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Oct 1, 2020 28 tweets 12 min read Read on X
Saiu um pré-print super interessante, com ciência BRASILEIRA, traçando paralelos interessantes com o HIV na forma com que o SARS-CoV-2 infecta as células do sistema imunológico

Vou comentar sobre o trabalho, e o que sabemos sobre o vírus em células do sistema imunológico! - 🧶
A notícia da publicação está no site da @AgenciaFAPESP agencia.fapesp.br/sars-cov-2-usa…

E também no medRxiv: medrxiv.org/content/10.110…

O trabalho foi coordenado pelo @MoriLabe e pelo Alessandro Farias, dois grandes pesquisadores brasileiros!
De acordo com a publicação, se observou que tanto o HIV, quanto o SARS-CoV-2 tem como um dos alvos celulares as células do sistema imunológico ditas como T CD4. Essas células, em resumo muito resumido, são responsáveis por coordenar a resposta imunológica adaptativa
Lembrando que a resposta adaptativa é bem específica contra o agente infeccioso. Temos várias modalidades de tipo de resposta, a começar pela inata (pouco específica e a resposta inicial) seguida pela adaptativa (muito específica, mais tardia).
Essas células T CD4, além de fazerem todo esse controle, também auxiliam tanto os Linfócitos B, que produzem os anticorpos neutralizantes e de memória, quanto na proliferação dos linfócitos T CD8, que são especialistas em reconhecer células infectadas e neutralizá-las.
Quando o SARS-CoV-2 passa a infectar muitas células T CD4, ele leva a morte parte dessas células T CD4, prejudicando sua função, reduzindo a proliferação dos linfócitos T CD8 e prejudicando a ação dos linfócitos B, libernado anticorpos com menor afinidade pelo vírus e duração.
Esse efeito seria semelhante ao que o HIV causa na sua infecção, mas aqui estamos vendo um efeito agudo, enquanto que a infecção do HIV tem um padrão bem diferente.
Para saber em maior detalhamento das etapas da pesquisa, te convido a ler o fio da @luizacaires3 em que ela aborda com muita elegância as etapas investigatórias
Uma conclusão bem relevante desse estudo é que isso poderia, em parte, explicar porque pessoas acabam desenvolvendo COVID-19 severa, a partir dessas respostas do sistema imunológico adaptativo disfuncionais
Em uma meta-análise publicada esse ano, observamos que as razões de células CD4/CD8 não tendem a mudar em pacientes e que células CD8 parecem ser mais importante pros desfechos clínicos do que células CD4. ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/P…
No entanto, as contagens isoladas dessas duas populações celulares aparecem mais baixas nos pacientes que desenvolveram COVID-19 severa, em relação àqueles que não desenvolveram COVID-19 severa.
Outra conclusão dessa meta-análise, a partir da observação do curso da infecção nesses pacientes, é que acompanhar os níveis das células T CD8 parecem oferecer uma possibilidade de estratégia pra entender se o paciente teria um risco maior ou menor pra um desfecho pior
Outro ponto que gostaria de ressaltar é que, tanto os dados do grupo do @MoriLabe quanto os que encontramos na literatura mostram que essas relações do sistema imunológico também podem explicar o acometimento do sistema nervoso central (SNC)!
A gente sabe por exemplo, por outros coronavírus, que a infecção em células Treg (CD4+CD25+) são importantes pra invasão e inflamação do SNC.

pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/24210105/
E a gente viu que na COVID-19 essa neuro inflamação tá relacionada com desfechos piores. Daqui a pouco é um outro nicho pra se estudar

Em uma análise publicada na @nature podemos observar uma alta resposta de células T CD4 especificas para SARS-CoV-2 em pacientes após COVID-19 grave, com respostas abundantes contra a proteína Spike/espícula, que é importante para a infecção do vírus nas células
Esse aumento é potencialmente um reflexo da grande carga viral (quantidade de vírus) que pessoas com COVID-19 grave apresentam. A resposta deve ser coordenada ao longo do tempo. Alterações nisso são decisivas para o desfecho. Explico o porquê:
Uma resposta atrasada ou insuficiente de células T poderia permitir que a quantidade de vírus circulantes fique descontrolada, levando a respostas de células T mais intensas e disfuncionais, capazes de aumentar o dano ao tecido, o que seria prejudicial!
Ainda, se a pessoa em questão teve exposição a outros coronavírus (como a SARS), pode conferir uma certa vantagem na corrida contra o vírus, pela presença de respostas de células T pré-existentes que são capazes de reconhecer o SARS-CoV-2 e imediatamente entrar em ação
Essas células T reativas "cruzadas" (que reconhecem tanto outros coronavírus quanto o SARS-CoV-2) foram observadas em 20-50% dos indivíduos em algumas coortes COVID-19

nature.com/articles/s4159…
Naturalmente não sabemos muita coisa: a duração dessas respostas, como podemos modulá-las para ter menor chance de ser disfuncional. Aqueles que montam resposta de células T mais fortes, manteriam elas por mais tempo?
Sabemos que, em macacos, de forma promissora, a infecção natural por SARS-CoV-2 é capaz de gerar anticorpos e células T, resultando em proteção contra reexposição

doi.org/10.1126/scienc…
Mais do que nunca, precisaremos nos munir de dados de estudos de acompanhamento de indivíduos que tiveram COVID-19 para avaliar a persistência dessas respostas, se elas se correlacionam com os linfócitos B de memória e anticorpos neutralizantes
Também sabemos que as células T geradas em resposta a alguns coronavírus (humanos e de outros animais) provaram ser duradouras, com respostas contra o SARS-CoV (vírus da SARS), por exemplo, permanecendo detectáveis ​​17 anos depois da infecção

doi.org/10.1038/s41586…
Nesse outro artigo, também vemos mais uma observação do dado acima citado doi.org/10.1016/j.immu…
A ciência responderá essas perguntas, e no momento em que pudermos realizar a vacinação dos indivíduos com uma vacina segura e eficaz aprovada pela fase III, poderemos também observar esses mesmos parâmetros nos vacinados e entender melhor a dinâmica dessa proteção

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