Hoje, dia 14 de janeiro de 2021, completa-se 100 anos do nascimento de Murray Bookchin. Conheci suas contribuições em 2019 e venho estudando e debatendo suas obras desde então. Ainda engatinhando, porque sua obra é vasta, mas +
resolvi fazer um fio hoje aprofundando nas concepções de Bookchin sobre a Ecologia. Especialmente para convidar quem quer que leia isso pra se engajar com a ecologia social. Para um contexto mais amplo recomendo que leiam o fio do @caioguidable também em homenagem +
a este gigante revolucionário que inspira revolucionários e revoluções nos dias atuais e que não pode ser ignorado! +
Pela sobrevivência de todas as formas de vida nesse planeta! Contra todas as estruturas hierárquicas de dominação! Afirmamos a vida! Viva a Ecologia Social! Viva o Confederalismo! Viva o anarquismo! +
A ECOLOGIA SOCIAL:

Nos anos 50 Bookchin já apontava a catástrofe global ambiental eminente. No seio da esquerda estadunidense foi consolidando uma posição ecológica, criticando os movimentos ambientalistas, verdes, a ecologia profunda bem como o Malthusianismo e o Ecofascismo. +
O livro “A Primavera Silenciosa” (1962), de Rachel Carson, geralmente é apontado como o primeiro na história a denunciar os impactos da monocultura e dos agrotóxicos. Porém, Bookchin já publicava artigos na década de 50 denunciando os males dos pesticidas, +
da agricultura industrial, da poluição das águas, do desmatamento e do poder nuclear. No mesmo ano, meses antes de Rachel Carson, Bookchin publicou seu livro “Nosso Ambiente Sintético”, no qual compilou seus dados e denúncias sobre a destruição da natureza. +
Ao longo de sua vida publicou inúmeros livros nos quais desenvolveu uma filosofia radical denominada Ecologia Social, desenvolveu um arcabouço filosófico e teórico robusto e uma metodologia denominada Naturalismo Dialético. +
Defendeu que toda a trajetória histórica da humanidade é também a história natural da evolução no planeta terra, que todo problema ecológico é acima de tudo um problema social, que a dominação da humanidade por alguns homens precede e +
se desdobra na dominação da natureza pelo homem. Se apropriando das contribuições de ecólogos e observando a ecologia da natureza, Bookchin formulou uma ecologia em escala humana e postulou que essa ciência, a ecologia, dentre as disciplinas contemporâneas, é aquela que +
resguarda em si um potencial revolucionário intrínseco, porque lida objetivamente com a manutenção do equilíbrio da natureza que é o único meio de sobrevivência da humanidade. A ecologia contém a potencialidade de reconstrução e integração da relação entre humanidade e natureza+
que fora cindida ao longo da história evolutiva da humanidade, com a emergência do patriarcado, da família monogâmica, do estado e finalmente, do colonialismo e do capitalismo industrial moderno. A ecologia pode nos dar as ferramentas necessárias para curar essa ferida milenar +
aberta e continuamente sangrando! Fora da ecologia o que se apresenta é a catástrofe ambiental global. Dentro da ecologia é que estão os limites pelos quais a humanidade pode navegar conscientemente em direção à emancipação universal e à afirmação da sensualidade, do prazer, +
da sensibilidade horizontal, da individuação e da afirmação do princípio ecológico da unidade na diversidade! +
Nas palavras do próprio autor:
“[…] a ecologia lida com o equilíbrio da natureza. Na medida que a natureza inclui o homem, esta ciência basicamente lida com a harmonização da natureza e do homem. As implicações explosivas de uma abordagem ecológica se dão não apenas porque +
a ecologia é intrinsecamente uma ciência crítica – crítica em uma escala que a maioria dos sistemas radicais de economia política falharam em atingir – mas também porque é uma ciência integrativa e reconstrutiva. Este aspecto integrativo e reconstrutivo da ecologia, quando +
realizado em todas suas implicações, conduz diretamente às áreas anárquicas do pensamento social. Por isso, em última instância, é impossível alcançar a harmonização da humanidade e da natureza sem criar uma comunidade humana que vive em um equilíbrio +
duradouro com seu ambiente natural.
Os problemas com os quais a ecologia lida são perenes, no sentido que não podem ser ignorados sem colocar em questão a sobrevivência da humanidade e a sobrevivência do próprio planeta.” (Anarquismo Pós Escassez, p. 20-21) +
“Obviamente, a humanidade poderia ser descrita como um parasita altamente destrutivo que ameaça destruir seu hospedeiro – o mundo natural – e eventualmente se destruir. Na ecologia, entretanto, a palavra “parasita” não é uma resposta pra uma pergunta, mas traz em si a pergunta. +
O que confere uma função profundamente crítica à ecologia é a questão levantada pelas habilidades destrutivas dos humanos: qual foi a ruptura que tornou o homem um parasita destrutivo? O que produz a forma de parasitismo que resulta não apenas em enormes desequilíbrios naturais,+
mas também ameaça a própria existência da humanidade?
O homem produziu desequilíbrios não apenas na natureza, mas, mais fundamentalmente, em suas relações com seus pares e a própria estrutura de sua sociedade. Os desequilíbrios que o homem produziu no mundo natural são causados +
pelos desequilíbrios que ele produziu no mundo social.” (Anarquismo Pós Escassez, p. 84)

