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Feb 8, 2022 16 tweets 6 min read Read on X
Jornalismo de qualidade exige mais do que recursos. E o Grupo Folha, que tem um faturamento anual de mais de 2,7 bilhões de reais, é prova disso. Em 5 de abril de 2009, a Folha de S. Paulo estampou em sua capa uma ficha policial falsa atribuída a Dilma Rousseff.

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Apresentado como autêntico, o documento forjado foi publicado na íntegra na página A10 do jornal, ilustrando uma matéria que implicava Dilma Rousseff em um suposto plano para sequestrar Delfim Netto, ministro da fazenda da ditadura militar.

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Segunda a Folha, a reportagem foi baseada em um depoimento de Antonio Roberto Espinosa, ex-comandante da Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares) — grupo da esquerda radical que participou da luta armada contra a ditadura militar.

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Espinosa teria dito ao jornal que o plano de sequestrar Delfim Netto, um dos mais destacados burocratas do regime, era conhecido pelos membros da cúpula da organização, incluindo Dilma Rousseff.

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O grupo, entretanto, teria desistido do sequestro após ser parcialmente desarticulado pelas operações dos órgãos de repressão. Ao ser questionada pelo jornal, Dilma negou ter conhecimento sobre tal ação. Não obstante, a matéria foi publicada como relato factual.

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O próprio Espinosa, entretanto, desmentiu a reportagem, negando ter dito que Dilma conhecia o plano e acusando o jornal de distorcer seu relato. "Dilma sequer teria como conhecer a ideia da ação, a menos que fosse informada por mim (...).

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"O que disse à repórter é que informei (...) que o Regional de SP estava fazendo um levantamento de um quadro importante do governo, talvez para sequestro e resgate de companheiros então em precárias condições de saúde", afirmou o ex-guerrilheiro.

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Embora fosse integrante da VAR-Palmares, Dilma pertencia ao grupo dos "basistas", que desenvolvia ações voltadas à conscientização política, e sempre sustentou não ter participado de ações armadas — afirmação endossada por outros membros da organização.

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O jornal admitiu ter mentido sobre a origem da ficha policial falsa utilizada para ilustrar a matéria, atribuindo a desinformação a um "erro de catalogação". Ao contrário do que disse a Folha, a ficha não foi obtida junto ao Arquivo Público de São Paulo.

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A ficha estava disponível em um site de extrema-direita chamado "Ternuma" ("Terrorismo Nunca Mais"), uma organização de apologistas da ditadura e admiradores do torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra. O documento forjado atribuía a Dilma práticas como terrorismo,...

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...assaltos e conspiração para a prática de homicídio. Dilma, entretanto, jamais foi indiciada ou processada por tais atos durante a ditadura — nem mesmo durante os três anos em que ficou presa por "subversão", sendo submetida a interrogatórios e sessões de tortura.

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Não há quaisquer documentos nos arquivos militares e acervos documentais que a vinculem às práticas descritas na ficha. Em junho de 2009, a ficha policial foi analisada por especialistas do Instituto de Computação da Unicamp.

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O laudo produzido pela Unicamp confirmou que a ficha era falsa e fora fabricada digitalmente, possuindo indícios de manipulações tipográficas grosseiras. A Folha noticiou a perícia, mas ocultando o nome da instituição e insinuando conflito de interesse na chamada.

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Apesar disso, a Folha seguiu se negando a admitir que utilizou um documento falso para atacar a Ministra-Chefe da Casa Civil do governo Lula — já reconhecida como nome favorito do partido para disputar a eleição presidencial no ano seguinte.

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Em uma publicação patética misturando mea culpa envergonhado e arrogância injustificada, o jornal voltou a mentir para seus leitores, afirmando que a autenticidade da ficha "não pode ser assegurada, mas também não pode ser descartada"

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A imprensa reagiu com o habitual corporativismo, ignorando a polêmica. Na Veja, Reinaldo Azevedo, tratou de contemporizar e ao mesmo tempo inflamar, dizendo que se a VAR-Palmares de Dilma chegasse ao poder, milhões morreriam. "É matemática, não é ideologia", assegurou.

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Dec 4
Há 66 anos, o general Lott esmagava a Revolta de Aragarças, levante golpista contra o governo de Juscelino Kubitschek. A revolta foi conduzida por militares que já tinham tentado um golpe 3 anos antes, mas receberam anistia. Leia no @operamundi

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operamundi.uol.com.br/pensar-a-histo…
Candidato à presidência pelo PSD na eleição de 1955, Juscelino Kubitschek (JK) se apresentou ao eleitorado como herdeiro político de Getúlio Vargas, prometendo trazer ao Brasil “50 anos de desenvolvimento em 5 anos de mandato”.

