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Sep 25, 2021 17 tweets 7 min read Read on X
Talvez você tenha visto que, essa semana, Paul Rusesabagina, cuja vida inspirou o filme Hotel Ruanda, foi condenado no país a 25 anos de prisão por terrorismo, num processo bastante controverso.

O governo de Ruanda, um dos países mais pobres do mundo, é patrocinador do Arsenal. Manga da camisa do Arsenal tem os dizeres "visite Ruand
Na prática, o presidente ruandês, Paul Kagame, comanda o país desde 1994.

Naquele ano, houve um genocídio: num período de 100 dias, milícias da etnia hutu mataram cerca de 800 mil pessoas da etnia tutsi.

Kagame é visto como um estabilizador, que ajudou a pacificar Ruanda. Paul Kagame, presidente de Ruanda, está sentado sobre uma c
No entanto, o governo de Kagame é acusado de várias violações de direitos humanos, como perseguição, sequestro e execução de seus críticos.

Um deles é Rusesabagina, que, em 94, comandava um hotel em Kigali, capital do país, e ajudou a salvar centenas de pessoas da morte. Paul Rusesabagina discursa na Universidade de Michigan, nos
Mas voltemos ao futebol.

O patrocínio ao Arsenal, anunciado em 2018 e renovado discretamente em maio deste ano, é visto como uma medida de “sportswashing” de Kagame:

Político habilidoso, ele é acusado de usar o esporte como forma de limpar a reputação internacional do governo. Ex-estrela do Arsenal, Tony Adams entrega ao presidente de R
Ruanda também tem um contrato de patrocínio com o PSG, um clube que por si só já é visto como uma operação de “sportswashing” de outro governo polêmico no Catar, mas com o Arsenal a relação é diferente:

Kagame é torcedor de longa data do clube e tem até um camarote no Emirates. Lionel Messi é visto em montagem com duas fotos: na primeir
Aliás, na estreia do clube na Premier League nesta temporada, o presidente ruandês ficou furioso com a derrota por 2 a 0 para o recém-promovido Brentford, e foi ao Twitter desabafar:

“Nós apenas NÃO devemos desculpar ou aceitar a mediocridade”, escreveu. Imagem de tweet de Paul Kagame, presidente do Arsenal, falan
Quando o anúncio do patrocínio foi feito há 3 anos, sabendo que ia provocar reações, o Arsenal se comprometeu a ajudar no desenvolvimento do futebol ruandês, enviando treinadores de base.

Em 2019, o clube divulgou orgulhoso uma viagem turística do zagueiro David Luiz a Ruanda. David Luiz posa para foto num parque nacional em Ruanda. Ele
Mas, como dissemos, trata-se de um dos países mais pobres do mundo.

De acordo com a Unicef, 39% da população ruandesa está abaixo da linha da pobreza.

E é um país que recebe bastante ajuda financeira da comunidade internacional - inclusive do próprio Reino Unido. Numa imagem multicolorida, diversas mulheres ruandesas são
Por isso, é estranho que o governo invista acima de 10 milhões de libras por ano para aparecer na camisa de um clube inglês riquíssimo.

Kagame já disse que o acordo “paga por si próprio”, já que teria alavancado o número de turistas em Ruanda.

Muitos discordam da conclusão. Fachada do Emirates Stadium, campo do Arsenal, tem o distint
Em entrevista ao site Football.London, a jornalista Michela Wrong, autora de um livro sobre o governo de Paul Kagame, diz que a relação é algo como se o Arsenal “aceitasse dinheiro de Pinochet”, além de classificar o patrocínio como “um insulto ao contribuinte britânico”. Montagem coloca a capa do livro "Do Not Disturb",
O caso de Paul Rusesabagina é bastante emblemático de como funciona a repressão aos críticos de Kagame: o ex-gerente de hotel morava fora de Ruanda desde 1996.

À distância, passou a ser acusado pelo governo de financiar atividades de um grupo terrorista. Paul Rusesabagina é fotografado ao lado de Don Cheadle, ato
Em 2020, ele embarcou num avião em Dubai que acreditava estar a caminho de Burundi, mas o avião pousou em Kigali. Sua família diz que foi um rapto, que Rusesabagina jamais voltaria voluntariamente a Ruanda.

