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1. Qual a relação entre ciência e fé cristã? A ciência contemporânea implica a superação do cristianismo? É possível conciliar o método científico e a fé no Deus da Bíblia? Como proceder a esta (re)conciliação? 1/5 Image
Inicio aqui uma thread de cunho apologético, tratando da relação entre fé cristã e ciência (a meta é uma postagem nova a cada dia). 2/5
A bibliografia básica será o “Dicionário de Cristianismo e Ciência” editado em português pela @ThomasNelson_br em parceria com a @CristaosCiencia... 3/5
(de fato, vou converter os apontamentos da minha leitura em posts para o IG, FB, TT e YT, e este material, eventualmente será transformado em vídeos para a playlist de Apologética do Teodidatas). 4/5
À procura de fundamentação racional relevante para a sua fé em Cristo? Então “segue o fio” e seja muito bem-vindo para me acompanhar neste percurso empolgante e animador! 5/5

#Apologética #Teodidatas
2. Um dos mais eficientes recursos para trabalhar a relação entre fé cristã e ciência é a “metáfora dos dois livros”: Deus é a fonte tanto da Bíblia quanto da criação. Esta metáfora foi usada, por exemplo, por Agostinho e Galileu. 1/11 Image
Na própria Bíblia, o Salmo 19 pode ser considerado um cântico de louvor a Deus por seus dois livros. 2/11
Na Bíblia e na natureza, portanto, temos “dois livros” diferentes, que nos ensinam a respeito de Deus. Cada um tem sua linguagem e método de interpretação (hermenêutica) próprias. 3/11
O conhecimento construído a partir da Bíblia é o conhecimento teológico e o conhecimento conhecido a partir da natureza é o conhecimento científico: a teologia decodifica a Bíblia e a ciência decodifica a natureza. 4/11
Na perspectiva dessa metáfora, todo conhecimento, bíblico ou científico, é revelado. Tratar o conhecimento como revelação significa reconhecer que se trata de uma dádiva divina, seja por meio da natureza (revelação geral), seja por meio das Escrituras (revelação especial). 5/11
Tal revelação pode ser mediada pela própria natureza ou pelo ser humano. Assim, não temos acesso direto (não-interpretativo), quer à natureza, quer à Bíblia. Por isso, tanto a Bíblia quanto a natureza estão sujeitas à interpretação (hermenêutica). 6/11
Essa hermenêutica, quer da Bíblia, quer da natureza, depende de nossas pressuposições - tanto individuais quanto comunitárias - e é construída de forma progressiva, sendo que estamos sujeitos a equívocos em cada passo interpretativo dado. 7/11
Sendo ambas - natureza e Escritura - livros provenientes do mesmo Autor, potenciais conflitos não lhes são inerentes; surgirão, ou não, de acordo com a forma como manuseamos esses livros. 8/11
No século 19 e na primeira metade do 20, por exemplo, o conflito foi fortemente pressuposto. 9/11
Mas não precisa ser assim. Antes, é plenamente possível buscar a harmonia entre teologia e ciência, desde que se tenha consciência do papel de cada uma na decodificação de seu respectivo livro. 10/11
Isso significa que o cristão pode harmonizar, sem contrapor, Bíblia e ciência, tendo sempre a Trindade como ponto de partida e fim último de sua hermenêutica, quer bíblica, quer científica. 11/11

