Bom dia. Hoje, vou refletir sobre a mudança de comportamento da juventude brasileira. A noção de juventude passou a ser plural. Agora, se fala em juventudes. O plural se refere, até aqui, as diversas identidades ou subculturas, as inúmeras tribos ou times. (segue o fio)
1) É possível que as redes sociais tenham emplacado uma nova forma de sociabilidade, mais fluida, e acelerada, onde a ideia do dia anterior submerja em meio à uma profusão de novas informações. Pode ser, ainda, que as juventudes tenham sido sempre assim e faltava um habitat
2) Mais de 24 milhões de crianças e adolescentes, com idade entre 9 e 17 anos, são usuários de internet no Brasil, segundo pesquisa TIC Kids Online Brasil 2018. Significa que mais de 85% das crianças e adolescentes do Brasil acessam a internet.
3) Significa que mais de 85% das crianças e adolescentes do Brasil acessam a internet. Na faixa entre 15 e 17 anos, o percentual é um pouco maior: 86% de usuários. Crianças e adolescentes assistem a vídeos, programas, filmes ou séries na internet.
4) A internet é mais usada por meio de telefone (93%) e desde 2014, o uso de telefone celular ultrapassou o uso de computadores. A mesma pesquisa indicou que WhatsApp e Instagram como as principais redes usadas no Brasil neste intervalo etário. Mas, vem mudando em curto tempo
5) Whatsapp e Facebook trocaram de lugar, na preferência de crianças e adolescentes brasileiros entre 2015 e 2018. O Instagram passou a ser mais utilizado neste período e o Snapchat e o Twitter, que pareciam em evolução, caíram ou estacionaram num patamar bem baixo de uso.
6) Esta mudança em curto intervalo de tempo talvez dê uma luz sobre a mudança atual de parte da juventude brasileira em relação à pandemia e ao governo Bolsonaro.
7) Uma parte considerável dos jovens apoiou Bolsonaro em 2018. Pesquisa coordenada por Isabela Oliveira Kalil, da Fundação Escola de Sociologia e Política de SP, indicou 16 agrupamentos sociais que tiveram forte participação na campanha do atual presidente, sendo 3 de jovens
8) O primeiro subgrupo de jovens que apoiaram Bolsonaro em 2018 é o composto por nerds, gamers, hackers e haters, homens entre 16 e 34 anos. Se reúnem em fóruns restritos, jogos online e caixas de comentários de sites de cultura pop.
9) Este subgrupo sente prazer em organizar ataques à algumas páginas de personalidades por quem não têm apreço. Foram responsáveis por disseminar a imagem de Bolsonaro como “mito”, além de projetar o perfil jocoso e provocador. Repudiavam progressistas, feministas e gays.
10) O segundo subgrupo jovem foi o composto pelos que pregaram voto rebelde contra a “doutrinação marxista”: jovens estudantes do ensino médio ou estudantes universitários, que têm entre 14 e 30 anos, não se sentem acolhidos pelo ambiente escolar
11) Nos grupos de estudantes do ensino médio público apareceram apoiadores que enxergavam Bolsonaro como um outsider que conferia no ambiente escolar a noção de voto “descolado”. Contrários às políticas públicas que possibilitam acesso dos jovens de ensino público na universidade
12) Dentre os universitários, os discursos sobre cotas e mecanismos que incentivam a entrada de certos grupos sociais no ensino superior se destacavam, envolvidos num discurso que se autoidenficavam como “estudantes pela liberdade”.
13) Finalmente, o subgrupo de jovens influenciadores digitais, focados na defesa da meritocracia e na chancela “salvando o Brasil de se tornar uma Venezuela”. Produtores de conteúdo para as redes sociais, como Youtube, Instagram e Facebook
13) Não eram inteiramente alinhados com Bolsonaro, mas acreditavam que “arrumaria a casa” e combateria a corrupção. Se reagrupavam em convertidos (pessoas que já foram comunistas, gays, feministas, ateus ou militantes de esquerda) e celebridades (cantores, atletas e artistas)
14) Parte possuía afinidades ideológicas com a direita internacional). Sentem forte repulsa ao “comunismo”, “às ideologias de esquerda” e aos movimentos sociais ou quaisquer grupos que possuam preocupações com as minorias sociais. Denunciam o "autoritarismo de esquerda"
15) Esses três subgrupos jovens que apoiaram Bolsonaro em 2018 parecem se desgarrar do “mito” neste segundo trimestre de 2020. Felipe Neto parece ser o emblema deste movimento. O que estaria provocando tal mudança nesta parcela da juventude (ou das juventudes)?
16) Não descartaria que parte dos jovens que desejavam que Bolsonaro “arrumasse a casa” se frustrou com a balburdia que se revelou o seu governo. Com a saída de Moro, o abalo pode ter sido ainda maior.