Quando desembarcou, é claro, foi preso, até ser condenado essa semana. Paul Rusesabagina é fotografado algemado, sendo conduzido p
E talvez ele tenha tido sorte: outros críticos do governo Kagame aparecem mortos. É o caso de Patrick Karegeya, assassinado em 2013 na África do Sul, com suspeitas de envolvimento de agentes ruandeses, e de Revocat Karemangingo, executado a tiros em Moçambique há algumas semanas. Patrick Karegeya, crítico do governo de Paul Kagame em RuanRevocat Karemangingo, ruandês crítico do governo de Kagame
Arsenal e PSG estão longe de ser as únicas “armas esportivas” do presidente de Ruanda: neste ano, por exemplo, a NBA ajudou a fundar uma liga de basquete na África, a BAL.

A edição inaugural ocorreu justamente em Ruanda, pela boa relação entre a NBA e o governo de Paul Kagame. Montagem com duas fotos: à esquerda, o presidente ruandês
Aliás, nesta semana, Ruanda chamou a atenção em outro esporte: no campeonato africano de vôlei feminino, o país foi desclassificado por escalar irregularmente jogadoras brasileiras. O campeonato também ocorreu em Ruanda, na capital Kigali, novamente por influência de Kagame. A seleção de vôlei feminino de Ruanda posa para foto, jun
Se você nunca viu Hotel Ruanda e gostaria de ver, o filme está atualmente disponível no Amazon Prime Video. (Não é #publi, mas bem que poderia ser - alô, Jeff Bezos)

O filme de 2004, dirigido por Terry George, é estrelado por Don Cheadle no papel de Paul Rusesabagina. Pôster do filme Hotel Ruanda, com inscrições em francês,
O Copa Além da Copa fala de esporte, política, história, cultura e sociedade.

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Aug 27
Em março, Emmanuel Macron reuniu em um jantar grandes empresários franceses, o emir do Catar e o atacante Kylian Mbappé.

No cardápio, embora um cessar-fogo em Gaza fosse o prato principal, estava servida também a questão dos direitos de transmissão do campeonato francês. Mbappé, Macron e o emir do Catar num jantar no palácio presidencial francês em março
Embora fora da agenda oficial, a permanência de Mbappé na França sempre foi tratada por Macron como um assunto de Estado.

Craque francês mais midiático desde Zidane, ele era a garantia da permanência do interesse do Catar em seus negócios no futebol francês, onde é dono do PSG. Kylian Mbappé chega ao Palácio do Eliseu, em Paris, para jantar com Macron. Ao fundo, músicos de uma fanfarra recebem os convidados
Se, por um lado, o Catar investia no PSG valores muito acima do que dispunham outros clubes franceses, por outro, ele ajudava a sustentar as duas principais divisões do futebol da França com contratos de transmissão pela BeIN Sports, TV esportiva estatal catari. Microfone da BeIN Sports com o logotipo da Ligue 1, primeira divisão francesa
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Aug 14
Um mural em homenagem a oposto Paola Egonu, campeã olímpica com a Itália e eleita a melhor jogadora do torneio, foi vandalizado em Roma, em frente à sede do Comitê Olímpico Italiano.

O desenho, feito pela artista Laika, teve a cor de pele de Egonu trocada de negra pra branca.
O mural original, com Egonu representada em ação com uma medalha de ouro no peito
A versão vandalizada com a pele de Egonu trocada pra branca e com a bola e suas mensagens contra o preconceito pintada
O mural representava Egonu em ação com a medalha de ouro no peito. Na bola do desenho, lia-se uma mensagem pelo fim do racismo, da xenofobia, do ódio e da ignorância.

Essa bola também foi pintada, tirando a mensagem política.

A obra se chamava "italianità" (italianidade). Egonu sorri pra câmera e faz um sinal de paz com os dedos, exibindo sua medalha de ouro com a outra mão
Egonu tem 25 anos e nasceu em Cittadella, uma pequena cidade do Vêneto, no nordeste da Itália. Seus pais são nigerianos, e ela obteve a cidadania aos 14.

Além dela, no time que conquistou o ouro em Paris, havia outras duas jogadoras negras: Myriam Sylla e Loveth Omoruyi.
Myriam Sylla gritando em quadra, em ação pela Itália
Loveth Omoruyi posando para foto com a camisa da Itália
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Aug 8
Surgido no seio da cultura hip-hop nos EUA, o breaking fará sua estreia como esporte olímpico em Paris.

É um grande passo pra uma dança urbana com origem nos bailes do Bronx, em Nova York, expressão da comunidade negra.

