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bom gente pra quem não sabe nos últimos anos eu consegui realizar meu sonho de trocar de área e botar o pezinho pra fora do trabalho com comunicação, o que resultou em trabalhar com uma indústria completamente diferente, e me levou a acumular conhecimento sobre……… arroz
existem inúmeras variedades de arroz diferentes, todas elas derivadas da mesma planta, oryza sativa. a domesticação do arroz começou há milênios, e até hoje, são desenvolvidas novas variedades, em processos de seleção continuada, sem a interferência de transgênicos.
no mundo, consumimos três principais grupos de arroz: o arroz índico, o arroz japônico e o arroz glutinoso. o arroz índico é formado por grãos compridos, de rápido cozimento. o arroz japônico possui grãos pequenos e arredondados. o arroz glutinoso mais conhecido é o arbório.
aqui no Brasil plantamos extensivamente arroz índico. o tipo mais conhecido é o agulhinha. nas plantações de arroz branco é comum encontrar o arroz vermelho, que possui maior resilência (genes dominantes). o arroz vermelho é visto como uma praga pelos produtores, e é descartado.
o arroz vermelho é, porém, bastante consumido pela culinária tradicional brasileira, em especial a culinária nordestina. o seu preparo varia de acordo com as regiões e, principalmente, varia de acordo com o ramo de origem. existe arroz vermelho índico e japônico (cateto vermelho)
mas isso não vem ao caso. eu vim aqui comentar é sobre o vídeo da moça cozinhando arroz sem refogar o grão.

no Brasil, nós refogamos os grãos de arroz, em especial o agulhinha branco, em um processo conhecido como FRITURA. é pra fritar o grão mesmo.
essa FRITURA cria uma deliciosa capinha de gordura em torno do grão, acelera seu cozimento e impede que ele solte a amilase, que é o elemento químico responsável por empapar o arroz. a amilase é mais presente em grãos de arroz arbório, mas está presente em todos os grãos de arroz
essa FRITURA tem um outro nome culinário, mais adequado, e muito comum na culinária oriental, em especial a culinária chinesa: branquear. o branqueamento consiste em passar os alimentos rapidamente no óleo fervente, preservando texturas e sabores.
o miojo é, por exemplo, um alimento branqueado. mas é possível branquear os alimentos também com água fervente. no mercado, você pode comprar arroz agulhinha branqueado com água: o conhecido arroz parboilizado. o nome deriva do inglês, PARTIAL BOILED, cozimento parcial.
a parboilização altera o sabor do arroz pois, assim como num bom vinho, a maior parte dos nutrientes desse grão está presente na casca. a parboilização preserva o pericarpo mesmo após o polimento, deixando o arroz mais escuro e, teoricamente mais saudável (há controvérsias).
mas é fato que a parboilização, esse branqueamento industrial feito com água pressurizada, acelera o cozimento do arroz, e garante um acompanhamento mais "soltinho", de acordo com o gosto local do brasileiro, especialmente nas regiões Sul e Sudeste.
o Brasil é um grande exportador de arroz parboilizado, em especial o arroz agulhinha e o agulhinha integral. o arroz integral é apenas o arroz que não passou pelo processo de polimento; ele não passa pelo polimento com pedra, e sim por uma bobina plástica, preservando o grão.
por ser um alimento menos processado, o arroz integral tem um tempo de cozimento elevado. isso acontece justamente pelo pericarpo (casca interna) do grão estar intacta. e o pericarpo é duro!

parboilizar o arroz integral reduz consideravalmente esse tempo de cozimento.
no vídeo, a moça está usando arroz branco parboilizado. ela está usando arroz índico, como consumimos no Brasil, provavelmente arroz agulhinha. apesar de eu não entender muito bem porque ela não fritou a cebola, é compreensível ela não branquear com óleo um grão parboilizado.
agora, sobre técnicas de cozimento.

conforme eu expliquei acima, aqui no Brasil temos o costume de refogar o grão do arroz agulhinha polido com alho, óleo e sal, depois cobri-lo com água, tampar a panela e não mexer até que toda a água tenha evaporado.

essa é uma técnica local.
não à toa, o preparo do arroz jasmine e do arroz basmati, ambos também variedades índicas, não é muito diferente. o arroz é refogado, aromatizado, salgado, e cozido com a tampa da panela fechada.

arroz índico é tradicionalmente apreciado pela sua leveza, por ser "soltinho".
o mesmo não pode ser dito do arroz japônico. o arroz japônico é apreciado principalmente pela sua viscosidade, resultado da alta concentração de amilopectina. a pectina é a proteína de origem vegetal que "cola" os alimentos. uma fruta com alta concentração desse açúcar é o limão.
a maior parte das compotas leva limão ou outros cítricos justamente devido à pectina. a amilopectina é o que torna esses arrozes "doces", e garante que eles fiquem bem unidos após o cozimento.