“A noção de que o homem deve dominar a natureza emerge diretamente da dominação do homem pelo homem. A família patriarcal plantou as sementes da dominação nas relações nucleares da +
humanidade; a clássica cisão entre espírito e matéria no mundo antigo à nutriu; o viés anti-naturalista do Cristianismo impulsionou seu crescimento. Mas, foi apenas com a dissolução das relações comunitárias orgânicas em relações de mercado que o planeta em si foi reduzido à +
um recurso a ser explorado. Essa tendência centenária encontra sua forma mais exacerbada no desenvolvimento do capitalismo moderno. Em decorrência de sua natureza inerentemente competitiva, a sociedade burguesa não apenas produz divisões entre os humanos; ela também coloca +
a massa da humanidade contra o mundo natural. Assim como o homem é transformado em uma mercadoria, também todos os aspectos da natureza são convertidos em mercadorias, um recurso a ser manufaturado e mercantilizado arbitrariamente. Os eufemismos liberais para estes processos +
são “crescimento”, “sociedade industrial” e “praga humana”. Qualquer que seja a linguagem pelas quais são descritos, o fenômeno tem suas raízes na dominação do homem pelo homem.” (Anarquismo Pós Escassez, p. 85) +
“O planeta, concebido enquanto um aglomerado amorfo de minerais, pode suportar aumentos inacreditáveis na produção de lixo. A terra, concebida enquanto uma complexa teia da vida, certamente não pode. A única questão é se a terra pode sobreviver sua pilhagem por tempo suficiente +
para a humanidade substituir o atual sistema social destrutivo por uma sociedade humanística e ecologicamente orientada.” (Anarquismo Pós Escassez, p. 86)

“O verdadeiro símbolo da agricultura moderna é a foice (nem mesmo o trator), mas o avião.” (Anarquismo Pós Escassez, p. 88)+
“O que é mais significativo sobre a ecologia é sua habilidade em converter uma rejeição do status quo, comumente niilista, em uma enfática afirmação da vida. A essência da mensagem reconstrutiva da ecologia pode ser resumida na palavra “diversidade”. Do ponto de vista ecológico,+
equilíbrio e harmonia na natureza, na sociedade e, por inferência, no comportamento, não são atingidos por uniformização mecânica, mas pelo seu oposto: diferenciação orgânica.” (Anarquismo Pós Escassez, p. 92)
“O que nos impressiona é que ambos, o ecologista e o anarquista, +
colocam uma forte ênfase à espontaneidade. O ecologista tende a rejeitar essa noção de “poder sobre a natureza”. Ele fala, ao invés, de “dirigir”, “direcionar” seu caminho através de uma situação ecológica, de manejo, ao invés de recriação de um ecossistema. O anarquista, por +
sua vez, fala em termos de espontaneidade social, de libertação das potencialidades da sociedade e da humanidade, de dar liberdade e retirar as amarras da criatividade do povo. Ambos, de suas próprias maneiras, reconhecem a autoridade como inibitória, como um peso limitando +
o potencial criativo da situação natural e social. O objeto deles não é governar um domínio, mas liberá-lo." (Anarquismo Pós Escassez, p. 99-100)

“Se a comunidade ecológica for realizada na prática, a vida social vai cultivar um desenvolvimento sensível de diversidade humana +
e natural, se transformando juntos em uma totalidade harmoniosa e bem equilibrada. Variando de comunidade através de regiões até continentes inteiros, nós veremos uma diferenciação colorida de grupos humanos e ecossistemas, cada um se desenvolvendo com potencialidades únicas +
e expondo os membros da comunidade à um largo espectro de estímulos comportamentais, econômicos e culturais. Nós veremos a interação entre indivíduo e grupo, comunidade e ambiente, humanidade e natureza. O viés mental que organiza as diferenças entre os humanos e outras formas +
de vida dentro de linhas hierárquicas, definindo o externo em termos de sua “superioridade” ou “inferioridade”, em seu lugar se erigirá uma perspectiva que lida com diversidade de uma perspectiva ecológica. As diferenças entre os povos serão respeitadas, na verdade, fomentadas, +
como elementos que enriquecem a unidade da experiência e do fenômeno. Libertados da rotina opressiva, da repressão paralisante e inseguranças, dos fardos do trabalho árduo e de falsas necessidades, das amarras da autoridade e da compulsão irracional, os indivíduos finalmente, +
pela primeira vez na história, estarão em posição para realizar suas potencialidades como membros de uma comunidade humana e do mundo natural.” (Anarquismo Pós Escassez, p. 104)

Por fim, deixo uma última citação do livro Ecologia da Liberdade, na qual o Bookchin fala +
da necessidade de sonharmos a utopia:

“Nessa confluência das crises social e ecológica, nós não podemos mais nos permitir ser desprovidos de imaginação, nós não podemos nos permitir continuar sem pensamentos utópicos. Essas crises são muito sérias e as possibilidades muito +
arriscadas para serem resolvidas através de modos habituais de pensamento – as próprias sensibilidades que produziram essas crises em primeiro lugar. Anos atrás, os estudantes franceses nos levantes de Maio-Junho de 1968 expressaram este contraste marcado de alternativas de +
forma magnífica com o slogan “Seja prático! Faça o impossível!” Para essa demanda, a geração que se depara com próximo século pode adicionar a solene palavra de ordem: “SE NÓS NÃO FIZERMOS O IMPOSSÍVEL, VAMOS NOS DEPARAR COM O INIMAGINÁVEL!" (p. 41)
+
Que as ideias de Bookchin floresçam pelo mundo todo e que as feridas da cisão entre humanidade e natureza sejam curadas, pela afirmação da vida: Viva Murray Bookchin! Seu legado continua! 🏴🚩

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