Há 273 anos, em 20/05 de 1747, o mundo conhecia o primeiro ensaio clínico randomizado (ou “trial”), o tipo de estudo capaz de evitar a maior quantidade de vieses de coincidência.
Mas a história começou bem antes disso, na Babilônia... 🧵
Está descrito na Bíblia (livro de Daniel) que Nabucodonosor, rei da Babilônia, fez o primeiro ensaio da história. Dividiu pessoas para fazerem dieta com carnes e vinhos versus legumes e água.
Após 10 dias, estes últimos “pareciam mais saudáveis”.
Em 1747 que James Lind fez o que é considerado o primeiro ensaio clínico: dividiu marinheiros em seis grupos e dois desses pacientes se alimentaram de frutas cítricas, sendo curados e até ajudaram nos cuidados dos outros. Era descoberta a cura para o Escorbuto.
Já o primeiro grande trial moderno foi encabeçado pelo eminente pesquisador Bradford Hill em 1948. A pesquisa que demonstrou que Estreptomicina tratava tuberculose foi tão bem estruturada para evitar vieses, que é, até os dias de hoje, um modelo de ética a ser seguido.
Parece irônico que justamente no dia de hoje (20-05), em que comemora-se o #ClinicalTrialsDay, somos surpreendidos por um absurdo cometido pelo Ministério da Saúde, com conivência de diversos colegas que deveriam estar ao lado da ciência e dos pacientes.
Se a humanidade hoje vive mais e padece menos em sua juventude de doenças de simples tratamento, isso se deve ao trabalho de cientistas. Nunca se deveu a fake news, populismos baratos, mentiras, bad science.
Os ensaios clínicos e as pesquisas sérias, a genialidade e a criatividade humana, e não a pesquisa ocasional de redes sociais, salvaram e vão continuar salvando vidas. 🧵
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O que conhecemos de ECG sobre infarto é, hoje, muito diferente do que conhecíamos cinco anos atrás.
Neste estudo, definimos um sinal de infarto do miocárdio por oclusão coronária aguda (OCA) tão bom quanto o supra de ST: a onda T hiperaguda. Segue o fio.
Que a onda T hiperaguda (HATW) é um sinal de OCA, isso já se sabe há muito tempo. Ela precede, fisiopatologicamente, o supra.
O problema é que ela é um achado muito visual, subjetivo. E sofre mais que o supra do viés temporal: uma T é mais hiperaguda a cada minuto de isquemia.
Então isso sempre foi difícil de ensinar para os residentes ou futuros médicos. Nosso estudo aplicou IA para diagnosticar infarto oclusivo que foi definido como contexto de síndrome coronária aguda + fluxo ausente em alguma coronária OU
Vamos brincar?
Imagine que você está infartando e o médico lhe disse que o tratamento é com a "CABEÇADA MÍSTICA", que consiste em bater a cabeça contra uma almofada especial que ele trouxe da Tanzânia. Natureba.
Você vai sobreviver? Escolha uma das probabilidades (ex: F6)
Este médico repetia coisas como "integrativo", "a medicina baseada em evidências é ultrapassada", "a minha experiência vale mais", "eu já tratei vários pacientes que sobreviveram".
A urna foi revelada: você sobreviveu (a bola escolhida era azul) ou morreu (vermelha)?
Com o tratamento moderno de infarto, a probabilidade de morreu caiu de 60% (60 bolas vermelhas) para aproximadamente 4% (4 bolas vermelhas).
Esta é a urna revelada, quando se trata corretamente o infarto. E aí, tratado pela Medicina séria, você sobreviveria?
“There is no need to change the STEMI-NSTEMI paradigm. I never see false negatives.”
We published the article “The no false negative paradox in STEMI-NSTEMI diagnosis” in Heart (BMJ), and I’ll explain this paradox with a story: José de Alencar sees a patient with angina. 🧵
José de Alencar does not know, but this patient has a thrombus acutely blocking one of his coronary arteries. Unfortunately, there is no ST-segment elevation.
José de Alencar, therefore, classifies the patient as NSTEMI. Could he have done differently?
Since the patient has NSTEMI, José de Alencar does not activate STEMI protocols. If the patient were lucky enough to show the sign that defines the disease, treatment would occur within 30-120 minutes.
But he’s unlucky and will be treated hours or even days later.
Mr. Uzendu estava jogando basquete quando caiu no chão. Os amigos achavam que ele estava fingindo de desacordado. Mas ele acabara de ter uma morte súbita.
Esta é a forma com que morrem 13% das pessoas do planeta.
Eu sou cardiologista e vou ensinar a reconhecer uma morte súbita.
Talvez por vermos tantas mortes na ficção, tendemos a pensar que a morte súbita é o simples e abrupto fechar dos olhos e perda do tônus muscular.
Mas, na vida real não é nada parecido com isso.
Primeiro, pode parecer com uma convulsão.
Muitos casos de parada cardíaca se iniciam com uma fase de elevado tônus muscular. A pessoa fica dura.
Isso ocorre em mais de 60% dos eventos de cessação da irrigação cerebral por causa definitivamente cardíaca registrados ao vivo em Tilt Tests.
O médico pede troponina, exame cardíaco que detecta infarto, e dá positivo.
Diagnóstico: Infarto.
Na verdade, Ednaldo tinha embolia pulmonar.
Os médicos nunca descobrirão este erro. Segue o fio para entender “a armadilha da troponina”.
Quando digo que “os médicos nunca descobrirão”, eu não estou falando dos médicos que o atenderam, mas me refiro a qualquer médico. O erro não é apenas diagnóstico, mas COGNITIVO.
A gênese do problema está em um viés chamado “viés da incorporação”.
Este viés existe quando o resultado de um exame dá nome a uma doença.
Lembra que falei que troponina aumentada aponta para infarto? "Infarto” é definido pelo aumento da troponina associado a clínica compatível.
Perceba que a troponina é o teste e é a definição da doença.