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JK conseguiu herdar os votos de Vargas e foi eleito presidente. O mesmo ocorreu com João Goulart, ex-Ministro do Trabalho de Vargas, que foi eleito como vice em votação separada.
Mas, ao mesmo tempo, JK e Goulart também herdaram a fúria do antigetulismo.

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Read 26 tweets
Nov 13
O Ministério Público de Milão anunciou abertura de uma investigação formal contra cidadãos italianos suspeitos de terem participado de "safáris humanos" durante a Guerra da Bósnia. Os turistas europeus pagavam até R$ 600 mil para matar civis por diversão.

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O caso ocorreu durante o Cerco de Sarajevo, episódio dramático da Guerra da Bósnia, que se estendeu de 1992 a 1996. Considerado um dos mais violentos cercos militares do século 20, a ofensiva contra a capital bósnia deixou cerca de 12.000 mortos e 60.000 feridos.

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Conforme a denúncia, o serviço era ofertado pelo exército sérvio-bósnio, chefiado por Radovan Karadzic, preso desde 2008. O Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia o condenou a 40 anos de prisão por genocídio e crimes contra a humanidade.

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Read 15 tweets
Oct 21
Está avançando na Assembleia Legislativa de São Paulo o PL 49/2025, oriundo da base de apoio do governador Tarcísio de Freitas, que prevê a extinção da FURP — a Fundação para o Remédio Popular, laboratório público que que produz medicamentos de baixo custo para o SUS.

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O governo Tarcísio alega que os resultados financeiros negativos da fundação justificariam o seu fim. O projeto de lei prevê a autorização para vender os edifícios, terrenos e ativos da FURP nas cidades de Guarulhos e Américo Brasiliense.

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As instalações da FURP — sobretudo a unidade de Guarulhos — são há muito tempo cobiçadas pelo mercado imobiliário. O terreno de Guarulhos tem 192.000 m² e está estrategicamente localizado próximo à Via Dutra e à futura estação do Metrô.

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Read 13 tweets
Oct 13
Há 2 anos, a Palestina perdia uma de suas maiores artistas. A pintora Heba Zagout foi assassinada por um bombardeio aéreo israelense que destruiu sua casa em Gaza. 2 de seus 4 filhos pequenos também foram mortos no ataque. Leia mais no @operamundi

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operamundi.uol.com.br/pensar-a-histo…
Heba Zagout nasceu em 14/02/1984 no campo de refugiados de Al-Bureij, na Faixa de Gaza. Ela descendia de uma milhares de famílias expulsas de suas terras durante a “Nakba” — a operação de limpeza étnica conduzida pelas milícias sionistas após a criação do Estado de Israel.

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A família de Heba era proveniente da cidade palestina de Isdud — um povoado milenar, registrado nos textos bíblicos como uma das 5 cidades-estados da Filisteia. Conforme o próprio plano de partilha da ONU, Isdud deveria pertencer aos domínios do Estado Palestino.

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Oct 10
Há 20 anos, Lula lançava programa de renovação da frota de petroleiros. O PROMEF fomentou a recuperação da indústria naval do Brasil, que se tornou uma das maiores do mundo e superou a dos EUA — mas foi destruído pela Lava Jato. Leia no @operamundi

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operamundi.uol.com.br/pensar-a-histo…
A política de desenvolvimento da indústria naval teve início em 1956, com o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek. O governo criou o Fundo de Marinha Mercante e investiu no parque naval como parte da política de industrialização e de substituição de importações.

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João Goulart ajudou a consolidar o projeto, visando diminuir as despesas com afretamento de embarcações estrangeiras. Os investimentos na indústria naval eram tão estratégicos que foram mantidos pelos militares após o golpe de 1964.

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Oct 9
Há 172 anos, nascia José do Patrocínio. Ele se consagrou como um dos grandes jornalistas do século 19 e foi um dos principais comandantes da luta contra o regime escravocrata, recebendo a alcunha de "Tigre da Abolição". Leia mais no @operamundi

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José do Patrocínio nasceu em 09/10/1853 em Campos dos Goytacazes. Era filho do vigário João Carlos Monteiro e de Justina do Espírito Santo, uma jovem escravizada. Seu pai, embora fosse padre, era conhecido pela vida desregrada, repleta de bebidas, jogos e aventuras sexuais.

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Era também um homem poderoso, proprietário de terras e deputado. Justina era uma das muitas pessoas escravizadas pelo padre. Foi entregue a ele como presente de uma fiel da paróquia.
O vigário não reconheceu Patrocínio como filho, mas permitiu que crescesse como liberto.

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