Vou encher um pouco a vida de vocês. Venho defendendo que 2013 não teve nada a ver com a escalada da extrema-direita no Brasil. Acho que essa versão demoníaca de 2013 é uma tentativa de emplacar uma versão paulista (onde a direita teve realmente espaço). Lá vai.
1) Vou reproduzir duas informações interessantes sobre como se articularam jovens desde o início do século XXI, recrutados por empresários paulistas, cariocas e gaúchos, em especial. Constam no livro As Direitas nas Redes e nas Ruas, organizado por Esther Solano e Camila Rocha
2) No início dos anos 2000, existiam na internet alguns poucos blogs e listas de emails nos quais circulavam argumentos em defesa da maior liberdade de mercado (...). Tal cenário começou a mudar a partir de 2004 com a criação da rede social Orkut.
3) Voltado inicialmente para o público estadunidense, o Orkut se popularizou tão rapidamente entre usuários/as brasileiro/as que, em janeiro de 2006, cerca de 75% do total dos/das usuários/as era do Brasil.
4) Integrantes das comunidades de Orkut eram estudantes universitários que haviam tido um contato inicial com o liberalismo econômico por meio de cursos oferecidos em suas respectivas universidades (...).
5) Era comum entre os frequentadores do Orkut o desejo de participar de atividades relacionadas à política estudantil, e no final dos anos 2000 estes passaram a integrar chapas para disputar centros acadêmicos e diretórios estudantis em suas respectivas universidades
6) Esse foi o caso de Lourival de Souza, na época estudante da Universidade Federal do Maranhão, que relata: “o Orkut começou a crescer, nessa época você começa a conhecer a turminha das antigas, as comunidades de Olavo de Carvalho, comunidade Liberalismo (...)”
7) A formação de grupos de estudo e de chapas políticas para disputar centros e diretórios acadêmicos foi ganhando uma sustentabilidade maior à medida que novas organizações, mais conectadas com o tipo de engajamento que vinha surgindo no Orkut, foram sendo fundadas.
8) Hélio Beltrão e Rodrigo Constantino, ativos participantes que ocorriam nas comunidades Orkut e que já possuíam contato com personagens importantes da rede de organizações pró-mercado previamente existentes, participaram da fundação do Instituto Millenium em 2005.
9) Hélio Beltrão é filho do ex-ministro de mesmo nome que costumava frequentar os círculos formados em torno do Instituto Liberal do Rio de Janeiro. É irmão da jornalista Maria Beltrão, da Globonews. Já Constantino trabalhara o mercado financeiro sob a chefia de Paulo Guedes.
10) Inicialmente pensado para ser uma filial do Instituto de Estudos Empresariais, o Instituto Millenium foi fundado por acadêmicos, executivos e profissionais liberais, entre os quais Denis Rosenfield, Patrícia Carlos de Andrade, Gustavo Franco, Paulo Guedes, Hélio Beltrão.
11) Batizada em 2005 de Instituto de Estudos da Realidade Nacional, a organização foi lançada em 2006, no Fórum da Liberdade, com o nome de Instituto Millenium, financiada pelo Grupo Abril, Organizações Globo, Grupo Ultra, Grupo Gerdau, Grupo Évora, entre outros.
12) O MBL é filhote dessa esteira que começa com o Orkut e financiamento de empresas paulistas, cariocas e gaúchas. Em 2011, colocaram a manguinha de fora durante a Marcha da Liberdade. Os jovens ultraliberais se concentravam no vão do Masp.
13) A Marcha da Liberdade foi um protesto contra a proibição da Marcha da Maconha. Contudo, ali estavam os jovens que criariam o MBL em 2014, como Felipe Celletti e Joel Fonseca.