#Apologética #Teodidatas
3.1. O papel de hegemonia que a ciência desempenha no mundo contemporâneo aponta para a importância da consideração da filosofia da ciência. Nessa linha, sua articulação por pensadores cristãos tem se demonstrado um dos mais importantes recursos apologéticos na atualidade. 1/10 Image
A filosofia da ciência lida com questões básicas como o próprio conceito de ciência, a definição de método científico, os limites da ciência e a relação entre esta e outras formas de investigação racional, como a ética e a teologia. 2/10
O método científico é marcado pela observação empírica da realidade física com a coleta de dados, aliada à articulação de hipóteses e teorias para a explicação dos fenômenos observados. Hipóteses e teorias precisam dar conta dos dados coletados e, assim, ... 3/10
... podem ser descartadas ou confirmadas. Exatamente por isso, é próprio ao método científico ser incapaz de produzir verdade objetiva; antes, o que ele alcança, por definição, é a melhor explicação da realidade até então. 4/10
A história da ciência - que vem testemunhando sistematicamente o abandono de teorias antes consideradas verdadeiras - e a própria subdeterminação das teorias pelas evidências apresentadas em seu suporte apontam para isso. 5/10
Além disso, apesar da dificuldade muito grande na enunciação de um conceito de ciência que abranja todas as teorias e hipóteses científicas, é um equívoco tentar restringir o razoável ou racional ao científico: ... 6/10
... o domínio do racional é mais amplo do que o domínio do científico na medida em que aquele lida com proposições racionais que não se sujeitam, por definição, a testes científicos (como é o caso de argumentos para uma conclusão moral). 7/10
A redução do domínio do racional ao domínio do científico é algo típico do positivismo lógico, e tem por objetivo velado negar racionalidade à investigação teológica e, até mesmo, a considerações de natureza ética. 8/10
Portanto, apesar da grande confiança que o mundo contemporâneo deposita no método científico, a filosofia da ciência nos alerta para a quantidade de incerteza que subjaz às teorias científicas e para a limitação inerente da ciência. 9/10
(Continua nos posts sobre instrumentalismo e naturalismo...) 10/10

#Apologética #Teodidatas
3.2. Partindo-se da afirmação de que o campo do racional é mais amplo que o campo do científico, o instrumentalismo (também chamado de operacionalismo) fornece um esquema adequado para a compreensão tanto da relevância quando das limitações da ciência. 1/10 Image
Registra-se apenas que o instrumentalismo não funciona como teoria epistêmica mais ampla (isso porque, aplicado, na forma de pragmatismo, a todo o espectro do que é racional, conduz a perplexidades e a consequências claramente indesejadas, especialmente no campo da ética).2/10
Mas a neutralidade do método cientifico enquanto tal permite que este seja avaliado em função de sua eficiência como instrumento, ... 3/10
... ou seja, da capacidade que tem de apresentar respostas satisfatórias aos dados empíricos medidos e prever consequências mediante relações de causa e efeito. 4/10
Noutras palavras, pode-se, por um lado, admitir que a realidade objetiva existe, mas, por outro, reconhecer que o método cientifico, por suas limitações inerentes, jamais conseguirá descrever completamente a realidade - mesmo a realidade física. 5/10
Novamente, à ciência cabe apresentar a melhor explicação da realidade até então. 6/10
Assim, a perspectiva instrumentalista permite que se deposite o grau necessário de confiança na ciência e na tecnologia na exata medida de sua eficácia demonstrada no passado e de sua capacidade de prever acontecimentos futuros, ... 7/10
mantendo-se o ceticismo que naturalmente decorre das limitações inerentes à ciência. Noutras palavras - e certamente sem a verbalização desse nível de reflexão epistêmica - ... 8/10
... é precisamente por causa do instrumentalismo que as pessoas entram num avião confiando que irão chegar em seu destino cruzando o céu a quase 1.000 km/h. 9/10
Essa percepção limitada da ciência como instrumento é proposta por Gordon H. Clark em seu livro “A Filosofia da Ciência e a Crença Cristã”, do qual se extrai:
“Em vez de ser a única porta de entrada para todo conhecimento, a ciência não é uma forma de conhecimento, seja qual for — a menos que [...] se trate de um conhecimento do que fazer em um laboratório.”

