Sobre a Divulgação científica, as especialidades e os especialistas...
O que faz com que nós tenhamos parte de nossa carreira dedicada à Divulgação Científica (DC) e o que isto tem a ver com nossa formação?
Segue o fio!
Primeiro queria lembrar que algumas coisinhas que falarei aqui estão neste fio:
Vamos começar do princípio: área de formação.
Ela é fundamental para trabalharmos na Divulgação Científica. Temos, em um curso de graduação, uma introdução ampla a um campo de atuação que nos dá condições de atuar em uma profissão que exige ensino superior.
Até aí, nada de novo +
A pós-graduação (mestrado ou doutorado) são cursos em que nos especializamos em uma área específica, desenvolvendo uma PESQUISA nesta área. Mas a pós-graduação é mais do que isto. No Brasil, também é parte da formação para atuação como docente de nível superior.
Tá, mas e a DC? +
A DC pertence à área da COMUNICAÇÃO, que é considerada das Ciências Sociais Aplicadas.
Isto em um campo de formalidades e caixinhas acadêmicas - que são importantes para muitas coisas. No entanto, não dão conta de tudo, óbvio.
E como nossa formação se relaciona com a divulgação?
É aí que vários meandros se fazem presentes.
A divulgação científica é "tornar de domínio público o conhecimento científico", segundo o Eduardo Bessa - e esta é uma das definições mais bonitas que eu conheço.
A Divulgação é uma via de democratização do conhecimento científico+
Mas a DC tem lá seus embates...
- Existem aqueles que defendem o preciosismo da especialidade (mas e aí? Alguém que não é da comunicação poderia fazer DC?)
- Outros já apontam que a DC pode ser feita a partir da especialidade, mas ela é mais ampla do que nosso curso de pós.
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(claro que há mais do que isso também...)
Aqui há uma certa dificuldade em delimitar. Por exemplo: meu doutorado é em Educação. Mas eu pesquisei uma revista de divulgação científica e os conteúdos de genética humana nesta revista.
Minha pesquisa falou sobre o quê?
De um modo amplo, eu abordei determinismo biológico, conceito de ciência, determinismo genético, eugenia, evolução e noções de sujeito.
Um dos temas que eu menos me sinto à vontade para falar é "Educação" no sentido mais usual do termo.
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As áreas de formação, dependendo dos projetos de pesquisa, são bastante interdisciplinares - e precisam ser. Nenhum pesquisador passa incólume de estudar inúmeros textos, artigos, teses que atravessam nossa área.
As delimitações são tênues e nem sempre fazem sentido +
Além disso, não é como se, na ciência, nós parássemos de estudar após o mestrado ou doutorado.
Iniciar novos estudos, se jogar em áreas de pesquisa ou de atuação, buscando rigor no que se faz e se aprofundando em novas áreas é absolutamente COMUM no meio científico.
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Além disso, nós trabalhamos em equipes interdisciplinares. Debatemos conceitos, artigos, áreas de conhecimento. Articulamos ideias para elaborar trabalhos conjuntos.
A DC busca democratizar conhecimento e deveria ser sobre humildade e reconhecimento de limites.
Limites?
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Sim! Limites, pois nos possibilita ampliar mais e mais nossas condições de trabalho.
E eu usei aqui a MINHA experiência como parte do debate.
Precisa ter mestrado e doutorado para fazer Divulgação Científica?
Não. Não precisa.
Precisa buscar conhecimento técnico e científico.
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precisa aprofundar o olhar e analisar com acurácia os dados.
É preciso, sim, se jogar em campos de conhecimento - e as especializações ajudam (e muito...).
Porém podem também nos deixar desnorteados achando que é só sobre isto que se trata.
E, ao fim e ao cabo, (tcharammm)+
podemos nos esquecer que nossa formação não é em COMUNICAÇÃO, por exemplo. E que fazer fio no twitter, cards no insta, podcasts ou vídeos não necessariamente me faz alguém entendedora da DC. Me faz alguém que está fazendo fios, cards, áudios e vídeos (risos).