com o arroz japônico, você quer essa viscosidade. com o arroz índico, não.
apesar do termo, as variedades japônicas não são exclusivas da culinária japonesa. aqui no Brasil temos plantações extensivas de uma variedade heirloom (de origem, selecionada manualmente por gerações) conhecida como cateto.

mas o que é o cateto?
pra começar, o cateto tem esse nome emprestado de um porquinho sul-americano. é um bichinho selvagem, um bichinho local.

o cateto, que consumimos no Brasil, não é tipicamente brasileiro, mas foi cultivado aqui há mais ou menos cem anos.
o principal público consumidor do cateto são criadores de passarinhos e pessoas que procuram variar sua dieta de alguma forma. o cateto integral aparece bastante em restaurantes veganos e vegetarianos, em planos de dieta macrobiótica e como alimento pré-treino.
o cateto é visto como um arroz "saudável" por conta do seu baixo índice glicêmico, apesar de ser rico em amilopectina, como qualquer arroz japônico.

traduzindo: o cateto engorda menos.
apesar de algumas pessoas preferirem branquear o cateto com óleo e alho, como fazemos com agulhinha, não é necessário fazê-lo. pois o cateto é tão resistente ao cozimento, em especial o cateto integral que a panela de pressão pode ser uma opção mais viável.
essa visão de que uma variedade é mais saudável por ser mais… magra… não corresponde à realidade. pois, do ponto de vista da concentração de anti-oxidantes, as v=mais saudáveis são as mais escuras. sim, o arroz vermelho, que é considerado uma praga, é SEMPRE mais saudável.
as antocianinas, as moléculas que deixam alimentos de origem vegetal mais escuros, são as mesmas que respondem pela concentração de anti-oxidantes. o açaí é um alimento anti-oxidante pela concentração de antocianinas. o vinho tinto, pelo mesmo motivo. mirtilos, amoras, etc.
no geral, quanto mais escuro o arroz, mais saudável ele é. por isso o arroz preto, em específico, é vendido como um superalimento.

o aroz preto é originário da China, mas não é possível plantar as sementes chinesas aqui, no Brasil, sem fazer essas adaptações que duram gerações.
aqui no Brasil temos uma variedade heirloom de arroz preto desenvolvida no Vale do Paraíba, em São Paulo, conhecida como IAC-600. o resultado é um grão de tamanho médio, entre o agulhinha e o cateto, com um sabor de pinhão. como era de se esperar devido ao terreno onde é plantado
levou décadas de pesquisa para desenvolver o arroz preto IAC-600. gerações e gerações de colheitas selecionadas, testadas e separadas até chegar a um resultado satisfatório, aromático, saboroso, que sobrevivesse ao clima subtropical brasileiro e fizesse bonito no prato.
nas plantações do arroz preto IAC-600, ainda temos a presença garantida dele mesmo, os grãos vermelhos! esses grãos são separados numa máquina que identifica por imagem o arroz que é escuro o suficiente para ser considerado preto dos grãos mais claros. é tudo a mesma planta!
outra máquina separa os grãos quebrados, que são considerados de qualidade inferior (brekky rice), pelo menos aqui no Brasil. um critério importante de qualidade do arroz, é a quantidade de grãos quebrados. mas na Tailândia, por exemplo, os grãos quebrados são aprecidados.
aqui, os grãos quebrados são utilizados pela indústria de outra forma. farinha de arroz é um deles. quirera de arroz é outro.

a farinha de arroz branco de alta qualidade é o que envovle as capas de comprimidos, por exemplo. ciência!
os grãos quebrados de arroz preto são vendidos principalmente na Austrália como uma espécie de cereal "gourmet". um termo que eu, pessoalmente, detesto, pois cria noções de valor em alimentos que não correspondem à quantidade de esforço envolvida em seu desenvolvimento.
lembrando que o grão quebrado é o grão que deu "defeito", logo, não deveria ser vendido como algo tão caro.

consumir arroz cozido como um mingau é algo comum entre quem não ingerem proteína animal. o arroz preto é especialmente rico em proteína, e é uma alternativa interessante.
inclusive é uma prática esquecida pela população urbana do Sudeste e do Sul do Brasil, que está acostumada com o paladar regional do arroz "soltinho". se você subir um pouco para o Nordeste e até mesmo na zona da mata, em Minas Gerais, mingau de arroz volta a ser comum.
(pense arroz doce)

outro critério de qualidade do arroz tem a ver com a forma como os grãos cozinham.

é importante que o arroz japônico, por exemplo, cozinhe sem abrir os grãos, mantendo o gérmen intacto, e não estourando feito canjica. mas é difícil chegar a esse resultado!
abaixo uma das minhas fotos favoritas de algumas das variedades de arroz de primeira qualidade plantadas no Brasil. olha só quanta diversidade, quanta variedade. ali tem o agulhinha integral misturado com cateto vermelho, e o agulhinha misturado com preto IAC-600 e vermelho.
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