Em 9 de fevereiro de 1992, o técnico neerlandês Guus Hiddink, treinador do clube espanhol Valencia, notou uma bandeira com uma suástica na torcida, momentos antes do jogo do seu time contra o Albacete.
Disse: ou retiram isso, ou não jogaremos.
Valencia e Albacete estavam se aquecendo quando Hiddink percebeu a bandeira pendurada no setor visitante do Estádio de Mestalla.
Na época, porém, isso era relativamente comum nos estádios espanhóis.
A Espanha havia sido uma ditadura de orientação fascista até 1975.
Na época, a imprensa espanhola noticiou a atitude de Hiddink com espanto.
Matéria do El País dizia que o treinador havia conseguido “o que nem a polícia ou outros torcedores” tinham feito: coibir nazis.
O fato de ser estrangeiro contou muito para que ele não normalizasse aquilo
Pior, ele foi criticado por dirigentes do próprio Valencia, que diziam que ele “não tinha que se meter nesses assuntos”. O treinador foi acusado até de estar “querendo aparecer”.
Mas Hiddink disse: “quando vejo essas coisas, não posso me calar (...) É errado permanecer passivo.”
“Atualmente, são grupos pequenos, e acho que não vão fazer nada. Mas, como pessoa, quero tomar partido e rechaçá-los”, afirmou o treinador à imprensa.
Disse ainda que tinha certeza de que muitos jovens “não sabiam de verdade” o que esses símbolos representavam.
Mas ele sabia.
Hiddink nasceu em Varsseveld, cidade dos Países Baixos próxima à fronteira com a Alemanha.
Em setembro de 1944, a cidade foi completamente destruída pelos alemães, que disputavam seu controle com os Aliados.
Seu pai, Gert Hiddink, participou da resistência antinazista.
Professor e futebolista amador, Gert Hiddink escondeu judeus em sua casa, antes que Guus nascesse, em 1946.
Também deu abrigo a paraquedistas britânicos e estadunidenses na cidade, e, mais tarde, recebeu uma medalha das mãos do general Dwight Eisenhower, dos EUA, pelos feitos.
Apesar de Guus Hiddink, a simbologia nazifascista só foi banida dos estádios espanhóis em 2007.
Antes, clubes como o Real Madrid, por exemplo, tinham grupos de torcedores abertamente fascistas como os Ultras Sur. Seus gestos e ações eram despolitizados como “parte do futebol”.
Agora, notem: o ato de Guus Hiddink completou exatos 30 anos ontem.
Por isso, é inacreditável que o Brasil, graças a deputados, comentaristas da Jovem Pan e podcasters, esteja ainda debatendo em 2022 que esses grupos merecem espaço.
O poço em que entramos parece não ter fundo.
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O Mundial de Clubes esteve próximo de não acontecer porque faltava dinheiro.
A FIFA conseguiu vender os direitos de transmissão ao DAZN, que pagou US$ 1 bilhão pra exibir o torneio de graça, e pouco depois recebeu um investimento da Arábia Saudita.
Que queria uma Copa do Mundo.
O serviço de streaming da FIFA, o FIFA+, até então gratuito, passou a ser alocado dentro da plataforma DAZN, que conseguiu novos e interessantes conteúdos pra atrair mais assinantes.
Um dos clubes envolvido na disputa do Mundial, o Al-Hilal, pertence ao fundo soberano saudita.
Que também é dono do Newcastle, que não está disputando o torneio, diferentemente dos ingleses Chelsea e Manchester City.
A imprensa inglesa então questiona: estariam então os donos do Newcastle dando dinheiro pra dois rivais de forma indireta?
Campeão do mundo em 2022, Lionel Messi surpreendeu ao escolher, no ano seguinte, o Inter Miami como seu próximo destino.
A equipe tem David Beckham como rosto público, mas seus outros donos têm história curiosa:
Sua fortuna se deve, em grande parte, ao terrorismo contra Cuba.
