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E como essas estimativas são feitas? Como eu posso confiar nelas? Agora vou tentar destrinchar alguns detalhes de modelagem. Acredito que todos já estejam familiarizados com o conceito do numero de reprodução básico Rₜ (comenta nesse tweet se não estiver)
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Acima de 1, epidemia cresce. Abaixo de 1, epidemia decresce. Em 1, ela é estável. Acontece que esse numero muda com o tempo devido a todos os fatores mencionados nos tweets acima. O valor de R depende principalmente de 3 coisas:
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1 - O valor de Rₜ no início da epidemia, sem alterações comportamentais na população ou medidas de intervenção, o chamado R0.2 - A medida de intervenção ativa no momento ou a mudança adotada pela população
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3 - A aleatoriedade latente, ela trás as mudanças aleatórias que ocorrem em uma sociedade que alteram o Rₜ, como a população de um local aderir mais a uma medida de intervenção do que outro local
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Em termos matemáticos, isso é descrito da seguinte forma, os subíndices indicam que o valor de Rₜ é calculado em um instante específico “t” e uma localidade “l” para um conjunto “i” de intervenções.
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Em tese, o R0 é escolhido para representar o período pré intervenções e mudanças comportamentais. Mas, já que estamos interessados em medir o efeito das intervenções COM as mudanças comportamentais já na sociedade
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É interessante escolher um R0 de um período sem intervenções, mas mais para frente da pandemia. Assim a base de comparação do efeito das intervenções é já um período onde a população havia incorporado mudanças sociais devido à pandemia
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Nesse artigo, os autores escolheram como estimativa de R0, o período de Agosto de 2020, quando muitos países europeus liberaram as restrições e o fator que mais continha o crescimento de R0 era principalmente o próprio comportamento social da população.
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O efeito de uma intervenção é dado pelo parâmetro de efeito β. Os autores assumem que β depende apenas do tipo de intervenção e não muda entre locais ou o tempo.
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Isso poderia ser uma limitação forte no modelo, mas a latência aleatória é responsável por trazer mudanças aleatórias na redução de Rₜ, que podem ocorrer entre locais e entre instantes de tempo diferentes.
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A latência aleatória é dada por um random walk, ou caminhar aleatório que pode acabar representando dinâmicas diferentes para a intervenção. Ela pode ter seu efeito diluído com o tempo, ou aumentado, ou um local pode ter um efeito maior e mais duradouro.
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O random walk trás essa variação. Random walk é um ruído aleatório que é adicionado ao valor de Rₜ para representar possíveis caminhos que o Rₜ pode seguir
Agora que vimos como Rₜ muda, resta saber como ele se conecta com os casos e como extraímos ele dos nossos dados.
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O Rₜ nos diz a proporção de casos secundários que um infectado causa. Portanto, a princípio, seria apenas aplicar a razão (Casos hoje/Casos ontem), e teríamos o valor de Rₜ.
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Mas as coisas não são simples assim. Nem sempre um infectado infecta alguém já no dia seguinte. Isso leva um tempo. Esse tempo que leva entre infecções é chamado de intervalo entre gerações.
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Ele é dado em termos de uma distribuição de probabilidade que nos diz a proporção de infecções secundárias que ocorreram entre x e x+1 dias após a infecção. Essa é a forma da distribuição de intervalo de geração da COVID-19.
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Nela, a área da curva entre dois dias nos dá a probabilidade de que um caso secundário seja gerado entre os dois dias. Nessa distribuição abaixo, a probabilidade de um caso secundário ocorrer entre o dia 3 e 4 após a infecção é de 21.7%. Caso tenham duvidas, comentem aqui
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Levando em conta então o intervalo entre gerações, o numero de casos hoje Nₜ é dado pelo numero de reprodução Rₜ vezes a quantidade de casos nos últimos dias, multiplicados pelo intervalo de gerações em cada dia, para sabermos quantos dos casos passados geraram casos hoje
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Além disso, há outra coisa que precisa ser considerada. Uma vez infectado, uma pessoa ainda precisa ser testada e ter o resultado. Isso leva tempo. Por isso, o numero de casos hoje N só vai ser reportado após uma quantia de tempo Pc.
