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May 3, 2021 13 tweets 5 min read Read on X
Menos de 24h depois de o Brasil atingir 400 mil mortos pela pandemia, a CEO da Adidas no país estava almoçando com Jair Bolsonaro.

Mas não foi uma questão política, segundo a empresa.

O argumento ecoa o que disse Adi Dassler, fundador da marca, sobre sua relação com o nazismo.
Os irmãos Adi e Rudi Dassler criaram uma revolucionária fábrica de sapatos esportivos na Alemanha dos anos 20.

Com a ascensão dos nazistas ao poder, na década seguinte, o próprio Estado alemão passou a se interessar mais por esporte, que passou a ter papel importante.
Não à toa, uma das Olimpíadas mais marcadas por sua politização foi a de Berlim, em pleno 1936.

Sobre o papel do esporte no nazismo, recomendamos o episódio 28 do nosso podcast:
anchor.fm/copa-alm-da-co…
Adi e Rudi, portanto, tornaram-se fornecedores de calçados esportivos para a Juventude Hitlerista.

Sua fábrica inclusive produziu de forma oficial os calçados dos atletas alemães que competiram nas Olimpíadas de Berlim.

E os irmãos prontamente se filiaram ao Partido Nazista.
O que se diz é que Rudi era um apoiador mais fervoroso de Hitler, enquanto a visão de Adi era mais pragmática, mais “apartidária”, para usar a palavra que a empresa usou na justificativa de sua reunião com Bolsonaro.

Seja como for, a fábrica dos irmãos Dassler cresceu muito.
Durante a guerra, a fábrica ainda foi convertida para produzir equipamentos militares para os alemães.

Mas os nazistas perderam a guerra e a conta chegou.

Numa disputa pelo controle dos negócios, enquanto eram julgados pelos americanos, os irmãos romperam definitivamente.
Rudi foi investigado por envolvimento com o alto escalão nazista, e ele acreditava que havia sido Adi quem o denunciara, para poder ficar com a fábrica.

Em resposta, delatou aos americanos que Adi é quem havia organizado a produção militar para os nazistas, pra faturar mais.
Por falta de provas, ambos acabariam liberados. Mas a família nunca superou aquela troca de acusações.

No fim dos anos 40, a antiga fábrica se converteria em Adidas, com Adi no comando.

E seu irmão Rudi abriria uma poderosa concorrente, a Puma.
Talvez o lado mais triste da história dos irmãos Dassler seja que, enquanto faziam fortuna, outros competidores do mercado de calçados esportivos faliam porque eram judeus.

É o caso de Julius Hirsch, herói do Império Alemão na 1ª Guerra Mundial e que foi morto em Auschwitz.
Contamos a história de Hirsch, um dos primeiros astros do futebol alemão, aqui:
Nos anos mais tardios da Guerra Fria, já como uma multinacional bem estabelecida, a Adidas se reposicionou. Fez muitos negócios com países comunistas, como Bulgária, Hungria, Iugoslávia e URSS.

Até Fidel Castro fez várias aparições públicas com seu famoso casaco da Adidas.
Então, embora o timing seja terrível, pode ser mesmo que a presença da CEO da Adidas Brasil num almoço com o presidente com a pior resposta à pandemia em todo o planeta não represente nenhuma ideologia política, a não ser a que sempre falou mais alto: o dinheiro.
O Copa Além da Copa fala de esporte, história, cultura, política e sociedade.

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May 4
A Suprema Corte da Louisiana aprovou que a St. George, um distrito de maioria branca e rica, se separe da capital do estado, Baton Rouge, e forme uma nova cidade.

Essa demonstração de que a segregação racial segue firme no sul dos EUA encontra eco no esporte universitário. Imagem mostra uma pessoa fantasiada de tigre, mascote de LSU, com camisa da universidade e um dedo em riste.
Baton Rouge é a casa da Louisiana State University, conhecida como LSU. Nos esportes, é representada pelos LSU Tigers, bastante vitoriosos.

Os Tigers de LSU têm quatro títulos nacionais no futebol americano, um no basquete masculino e um no basquete feminino. Imagem mostra dois jogadores de futebol americano de LSU, de camisa branca e capacete amarelo, em comemoração.
Mas o nome "tigers" não vem simplesmente de um apreço por tigres.

As tropas confederadas locais na Guerra Civil estadunidense eram chamadas de "tigres da Louisiana". O mesmo acontecia, por exemplo, no Missouri - e há igualmente o Missouri Tigers. Imagem é uma ilustração de um grupo de soldados de camisas azuis avançando em um campo com uma bandeira confederada ao fundo.
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May 3
Começou no fim de semana a Copa Chile, 2º torneio de futebol mais importante do país.

O que tornou especial a estreia dessa edição é que seu jogo inaugural foi disputado a 670 km da costa chilena, num arquipélago no qual a história do náufrago Robinson Crusoé foi inspirada. Imagem da partida entre Juan Fernández e Santiago Wanderers vista de longe, com o campo à beira-mar e uma bandeira do Chile em primeiro plano
O arquipélago Juan Fernández, hoje habitado por menos de mil pessoas, foi escolhido pela federação chilena há 7 meses pra abrir o torneio.

Tanta antecedência foi necessária pra preparação: só 3 companhias aéreas chegam até lá, com aviões com capacidade pra apenas 8 pessoas. Mapa da costa do Chile com destaque para o arquipélago de Juan Fernández, formado pelas ilhas Alexander Selkirk, Robinson Crusoé, Santa Clara e outras ilhas menores
A ilha principal de Juan Fernández hoje se chama Robinson Crusoé, nome adotado em 1966, baseado no romance escrito pelo inglês Daniel Defoe.