Mas alguns temem a transformação da sua arte em esporte. Participação de b-boy nos Jogos da Juventude de Buenos Aires 2018
Apelidado "pai do hip-hop", o DJ Kool Herc fazia sucesso nas festas do Bronx na década de 70.

Ao perceber que as pessoas dançavam mais nas "quebras" das músicas, quando só se ouvia a percussão, ele passou a ampliar essas quebras usando dois toca-discos. Nascia aí o breaking. O DJ Kool Herc em ação em imagem em preto e branco. Ele mexe com um disco de vinil e com seu equipamento
Se o DJ Kool Herc não teve tanto sucesso comercial, ícones do hip-hop como Afrika Bambaataa e Grandmaster Flash ajudaram a ampliar o alcance dessa arte, que chegou aos banlieues, a periferia de Paris, na década de 80.

Hoje, a França é o 2º maior mercado de hip-hop do mundo. B-boys praticando breaking em imagem em preto e branco dos anos 80
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Aug 8
Nos Jogos Olímpicos de 1992, em Barcelona, Cuba registrou sua melhor performance a história: 14 ouros, 6 pratas e 11 bronzes, com a quinta colocação no quadro de medalhas.

Às vésperas do fim dos Jogos de Paris, os cubanos só têm dois ouros. O que aconteceu? Imagem mostra seis jogadoras de võlei cubanas em quadra, vestindo camisas vermelhas com "Cuba" escrito e com os braços levantados.
Após a Revolução Cubana, em 1959, o esporte foi estabelecido como um dos pilares da sociedade. Houve integração direta com o sistema educacional público.

O modelo cubano foi inspirado no soviético, com escolas especializadas no desenvolvimento de atletas de elite. Imagem mostra Fidel Castro junto com outros líderes revolucionários, a maioria segurando armas.
Cuba teve sucesso na sua empreitada educacional com um dos menores níveis de analfabetismo do mundo, enquanto desenvolveu um grande número de atletas de elite.

Apesar do embargo econômico liderado pelos EUA, os subsídios soviéticos mantinham a engrenagem. Imagem mostra uma sala de aula em Cuba na década de 1960 com uma família escrevendo em cadernos.
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Aug 8
"Yeah, boyeeeeee!"

O rapper Flavor Flav, um dos fundadores do Public Enemy, tem seus grandes relógios pendurados no pescoço como marca registrada. Mas pode trocá-los em breve por uma medalha.

Ele está em Paris como torcedor número 1 do time de polo aquático feminino dos EUA. O rapper Flavor Flav em Paris, vestido com uma touca de polo aquático e com um relógio no pescoço
Em maio, Maggie Steffens, capitã do time feminino dos EUA na modalidade, fez um post no Instagram sobre a dificuldade dela e de suas suas colegas de terem visibilidade e patrocínio para competir nas Olimpíadas.

Isso mesmo com os EUA sendo atuais tricampeões olímpicos. Maggie Steffens em ação na piscina em Paris contra a Espanha
Steffens, que esteve em todas as conquistas e é considerada uma das maiores da história do polo aquático, afirmou que todas elas precisam de outros empregos pra se sustentar.

O post chegou até Flavor Flav, que escreveu que, como pai de menina, queria apoiar o esporte feminino. Maggie Steffens exibe pra câmera suas três medalhas de ouro no polo aquático com os EUA
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Aug 7
Os EUA deixaram atletas pegos no doping continuarem competindo, mesmo contra as regras da Agência Mundial Antidoping (WADA), para que pudessem servir como "agentes infiltrados" e recolher informações sobre outros que estivessem trapaceando.

EUA e WADA estão numa queda de braço. LeBron James em destaque no barco que carregou os atletas dos EUA na abertura das Olimpíadas de Paris
Os EUA acusam a WADA de proteger nadadores chineses que também foram pegos no doping e ameaçam investigar a agência por conta própria, desdobramento de uma lei aprovada recentemente.

Explicamos o imbróglio aqui:
Segundo a Reuters, a agência antidoping dos EUA (USADA) autorizou atletas estadunidenses que estavam se dopando a continuar participando de competições normalmente.

Mas a USADA diz que isso é um trabalho de inteligência: em troca, eles ajudariam a identificar outros trapaceiros. Imagem aleatória produzida de um suposto "agente infiltrado": um homem de óculos escuros dentro de um carro com um rádio na mão, tal qual um espião
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