(Continua no post sobre naturalismo...) 10/10

#Apologética #Teodidatas
3.3. Outra forma de vislumbrar as limitações da ciência e suas implicações para a relação desta com a fé é compreender a diferença ente naturalismo metodológico e naturalismo metafísico ou filosófico. 1/9 Image
O primeiro (naturalismo metodológico) refere-se ao método científico enquanto tal. Concorda que a ciência limita-se à investigação material da natureza e que o sobrenatural está fora de seu âmbito. 2/9
Não nega, no entanto, a possibilidade do sobrenatural; somente afirma a sua inescrutabilidade científica (algo que o é por definição). 3/9
Da mesma forma, o materialismo metodológico não é anti-teleológico; ou seja, não há qualquer contrariedade entre o método científico e a compreensão que existe uma finalidade nas coisas. 4/9
Assim, é possível inclusive considerar compatíveis a cosmologia do Big Bang e a biologia evolucionista com a ideia de um Deus criador e providente - aliás, a providência divina pode agregar maior abrangência explanatória para essas teorias. 5/9
Em suma, não há nenhum problema que cristãos reconheçam o naturalismo metodológico. 6/9
Já o segundo (naturalismo metafísico) diz respeito à apreciação da realidade de forma mais ampla. O naturalista metafísico nega a existência de qualquer realidade que não seja material e natural (o que também se chama de materialismo). 7/9
Por se tratar de uma posição filosófica, e não científica, a abordagem do naturalista metafísico, ao embutir filosofia na ciência, assume contornos de desonestidade intelectual. 8/9
O verdadeiro conflito, portanto, não é entre fé e ciência (ou naturalismo metodológico), mas entre naturalismo metafísico e fé. 9/9

#Apologética #Teodidatas
4.1. Tendo já contemplado a metáfora dos “dois livros” e percebido a importância de um olhar atento para a filosofia da ciência, agora podemos pensar nos modelos de compatibilização entre fé cristã e ciência. 1/6 Image
Iniciamos pelo “concordismo”, modelo que pressupõe correlação direta entre Bíblia e ciência e, assim, procura extrair implicações científicas imediatas das declarações bíblicas. 2/6
Exemplo da aplicação de um modelo concordista está na suposição de que Gênesis 1 trata de seis das literais (criacionismo da terra jovem), ou mesmo na teoria dos dias-era (criacionismo da terra velha). 3/6
O concordismo tem a vantagem de lidar com a Bíblia - texto autoritativo - de uma maneira autêntica, reforçando sua relevância em meio a uma sociedade já saturada de ciência. 4/6
No entanto, pode-se apontar como ponto negativo o seu anacronismo, uma vez que o concordismo projeta a concepção contemporânea de ciência e história sobre o texto bíblico. 5/6
Nessa perspectiva, pode ter a tendência de desconsiderar o contexto original, em especial a relação autor-audiência, e o caráter espiritual inerente à mensagem, que lhe confere contornos teológicos extremamente relevantes, mas, não necessariamente, científicos. 6/6

#Apologética
4.2. Outra forma de articular a relação entre fé cristã e ciência é o não concordismo. Na visão do não concordismo, paralelos entre Bíblia e ciência não são necessários. Ou seja, não é necessário pressuporem-se implicações científicas das declarações bíblicas. 1/7 Image
Isso porque se assume que a narrativa bíblica deve ser compreendida à luz do contexto histórico-cultural da mensagem original, em especial no que concerne à mensagem espiritual, ao sentido teológico pretendido pelo autor e compreendido por seu público - ...2/7
... o que também não significa pura e simplesmente espiritualizar ou alegorizar o texto bíblico.

A perspectiva não concordista, por exemplo, não se preocupa em extrair sentido científico do relato da criação encontrado em Gênesis 1, ... 3/7
... afirmando que o próprio gênero literário adotado pelo texto, num paralelismo entre os três primeiros e os três últimos dias, incentiva essa interpretação não-literalista. 4/7
Assim, o valor teológico da passagem está na afirmação do Deus trino como criador, aspecto, ademais, que por definição se encontra fora da possibilidade de investigação científica. 5/7
Pode-se apontar como ponto positivo do não concordismo a tendência de lidar de forma séria com o texto bíblico, numa hermenêutica engajada com seu contexto histórico-cultura original, norteada pelo princípio reformado segundo o qual a própria Bíblia deve interpretar a Bíblia. 6/7
Em contrapartida, deve-se tomar cuidado para não alegorizar ou espiritualizar excessivamente o texto (um dos riscos do modelo), especialmente onde a própria Bíblia não conduz naturalmente a este tipo de interpretação. 7/7