Na apresentação de Messi, ele foi celebrado não apenas por Beckham, mas pelos irmãos cubano-estadunidenses Jorge e Jose Mas, filhos de Jorge Mas Canosa, um ferrenho opositor do governo cubano.
Ambos são sócios de Beckham no clube e Jorge aproveitou pra discursar diante de Messi.
Afirmou que a equipe era um tributo a Miami, que acolheu sua família em busca de "liberdade".
Aliás, a palavra "freedom" é um dos lemas do Inter Miami: seu próximo estádio, previsto pra 2026, se chamará Miami Freedom Park.
Os irmãos Jorge e Jose nasceram ricos graças ao pai.
Após a vitória do seu Barcelona sobre a Juventus, o técnico Luis Enrique comemora no campo ao lado de sua filha, que agita uma bandeira do clube catalão. Eram os campeões da Europa.
10 anos depois, ele quer repetir a cena. Mas sua filha não está mais aqui.
Xana tinha apenas 9 anos quando faleceu, em 29 de agosto de 2019, devido a uma forma rara de câncer ósseo.
Ele e sua esposa, Elena Cullell, a mãe de Xana, montaram uma fundação com o nome dela após sua morte, para dar apoio a crianças com câncer e às suas famílias.
A vida de Xana coincide um pouco com a carreira de técnico de Luis Enrique, que começou nas categorias de base do Barça, passou pela Roma, pelo Celta, até chegar ao profissional do gigante catalão.
Com ele, o Barça formou o ataque com Messi, Suárez e Neymar e ganhou a Champions.
Um feito histórico no Irã: pela 1ª vez, um clube azeri (azerbaijano) é campeão nacional.
O Tractor, para orgulho dessa que é a maior minoria étnica do país, conquistou o título local.
Nos últimos anos, ele tem sido válvula de escape de uma minoria perseguida pelo governo.
É comum que se pense no Irã como um lar só dos persas, mas o país é um caldeirão étnico. Existem curdos, árabes, baluchis e, sim, azeris.
Estima-se que esses últimos sejam em torno de 20% da população do país, ou algo entre 12 a 20 milhões de pessoas.
Mas a questão é delicada.
A dinastia Pahlavi, que ascendeu ao poder há 100 anos, instaurou políticas de nacionalismo étnico, buscando "persificar" todo o Irã, perseguindo manifestações de identidade azeri.
Ela foi derrubada pela Revolução Islâmica de 1979 com ajuda dos azeris, mas eles se decepcionaram.
"O time de mais sucesso na Inglaterra não é inglês. É scouse".
O Liverpool levantou o título da Premier League e a Nike aproveitou e reforçou uma identidade que clube e cidade adoram promover.
Mas afinal, o que é scouse, e por que há uma certa polêmica com o uso do termo?
Liverpool é uma cidade portuária no oeste da Inglaterra. Distante da capital Londres, tem características que não combinam com a aristocracia que marca o país.
Desde o século XVIII, é também um caldeirão cultural.
Pela sua localização, recebia marinheiros principalmente de Gales, da Irlanda e da Escandinávia. A mistura dessas pessoas que chegavam à cidade gerou um sotaque único.
Além disso, o porto foi local de surgimento de um prato típico.
Em 1998, o clube argentino San Lorenzo atravessava uma crise.
Para contorná-la, contratou o técnico Alfio "Coco" Basile, que estrearia em partida contra o Platense.
Pra começar a mudar as coisas, ele expulsaria uma pessoa do vestiário: Jorge Bergoglio, o futuro papa Francisco.
A história, relembrada por Basile em mais de uma entrevista nesses 12 anos em que Francisco foi papa, dá conta de que ele chegou ao vestiário pra sua partida de estreia acompanhado de Fernando Miele, presidente do San Lorenzo.
Aí, levou um susto: havia um padre por lá.
Basile diz ter perguntado pra Miele quem era essa figura, e o presidente respondeu: "é um torcedor do San Lorenzo que está sempre aí, benzendo os jogadores".
Ao que o técnico disse: "você me contratou porque vocês não ganham de ninguém. Seja lá o que ele faz, não funciona".