Se formos comunicar apenas - e tão somente - nossa área de especialidade no sentido estrito do termo, estaríamos circulares e sem qualquer condição de estabelecer diálogo entre pares.
A pesquisa é, e deve ser, interdisciplinar - tanto quanto deve reconhecer seus limites.
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parcerias são bem vindas, pois agregam conhecimento, nos possibilitam ampliar a visão e democratizar não apenas o nosso conhecimento específico e de nossa caixinha. Possibilitam que vejamos o conhecimento como integrado e passível de ser construído como deve ser: coletivamente.
A divulgação científica não está aqui para ser messiânica e salvadora de todos (ou não deveria estar aqui para isto).
A divulgação científica está aqui para ser acessível e acessada, pelo encantamento que temos pela ciência e por tudo o que ela nos possibilita entender do mundo +
E é por nos encantarmos por tudo o que o conhecimento nos possibilita que organizamos conteúdo, colaboramos com colegas, dialogamos com todos que for possível.
A democratização do conhecimento também não se faz por uma só pessoa - por ser democrática, busca ampliar seu escopo.
E se não for para mergulhar de cabeça em algo colaborativo, coletivo, compartilhado e, acima de tudo, HUMILDE em relação à construção do que queremos para nosso futuro, a partir de uma ciência para todos, a gente nem começa...
;-)
Faz DÉCADAS que cientistas questionam não só a noção de gênero, como a própria definição de sexo biológico como binário.
Se biologues até hoje veem o mundo pelo viés do binarismo, estudando qualquer outra forma dentro do espaço clínico, estamos absolutamente mal na história.
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Mal especialmente por negar a EXISTÊNCIA de diversidade na formação dos corpos de seres humanos, e tudo o que sai fora desse enquadramento binário, vira capítulo da patologia - e estudo da medicina por consequência.
E qual a relevância desse debate?
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A exclusão da diversidade de corpos, formas, estruturas anatômicas e fisiológicas, historicamente marginaliza pessoas - muitas vezes as colocando como “menos humanas”
(oi, eugenia, ainda por aí??? /ironia, porém depende)
✨Qual caminho devo tomar?
A pergunta é de Alice para o Gato Cheshire, que responde que sem saber qual o destino, qualquer caminho serve
Essa ideia serve para a divulgação científica também?
Hoje eu resolvi falar um pouco sobre a importância do planejamento e estudo na DC!
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Ao contrário do que pode parecer, Gato Cheshire não está falando de chegar em algum lugar, mas sobre caminhar sem destino. Pode ser legal no início, se teu interesse é apreciar o caminho.
Mas numa trajetória profissional, em algum momento precisamos de algo + específico.
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Sempre sou surpreendida por esta pergunta de estudantes (de graduação e pós) da unicamp ou de outros espaços (gente que falo aqui no tt, p.ex.).
Isso sempre vem com falas de depreciação sobre si mesmo!
E resolvi escrever sobre isso
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Uma das grandes questões nas falas é:
em que momento da vida normalizamos o fato de alguém em início de carreira acadêmica sentir-se um fracasso por não ter a mesma compreensão (e experiência) de alguém que tem uma longa trajetória no campo de atuação?
Tem sentido isso?
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Tava escrevendo um texto sobre aprendizado e carreira acadêmica, fui atrás da referência do Iván Izquierdo.
Achei um texto dele e colo aqui a conclusão final.
E eu to chorando pq, sinceramente... Que privilégio ter tido aula com um neurocientista que nas palavras, tinha poesia.
sorry, to sensível pela clássica noção de que a pandemia nos roubou Izquierdo e to lendo artigos dele e me sentindo absolutamente um ser privilegiado de ter conhecido esse professor.
Ele tem vários livros MUITO legais sobre aprendizado, memória, esquecimento, acessíveis
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