18) O esgotamento parece estar afetando a todos brasileiros, em meio à clausura ou ao risco de ser contaminado pelo Covid19. Esta nova realidade afeta diretamente o sentimento de liberdade da juventude.
19) A tentativa de Bolsonaro em excitar permanentemente apoiadores para confrontarem com medidas de segurança sanitária colide com as informações científicas e acontecimentos e declarações de celebridades de outros países que chegam aos jovens “descolados”.
20) Finalmente, o sentimento anti-establishment que forma grande parte do ideário jovem. Bolsonaro se tornou governo, o centro da república brasileira e, portanto, ou teria que ter alterado a lógica do poder estabelecido ou apareceria como parte do jogo tradicional da política.
21) O fato é que o mundo gira. E gira ainda mais rápido quando se tem menos de 30 anos. A coalizão bolsonarista vai fazendo água justamente porque se esfacelou em meio à frustração, esgotamento e mudança de hábito. Os jovens querem entender o que está ocorrendo.
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Bom dia. Por mais paradoxal que possa parecer, acho que Hugo Motta ajudou Lula a sair de uma arapuca. Explico a afirmação no fio que começa agora:
1) Até então, o Lula3 estava amarrado ao Centrão, praticamente paralisado. O medo que tomou conta de Lula tinha como fonte a capacidade de mobilização do bolsonarismo que poderia desmoralizar a sua história de líder de massas.
2) Eis que, de repente, o bolsonarismo coloca 12 mil pessoas na avenida Paulista e Hugo Motta resolve peitar o projeto de Haddad sobre o IOF. O IOF era a tábua de salvação para dar sobrevida às contas governamentais.
Boa tarde. O fio de hoje é sobre o calcanhar de Aquiles dos Bolsonaro: agitam, mas não organizam. Lá vai:
1) Max Weber nos ensinou que há um tipo de líder que arrebata as massas pela paixão. Raramente se relaciona com as tradições e é ainda mais raro respeitar regras e normas. Trata-se do líder carismático.
2) Carisma significa “toque de Deus”. Por algum motivo, alguém é escolhido para se sacrificar ou para se distinguir dos outros humanos. Ele parece igual aos outros, mas algo o diferencia da multidão.
Bom dia. O fio de hoje é sobre a frase de Chico de Oliveira que postei ontem por aqui. Dizia que os anos 1990 retiraram a musculatura do Estado brasileiro e o século 21 retirou a musculatura da sociedade civil. Lá vai:
1) O Estado foi criado como garantidor da estabilidade social cujo objetivo era sustentar que as expectativas individuais (e coletivas) fossem passíveis de serem realizadas.
2) Se no século 19 surgiu a ideia de proteção social via intervenção estatal – vindo do improvável projeto de Bismark -, no século 20 se projetou, via socialdemocracia, a lógica da promoção social via amplas políticas de Estado.
Bom dia. Postarei um fio sobre o Centrão. Minha leitura é que ele é uma ponta de lança do fisiologismo e da direita brasileira que necessita se aliar com governos progressistas. Explico:
1) O que não parece ter um encaixe equilibrado é a necessidade do Centrão se aliar à liderança de um polo progressista. Foi assim com FHC, puxado por ACM. O faz agora com Lula.
Fico pensando no que o move para este lugar.
2) Uma possibilidade é o fisiologismo que o marca, focado nos espaços miúdos e na fragmentação territorial. Por aí, o Centrão teria muita dificuldade para esboçar um projeto nacional.
Boa tarde. O fio de hoje é uma tentativa de leitura do que me parece um sistema político federal criado após o início do Lula3. Sei que qualquer leitura mais crítica ao governo Lula atrai uma enxurrada de ataques e desesperos, mas sinto que chegou o momento de abrirmos discussão
1) É conhecida a tese de Chico de Oliveira em sua “Crítica à razão dualista”: existiria um todo sistêmico que gerava uma especificidade da economia e sociedade brasileiras e que era interpretado por parte da intelectualidade brasileira como subdesenvolvimento.
2) A dualidade evitava compreender a lógica integrada entre atraso e pujança como um todo devido ao que sugeria ser proveniente de certo moralismo intelectual.
Bom dia. Farei um brevíssimo fio sobre um dos melhores livros da área da sociologia (estaria mais para o campo das teorias do pensamento social) dos últimos anos, o livro "Lugar Periférico, Ideias Modernas". Lá vai:
1) Este livro faz uma cartografia da sociologia brasileira, principalmente paulista, desde o famoso Seminário Marx, iniciado em 1958 e que envolveu Giannotti, FHC, Weffort, Fernando Novaes, Roberto Schwarz, dentre outros.
2) O livro, além de muito bem escrito e rigoroso, se diferencia no panorama recente de empobrecimento intelectual. O diagnóstico do país é hegemonizado pela raquítica leitura da microeconomia. As redações da grande imprensa aceleram este processo pragmático e reducionista