar notícias com origem em e-mails seus. Sem surpresa, conseguiu.
9 - Chegámos a quarta-feira, 9/1/2019. Momento-chave. Neste dia, João Medeiros (PLMJ), acompanhado de dois colegas (Saragoça da Mata e Rui Patrício), tem uma reunião nunca divulgada e até agora desconhecida com a Procuradora-Geral da República, Lucília Gago.
10 - Nesta reunião, estiveram ainda presentes Sérgio Pena (chefe de gabinete) e Pedro Verdelho (responsável pela área da Cibercriminalidade).
11 - O motivo: três processos-crime em curso (143/17.1JGLSB, 6627/17.4T9LSB e 7161/17.8T9LSB). Os advogados foram falar “do ataque informático e posterior divulgação de informação que pelo menos um deles e as suas Constituintes foram (e têm vindo a ser) vítimas.”
12 - No encontro, ficou estabelecido um compromisso: os queixosos fariam chegar *diretamente à PGR* “toda a informação, relacionada com a referida matéria, que chegasse ao nosso conhecimento e que, na nossa opinião, revestisse interesse para efeitos de investigação criminal.”
13 - Esta reunião levanta diversas questões. Desde logo, por não estar na agenda pública da PGR ou ter sido publicitada por outros meios. Isso não a torna automaticamente ilícita, mas deixa no ar a pergunta: qual o critério da PGR para receber partes em processos-crime em curso?
14 - Tendo em conta que a Procuradora-Geral da República, apesar de ser o órgãos superior do Ministério Público, não tem funções de investigação criminal, qual o motivo para reunir com mandatários e queixosos a propósito de processos-crime em curso e já nas mãos de procuradores?
15 - Difícil perceber. Alguns meses antes, por exemplo, a PGR manifestava um entendimento radicalmente diferente. A propósito de um pedido de audiência de Bruno de Carvalho, a resposta (prontamente remetida para os jornais) era lapidar:
16 - “Após análise, verificou-se que os factos mencionados pelo requerente para fundamentar o pedido de audiência respeitam a matéria que, como é público, é objeto de inquérito que se encontra em investigação no Ministério Público do DIAP de Lisboa.”
17 - Logo, acrescentava a PGR, “foi transmitido ao requerente de que este inquérito constitui a sede própria para a junção de elementos que entenda relevantes”
18 - Ou seja, a PGR não recebe partes envolvidas em investigações em curso e remete-as diretamente para o processo, a sede própria para a junção de elementos relevantes, excepto se e quando… Se for a PLMJ? Quando está em causa um imperativo nacional - parar Rui Pinto?
19 - Perante a PLMJ, a PGR, além de aceitar reunir, aceitou funcionar como interposto de informação processual. Canal aberto. Recebia detalhes (como dados pessoais de cidadãos que a PLMJ considerava suspeitos), documentos obtidos fora da jurisdição das autoridades portuguesas,..
20 - E esse mesmo canal foi usado logo um mês depois, a 8/2/2019, quando os advogados remeteram para a PGR um extenso volume de mais de 500 páginas com diversa informação que consideravam relevante e onde forneciam, por exemplo, a identidade completa de bloggers do Sporting.
21 - Parece evidente que se estabeleceu uma relação premium entre uma das mais influentes sociedades de advogados e o Ministério Público. Se não à margem da lei, à margem da normalidade e, sobretudo, longe do alcance de qualquer advogado.
22 - Apenas 4 dias úteis depois do encontro PGR-PLMJ, o Ministério Público emitiu o mandado de detenção. Rui Pinto foi detido, em Budapeste, um dia depois. "Missão cumprida."
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