14) Ficarei por aqui. As informações estão no artigo de Camila Rocha publicado no livro que citei acima, organizado por ela e Esther Solano. Mais adiante, postarei informações que se somam a essas. (FIM)
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Bom dia. Acabo de ler “O Projeto”, de David Graham, jornalista do Atlantic, dos EUA. Graham dissecou o documento “Projeto 2025”, elaborado por extremistas alojados na Heritage Foudation, tendo à frente os ultraconservadores Russel Vought e Paul Dans. Lá vai fio:
1) O livro é fácil de ler e descreve ações para destruir a estrutura básica da gestão pública moderna. Declaram explicitamente a politização de todos os órgãos de Estado, a extinção de muitos deles e a redução drástica do número de funcionários de carreira
2) Seus autores fazem uma miscelânea entre cristianismo e nacionalismo, entre reacionarismo e defesa dos trabalhadores, entre oposição frontal à cultura “woke” e o ataque aos carros elétricos porque querem conter a China e a dependência das terras raras.
Bom dia. Foi muito esclarecedora a mensagem que Eduardo Bolsonaro enviou ao seu pai. Um misto de desrespeito e ressentimento. Imediatamente, veio à memória a pesquisa de Adorno sobre as personalidades fascistas. O fio é sobre esta pesquisa:
1) Publicada em 1950, nos EUA, a pesquisa liderada por Adorno (da Escola de Frankfurt) envolveu 2 mil pessoas e procurou identificar traços de indivíduos que apresentavam inclinação aos ideais fascistas.
2) O traço principal verificado foi a relação autoritária que esses indivíduos foram submetidos na sua infância, verticalizada e de uso. Tal relação se transferiu, na vida adulta, para a esfera do poder e dominação, baseada no uso do parceiro sexual.
Bom dia. Estava assistindo uma minissérie quando, em determinado momento, o personagem principal, em meio a um caos instalado, sugere que todos somos movidos por sonhos. De fato, ninguém deseja ser desiludido. Este é o fio.
1) Ouvi esta frase numa palestra, acho que de Nilson José Machado, o idealizador do ENEM ( que originalmente foi inspirado na teoria das inteligências múltiplas). Ele falava da origem da palavra ilusão, que é "illudere", e que significa "brincar com".
2) E lascou esta conclusão: "a questão é que ninguém deseja ser um desiludido". A questão deste fio, conduto, é uma derivação dessa conclusão que não há como um ser humano viver sem utopia, sem "brincar com a realidade". Daí a necessidade da arte e até da bondade.
Bom dia. Por mais paradoxal que possa parecer, acho que Hugo Motta ajudou Lula a sair de uma arapuca. Explico a afirmação no fio que começa agora:
1) Até então, o Lula3 estava amarrado ao Centrão, praticamente paralisado. O medo que tomou conta de Lula tinha como fonte a capacidade de mobilização do bolsonarismo que poderia desmoralizar a sua história de líder de massas.
2) Eis que, de repente, o bolsonarismo coloca 12 mil pessoas na avenida Paulista e Hugo Motta resolve peitar o projeto de Haddad sobre o IOF. O IOF era a tábua de salvação para dar sobrevida às contas governamentais.
Boa tarde. O fio de hoje é sobre o calcanhar de Aquiles dos Bolsonaro: agitam, mas não organizam. Lá vai:
1) Max Weber nos ensinou que há um tipo de líder que arrebata as massas pela paixão. Raramente se relaciona com as tradições e é ainda mais raro respeitar regras e normas. Trata-se do líder carismático.
2) Carisma significa “toque de Deus”. Por algum motivo, alguém é escolhido para se sacrificar ou para se distinguir dos outros humanos. Ele parece igual aos outros, mas algo o diferencia da multidão.
Bom dia. O fio de hoje é sobre a frase de Chico de Oliveira que postei ontem por aqui. Dizia que os anos 1990 retiraram a musculatura do Estado brasileiro e o século 21 retirou a musculatura da sociedade civil. Lá vai:
1) O Estado foi criado como garantidor da estabilidade social cujo objetivo era sustentar que as expectativas individuais (e coletivas) fossem passíveis de serem realizadas.
2) Se no século 19 surgiu a ideia de proteção social via intervenção estatal – vindo do improvável projeto de Bismark -, no século 20 se projetou, via socialdemocracia, a lógica da promoção social via amplas políticas de Estado.