Está passando da hora de os democratas se conectarem e se multiplicarem. Mas democratas não são os que se dizem democratas.
Siga o fio, por favor.
1 - Há um célebre discurso de Goebbels falando que o nazismo estava inaugurando a verdadeira democracia.
2 - Os marxistas-leninistas sempre disseram que a verdadeira democracia é a democracia proletária e não a democracia burguesa, que seria apenas uma maneira de disfarçar a dominação de classe.
3 - E hoje todos os populistas, digam-se de esquerda ou de direita, enaltecem a democracia, que confundem com eleições e majoritarismo.
4 - Viktor Orbán, um populista-autoritário ou nacional-populista de extrema-direita, que instalou na Hungria uma autocracia eleitoral, fala que sua democracia é cristã e i-liberal.
5 - Maduro e Ortega, neopopulistas de esquerda, falam de democracia popular, mas são ditadores.
6 - Os populistas são hoje os principais adversários da democracia: eles amam eleições e usam-nas contra a democracia.
7 - Ora, não há democracia i-liberal. Ser liberal, no sentido político-democrático do termo, é tomar a liberdade (e não a ordem) como sentido da política.
8 - Ser liberal é não ser majoritarista, quer dizer, achar que a democracia é o regime da maioria quando ela é o regime das múltiplas minorias.
9 - Portanto, fascistas, comunistas e populistas não estão no campo democrático, mesmo que adotem a via eleitoral para chegar o poder.
10 - Antifascistas e anticomunistas não estão necessariamente no campo democrático, ainda quando cada um esteja lutando para se libertar da opressão do outro.
11 - Quando fascistas lutam contra comunistas (e vice-versa) eles não viram democratas por causa disso. Quando antifascistas e anticomunistas lutam entre si, eles não viram democratas por causa disso.
12 - Chávez e Funes eram antifascistas, assim como Fidel e Zé Eduardo. Erdogan e Kaczyński são anticomunistas, assim como Salvini e Le Pen.
13 - Lutar contra Trump e Bolsonaro não transforma ninguém em democrata. Ter lutado contra Correa e Evo não transforma ninguém em democrata. Assim como ter lutado contra a ditadura militar no Brasil não transformou ninguém em democrata só por causa disso.
14 - Quando populistas de esquerda lutam contra populistas de direita ou extrema-direita (e vice-versa), eles continuam sendo populistas.
15 - Para ser democrata é necessário abandonar os populismos. Mas como saber o que é um populismo? Veja as características principais abaixo:
16 - Os populismos acham que a sociedade está dividida por uma única clivagem, separando a vasta maioria (o povo) do “establishment” (as elites).
17 - Os populismos acham que a polarização (elites x povo) deve ser encorajada. Os representantes do povo (que são os atores legítimos) não devem fazer acordos (a não ser táticos) ou construir consensos (idem) com os representantes das elites.
18 - Os populismos acham que as minorias políticas não devem ser toleradas quando impedem a realização das políticas populares e a legalidade institucional (erigida para servir às elites) não deve ser respeitada quando se contrapõe aos interesses do povo.
19 - Todo populismo (diga-se de esquerda ou de direita ou extrema-direita) é i-liberal e majoritarista e, assim, não pode estar no campo democrático.
20 - Todo democrata é liberal (no sentido político do termo) e não-majoritarista. Mas como saber o que é um liberal-democrata. Veja as características principais abaixo:
21 - Liberais políticos democratas acham que que é normal que a sociedade esteja dividida entre muitas — e às vezes transversais — clivagens.
22 – Liberais políticos democratas acham que a melhor maneira de lidar com essas clivagens é por meio de um debate aberto e livre, sob uma cultura política que valoriza a moderação e busca o consenso.
23 – Liberais políticos democratas acham que o Estado de direito e os direitos de minorias precisam ser respeitados.
24 - O papel dos liberais políticos democratas não é arrebanhar maiorias (os democratas sempre foram minoria) e sim ser agentes fermentadores da formação de uma opinião pública democrática. Não existe democracia sem democratas. E os democratas que temos são insuficientes.
A EXTREMA-DIREITA ESTÁ GOVERNANDO QUANTOS REGIMES DITATORIAIS NO MUNDO DE HOJE?
Vamos pegar cerca de 40 regimes ditatoriais atuais para mostrar que é falsa essa conversa de que a extrema-direita (os regimes populistas-autoritários, iliberais) é a única (ou principal) ameaça à democracia. Adicionalmente, o levantamento abaixo mostra como é impotente em termos analíticos o esquema interpretativo direita x esquerda.
Siga o fio.
1 Azerbaijão | Ilham Aliev e seu Partido Novo Azerbaijão orbitam na esfera de influência da ditadura russa. Mas não podem ser classificados como extrema-direita.
2 Barein| Salman bin Hamad bin Isa Al Khalifa é o primeiro-ministro do Barein, uma monarquia islâmica sem partidos. O regime não pode ser classificado como de esquerda ou de direita.