Uma das inspirações de Defoe foi a história do marinheiro escocês Alexander Selkirk, que, no século XVIII, passou 4 anos isolado na ilha. Ilustração do livro Robinson Crusoé, de Daniel Defoe, na edição publicada pela Companhia das Letras. Desenho mostra um homem remando sobre uma jangada, levando consigo alguns mantimentos, um gato e um cachorro
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Apr 30
Pro jogo de hoje pelas semifinais da Champions League contra o Real Madrid em casa, o Bayern de Munique pediu à torcida que vá "toda de vermelho" pra criar um ambiente intimidador.

É uma atitude interessante, mas é também um jeito de ceder à pressão da própria torcida pela cor. Imagem estilizada do interior da Allianz Arena lotada, toda pintada de vermelho, em imagem promocional divulgada pelo Bayern
As cores originais do Bayern eram o azul e o branco, mas o clube adotou o vermelho nos seus primórdios, quando o visionário presidente Angelo Knorr salvou-o da extinção ao incorporá-lo a outro clube, o MSC, no início do século XX.

Contamos essa história:
A partir daí, o vermelho se manteve como cor dominante, mas o azul da bandeira da Baviera não sumiu por completo, permanecendo como 3ª cor.

Até que, em 1997, pela 1ª vez, a Adidas colocou o azul como cor principal da camisa número 1.

Daí em diante, foram inúmeros experimentos.
Camisa do Bayern na década de 70, listrada em branco e vermelho
Jogadores do Bayern posam para foto com a polêmica camisa azul escura de 1997, com seis em pé atrás e cinco ajoelhados à frente
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Apr 27
Um dos maiores e mais importantes clubes do mundo árabe, o Al Ahly, do Egito, está sofrendo pressão para que rompa seu contrato de patrocínio com a Coca-Cola.

A empresa, assim como Starbucks, McDonald's e outras marcas dos EUA, é vista como apoiadora das ações de Israel em Gaza. Latas da Coca-Cola com jogadores e o distintivo do Al Ahly, gigante do futebol egípcio
O Al Ahly disputou nesta semana em Cairo a final do campeonato africano de vôlei masculino.

Os egípcios ganharam, mas o destaque ficou pro canto da torcida: "boicote à Coca-Cola, não esquecemos, com nossa alma e nosso sangue, vamos redimir os palestinos"

Por décadas, desde a Guerra dos Seis Dias de 1967 até 1991, países da Liga Árabe boicotaram a Coca. A empresa mantém fábrica de envases em Atarot, território palestino ocupado por Israel.

A pressão fez com que outra empresa dos EUA, a General Mills, encerrasse suas operações lá. Garrafas de Coca-Cola na prateleira de um supermercado, fotografadas de baixo pra cima
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Apr 26
A euforia do povo brasileiro com a Copa de 1950 se transformou em pesadelo com a derrota por 2 a 1 para o Uruguai, o famoso Maracanaço.

Sem ter como comemorar, o Brasil elegeu um vilão: o goleiro negro Barbosa.

Qual o papel da imprensa esportiva na crucificação de Barbosa? Imagem mostra o goleiro Barbosa segurando uma bola com as duas mãos.
O elenco brasileiro, que fez grande campanha até o jogo decisivo, foi muito incensado pela imprensa durante a trajetória.

Antes do jogo contra o Uruguai, era comum que os jornais já estampassem "campeão do mundo". Até o Jornal dos Sports chegou a trazer tais palavras. Imagem é uma página da Gazeta do Povo do dia da final da Copa do Mundo de 1950 com a manchete "Mais algumas horas e seremos campeões do mundo".
Uma narrativa tão incensada positivamente precisava, com o baque da derrota, também tomar o caminho contrário.

Vilões seriam eleitos. Barbosa não foi o único, mas como goleiro e negro, certamente foi o principal. Imagem é o lance do segundo gol do Uruguai na Copa do Mundo de 1950, com a bola já no gol após o chute de Ghiggia.
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Apr 25
Há exatos 50 anos, o Sporting vivia uma das suas melhores temporadas.

Em 24 de abril de 1974, o clube foi disputar uma semifinal continental na Alemanha Oriental.

Mas o plantel levou um susto após o jogo: não poderia voltar porque havia uma revolução em curso em Portugal. O plantel do Sporting na temporada de 1973/1974. Os jogadores posam para a foto em campo, com seis em pé atrás e cinco ajoelhados à frente
Um golpe militar em 1926 havia transformado o país numa ditadura de influência fascista, um regime que, em sua maior parte, foi chefiado por António de Oliveira Salazar.

Era o Estado Novo português, que ocupava quase todos os âmbitos da vida no país - incluindo o futebol. António de Oliveira Salazar, ditador de Portugal, é fotografado de lado prestes a discursar em microfones, em imagem em preto e branco
Esse regime, marcado por perseguição e tortura à oposição e um forte caráter nacionalista, havia começado a perder força.

Guerras por independência nas colônias africanas, como Angola, Guiné-Bissau e Moçambique, crise econômica e grande emigração agravavam a situação portuguesa. Cartaz de propaganda salazarista traz uma ilustração de um homem chegando em casa e sendo recebido pelos filhos e esposa. Abaixo, o lema "Deus, Pátria, Família"
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