#Apologética #Teodidatas
4.3. Tendo já estudado os modelos do concordismo e do não concordismo no que diz respeito à relação entre fé e ciência, lembrando ainda a “metáfora dos dois livros”, podemos agora pensar numa outra metáfora, a “metáfora da DR”. 1/7 Image
A relação entre fé cristã e ciência pode ser comparada a uma relação entre duas pessoas, em que cada uma tem suas funções, mas ambas se unem num propósito comum (o casamento). 2/7
Se o relacionamento for abusivo, tóxico, disfuncional, não cumprirá com seus objetivos, podendo até mesmo chegar ao fim (divórcio). 3/7
No entanto, a manutenção de um relacionamento saudável - daí à “metáfora da DR” - fará não só com que ambos os cônjuges se realizem individualmente, mas também que o propósito do casamento se cumpra plenamente. 4/7
Se, por um lado, ciência e cristianismo têm experimentado, ao longo da história, altos e baixos em seu relacionamento (em alguns momentos, quem sabe, chegando até ao divórcio), por outro, as coisas não precisam necessariamente ser assim. 5/7
Novamente, tudo vai depender de como manuseamos os “dois livros” de Deus (Bíblia e natureza). 6/7
Se Deus reúne todas as coisas em Cristo (Ef 1.10), e se Cristo, por sua cruz, promove a reconciliação de todas as coisas consigo mesmo (Cl 1.20), isso também vale para a reunião e a reconciliação entre fé cristã e ciência! 7/7

#Apologética #Teodidatas
5. Qual a relação entre a fé cristã e a racionalidade? A fé é uma atitude do coração, da razão ou um meio-termo entre esses dois? A fé cristã pode ser concebida como um ato racional?

Segue o fio... 1/10 Image
A ideia do “meio-termo de ouro”, de fato, parece ser a que melhor explica a relação entre fé cristã e racionalidade. Assim, pode-se afirmar uma relação de relativa autonomia, mas também de reciprocidade, entre fé cristã e razão. 2/10
Antes de tudo, a fé é uma decisão do coração, uma resposta experimental e existencial ao chamado do Espírito Santo de Deus. 3/10
Mas a fé cristã é também racional, no sentido de que é possível argumentar em favor da veracidade do cristianismo (e é exatamente para isso que a apologética serve). 4/10
Assim, ainda que a resposta ao chamado de Deus seja algo ligado ao coração, ela não ocorrerá se alguém não estiver convencido da veracidade dos fatos básicos do cristianismo, ... 5/10
especialmente aqueles ligados à existência de Deus, à identidade divina de Jesus Cristo, sua morte substitutiva na cruz do Calvário e sua ressurreição. 6/10
Alvin Plantina considera a fé cristã como “crença avalizada” (e, portanto, uma forma válida de conhecimento racional, embora não limitada a isso), afirmando-a como conhecimento realmente básico fundamentado no testemunho interior do Espírito Santo. 7/10
Logo, se os fatos básicos que compõem o cristianismo - existência de um Deus criador e redentor que se manifestou por intermédio de Cristo - forem verdadeiros (e aqui Pascal lhe chama para uma aposta...), ... 8/10
então, de acordo com a epistemologia de Plantinga, a fé cristã constitui conhecimento verdadeiro.

Nesse sentido, William Lane Craig afirma de que o cristão tem um duplo aval para sua fé: o testemunho interno do Espírito somado a bons argumentos e evidências. 9/10
Essa é uma posição de meio termo entre o fideísmo e o mero racionalismo teológico.

Gostou da explicação? Este tema será assunto de um dos vídeos do Webinário sobre #Apologética no #Teodidatas, no dia 18.07.2020. Anote em sua agenda e se inscreva no canal. Não perca! 10/10
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