Bolsonaristas perguntam sempre por que se fala em extrema-direita e não se fala em extrema-esquerda. A explicação é simples. A extrema-direita existe de fato no Brasil e em outros países. Por exemplo, ela está presente no bolsonarismo e no trumpismo. No Brasil existe também uma extrema-esquerda, mas ela é muito minoritária: por exemplo, o PCO. O lulopetismo é hegemônico na esquerda brasileira, mas ele representa a esquerda populista, não a extrema esquerda. A extrema-esquerda é uma remanescência da esquerda classista, revolucionária, do século passado, ainda que parte da nova esquerda identitarista do século atual também tenha, às vezes, comportamentos extremos. No Brasil existe essa esquerda identitarista, meio que copiada da sua congênere americana, mas ela também é minoritária (sobretudo eleitoralmente). Dito isso, é preciso entender, entretanto, que o populismo de esquerda (por exemplo, o neopopulismo latino-americano de Obrador, Xiomara, Petro, Evo e Arce e Lula), tem raízes marxistas, mas não pratica os métodos da luta revolucionária, visando a tomada do poder pela força, porque optou pela via eleitoral para chegar aos governos e neles se delongar até conquistar hegemonia sobre a sociedade a partir do Estado aparelhado pelo partido. Em alguns casos, todavia, populistas de esquerda deram golpes de Estado (ou auto-golpes) já estando nos governos de seus países, convertendo seus regimes em ditaduras (como são os casos de Maduro e Ortega). Nestes casos, talvez, se pudesse dizer que se tornaram extrema-esquerda, assim como Cuba (o modelo revolucionário clássico do século 20, que se mantém), a Frente Sandinista de Libertação Nacional na Nicarágua, a Frente Farabundo Marti de Libertação Nacional em El Salvador, etc. Nada disso, porém, faz muito sentido porque o velho espectro classificatório 'extrema-direita, direita, centro-direita, centro-esquerda, esquerda, extrema-esquerda' é inadequado para captar a realidade. E porque o que importa não é se uma força política é mais ou menos de direita ou de esquerda e sim se é autocrática (eleitoral ou não-eleitoral) ou se é democrática (apenas eleitoral ou liberal).
Tem que ler o último parágrafo, pessoal. Minha classificação de regimes políticos (e, por decorrência, das forças políticas) é a seguinte:
Os regimes eleitorais (ainda chamados de democracias, conquanto apenas eleitorais) em transição autocratizante são os parasitados por populismos.
Estamos escrevendo um artigo explicando as imagens abaixo. Nem seria necessário fazer isso se a maioria das pessoas tivesse alguma noção dos temas ligados à disjunção democracia x autocracia. 1/6
Antes de qualquer coisa é preciso saber que a segunda grande guerra fria, que já está instalada, não é, como a primeira, uma divisão de blocos Oeste x Leste (EUA x China). É uma campanha de exterminação das democracias liberais. 2/6
Há um eixo autocrático se formando no mundo imerso em uma terceira onda de autocratização. 3/6
O divisor de águas não foi o 7 de outubro, mas o 17 de outubro. A pressa com que setores da esquerda compraram a versão do Hamas e já sairam às ruas em seguida, sem ter a prudência de aguardar mais evidências sobre o ocorrido, revela muita coisa. Eu diria, quase tudo. +
Poderíamos dizer que só estavam aguardando algo como o bombardeio de um hospital com centenas de mortos para confirmar o que já sabiam: que Israel é genocida. Isso é como um axioma, uma verdade evidente por si mesma, que não está sujeita à comprovação no âmbito da "teoria". +
Pelo que se vê nas fotos de hoje (18/10) o hospital em Gaza continua de pé. Um míssil que explodiu num estacionamento dificilmente causaria 600 mortos como foi divulgado pelo "ministério da saúde" do Hamas (tratado pela imprensa como "as autoridades" e fonte fidedigna). +
Me perguntaram no Face se o PT é um partido comunista. Não, o PT não é um partido comunista. É um partido neopopulista. Mas o neopopulismo latino-americano teve origem no marxismo. Os dirigentes que fundaram o PT e até hoje orientam sua militância são (ou foram) marxistas.
Pulando, por óbvio, os ditadores cubanos, isso aconteceu em todos os regimes neopopulistas. Na Nicarágua: Daniel Ortega e Humberto Ortega e López e Borge e Mayorga; na Venezuela: Hugo Chávez e Nicolás Maduro; no Brasil: Lula e Dilma.
Continua...
Na Bolívia: Evo Morales e Luis Arce; no Equador: Rafael Correa e Lenin Moreno; no Paraguai: Fernando Lugo; em El Salvador: Maurício Funes e Salvador Cerén; na Argentina: Cristina Kirchner e Alberto Fernandez; no México: Obrador; no Peru: Castillo, na Colômbia: Petro.
1 - Toda essa conversa sobre o 8 de janeiro é combustível para manter e escalar a polarização política por parte dos dois populismos em disputa.
Siga o fio numerado.
1.1 - Da parte do lulopetismo para dizer que foi vítima de um terceiro golpe de Estado (o primeiro teria sido o impeachment de Dilma e o segundo a prisão de Lula).
1.2 - Da parte do bolsonarismo para dizer que foram os esquerdistas infiltrados que fizeram a baderna, com a conivência (planejada) de funcionários do novo governo.