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Oi amigos! Histórias do vô chegando!
Hj falei com meu avô e acabei de sair do telefone com minha mãe tb. O causo é complexo pq acabei tendo que ouvir os dois sobre aquele tempo - e eles têm memórias diferentes.
Falei com o vô sobre a qntidade de gente linda mandando bj. Fui lendo os nomes, @veiadoscausos, @LisandraP_MS, @tatizinhaf , @AmarinaLobo, @mamaisou e mais um monte que listei. "Ô povo com nome engraçado", rs. Ficou rindo de bobo como ñ via faz tempo.
Outra coisa que conversei com ele foi essa mudança de crença. Ele sempre foi bem cético sobre td, com a vó uma carola. Agora está mais religioso, como vcs repararam. Ele não soube explicar direito - mas fica a sensação de que ele está falando de outra pessoa ..
A história de hj é qnd nasceu o único filho do patrão, após aquela história do poço...O menino nasceu mais ou menos na época que minha mãe tb, então ela tem lembranças dessa época. Meu avô disse que os primeiros dez anos foram os mais felizes da vida dele.
Com cerca de onze, doze anos, a felicidade começou a diminuir. Meu vô disse que o menino começou a ter comportamentos estranhos. Em dia de abate de animais, ele sempre fazia uma pirraça para ir junto. "O menino abria um sorrisão quando a gnt matava galinha".
"Um dia fomos matar um porco para o aniversário do patrão. Na hora do porco estrebuchar, aqueles gritos do bicho mt altos, o menino ria alto demais e dava saltos de alegria. Eu achei mt esquisito". O patrão parecia não ligar.
Minha mãe lembra dessa época. Disse que minha vó proibiu ela de brincar com o menino depois que voltou com machucados para casa. Ela não lembra. Meu vô disse ela estava com marcas roxas nos braços e nas pernas. Mas acalmou minha avó: "criança na roça se machuca"
Nessa época, minha mãe ficou muito amiga da irmã da dona da casa. Ela chegou junto no casamento, com cerca de 4 anos, lembram? Nessa época tinha uns 14 anos. Sozinhas, ficaram próximas. "Ela foi criada na roça, era uma menina bobinha para a idade".
Casos que começaram nessa época iriam mudar a vida de todo mundo e fariam, no fim das contas, que meu avô, vó e mãe saíssem do sítio. Meu avô só voltaria décadas depois, quando descobriu que tinha recebido o terreno de "presente".
O interessante é que esses causos tem explicações racionais, que, aliás, toda minha família conhece. A versão "sobrenatural" estou descobrindo agora. O mais doido é, além disso, ver que personagens dessa época são "tios" e "tias" que eu conheço.
A primeira história foi que "o menino começou a vigiar a gente", segundo o vô. Minha avó na cozinha, distraída, olhava pra janela e o menino estava parado, do lado fora, olhando para ela. "Minha mãe dizia que ele ficava um tempão lá, parado, olhando pra ela com um riso estranho".
Vô disse que a vó era implicante mas eu acho esquisito. Minha mãe lembra tb que os bichos do sítio começaram a aparecer machucados. Pequenos cortes, arranhões, marcas de pancada. Era o menino, tem certeza. Chutava os cachorros, tacava pedras nas galinhas, td mundo via.
"Minha mãe começou a chamar ele de Saci. Ele aparecia dentro de casa sem ngm ouvir. Uma hora tava na janela, da outra sentado na mesa, dentro de casa. A porta fechada, ngm ouviu ele abrir". O "Saci" virou história na minha família, muita gente conhece esses causos.
Minha avó começou a ficar incomodada. Imaginem: década de 60, o filho do patrão é o reizinho da região. Meu vô achava que era maluquice, mas começaram a pensar em sair e arrumar emprego na cidade. A violência contra os animais ficou recorrente. O menino aparecendo do nada tb.
A pior história aconteceu em um natal, nessa época. Sítio cheio, fogueira, almoço regado para o patrão e parentes. Meus avós na casinha, sozinhos. Por volta das 12 horas, minha mãe e a irmã da patroa estavam brincando em um descampado.
Minha mãe disse que estavam por lá quando o menino chegou. Disse para passearem "pelo mato". Ela lembra que não queria ir mas a amiga convenceu. Foram andando, com ele guiando. Andaram poucos minutos até chegarem na antiga senzala. Terreno proibido para as crianças.
Lembrança do meu avô: depois de alguns minutos, minha avó desesperada notou que a filha sumiu. Começaram a chamar, ngm respondeu. Logo repararam que as demais crianças tb não estavam. Pára o almoço, pára tudo, começam a entrar no mato atrás.
"Eu fui direto para o Barracão (Senzala), tinha ngm lá", diz o vô". "Eu nem tava muito preocupado, pra dizer verdade. O povo tava doidinho pq eram os filhos do patrão. Criança é levada mesmo".
Minha mãe jura, na lembrança de criança, que sempre esteve na senzala, nunca saiu.
Na lembrança dela, as três crianças entraram na senzala. "Imaginação de criança é coisa doida, né", ela me disse hj com um meio sotaque de baiana depois de morar mais de 20 anos em Salvador. "Eu juro que entrei pela porta mas, ao olhar pra trás, parecia que eu tava no teto".
"Fui ficando tonta, a porta parecia que estava errada. A janela no chão. A porta parecia que tava onde era o teto". Minha mãe deve ter puxado o lado cético do meu vô, ela tem certeza que isso é lembrança imaginada de criança.
Essa situação da "senzala com ângulos errados" durou um tempo, até que ela olhou pra amiguinha e reparou que ela estava com muito medo tb. O menino ficou lá, parado, olhando para elas, rindo de um jeito esquisito, sem se mexer. Ela abraçou a amiga e fechou os olhos.
A doidera: meu avô jura que entrou no barracão e não viu ngm. Minha mãe disse que ficou lá o tempo todo. A situação é esquisita por que, depois de um tempo procurando, os homens resolveram ir ver de novo. Ao entrar, viram as três crianças sentadas no meio do salão.
"Elas devem ter entrado pela janela quando eu tava lá fora, distraído", diz meu avô.
"Meu pai deve ter olhado errado, ele é mt desligado", diz minha mãe.
Crianças de castigo, broncas e abraços desesperados.
No dia seguinte, minha mãe e a amiguinha de cama, febre muito alta.
"Sua avó ficou do lado dela por semanas, rezando sem parar. Deve ter sido o susto de ficar perdida".
Minha mãe, uma semana depois, se recuperou.
A menina não. A febre alta deixou ela cega.
"O menino, essas semanas, só ria, nunca vi gargalhar tanto", diz o vô.
Gente, conheço a menina. "Tia DEnise" é amiga da família desde sempre. Cega, muito magra, recebe uma pequena pensão do governo e ajuda dos vizinhos.
Ela mora há duas quadras daqui.
Essa semana eu vou falar com ela. Quero saber como o "irmão" dela morreu e o sítio foi fechado.
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