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Novamente, Pc é dado por uma distribuição que nos diz a probabilidade de um caso ser reportado x dias após a infecção.
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Ok, temos muitas coisas aqui. Mas notem que quase tudo já é conhecido. Sabemos a forma da distribuição do intervalo de geração, do intervalo entre infecção e notificação, temos acesso à quantidade de casos no passado
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Sabemos a quantidade de casos hoje e o valor de R0 antes das intervenções. Assim, o único real parâmetro desconhecido é o β.
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Levando tudo isso em consideração, calcula-se o valor de Rₜ para os períodos durante uma ou mais intervenções aplicadas e estima-se o valor de β para cada uma delas. Dessa forma, podemos saber o quão eficaz uma medida de intervenção foi (o quanto diminuiu a transmissão).
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Uma coisa interessante é que β não necessariamente é obrigado a ser positivo (a demonstrar efeito para a medida de intervenção). Ele pode ser 0 e até mesmo negativo, caso a medida seja realmente muito ruim.
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Isso é muito importante, pois restringindo β para valores positivos nós forçamos o modelo a encontrar alguma efetividade, o que é enviesar o resultado, por isso neste artigo β não é forçado para valores positivos. Isso é o efeito da escolha de priori no modelo
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Essa é honestamente a parte que eu mais gosto em artigos que envolvem modelagem matemática, entender o modelo e comparar com a realidade. Claro que ainda há fatores que podem ser inclusos, como a heterogeneidade por idade.
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Como cada faixa etária tem padrões de contato diferentes, seria mais justo estimar um Rₜ para cada faixa etária, afim de compor o Rₜ total a partir destes Rs.
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Ou então incluir um outro termo que muda Rₜ que esteja associado à presença de variantes. Por exemplo, pode-se dizer que do período de X até Y, R0 vale 1.7, já de Y para frente, R0 vale 2.1 devido à uma nova variante com transmissibilidade intrínseca maior.
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Entretanto, isso requer dados mais precisos, sabendo a quantidade de casos em cada faixa etária e sabendo a forma das distribuições mencionadas, bem como o R0 para cada faixa etária e específicos de cada variante. Aqui vemos uma barreira para fazer modelos + realísticos
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Frequentemente não temos dados que sirvam para eles. Modelagem matemática de fenômenos é um balanço entre modelos acurados com a realidade e a disponibilidade de dados para ajustá-los. Encontrar esse balanço com os dados disponíveis é incrível.
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A capacidade de uso desses modelos é o que nos permite quantificar e estimar as incertezas em torno de medidas no mundo real.
Perdão pelo fio longo 😅 (Se você chegou até aqui tome esse gif)
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Faz uns dias que várias amizades me mandaram um post (perdi o link dele) com os números de 0 a 99 posicionados em ordem alfabética. Forma uma padrão bem legal.
Vou mostrar aqui o padrão de algumas línguas e uma outra forma que acho legal de ver esse ordenamento alfabético.🧵
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Se alguém tiver o link do post original, comenta aqui. Nesse gráfico, os números estão ordenados da esquerda pra direita seguindo a ordem 0,1,2... e de cima pra baixo seguindo a ordem alfabética.
Já fiz uma visualização de línguas no passado também
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Então notem, por exemplo, que zero é o primeiro na esquerda, mas é o mais alto porque é o último em ordem alfabética (levando em conta os números de 0 a 100).
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Vi em um retweet da @KariLimaX um post na comunidade de wpp “Jair Bolsonaro” sobre “o verdadeiro causador” das mudanças climáticas. Fui lá ver o post e assistir o vídeo. E vamos lá, acho bom desmentir isso pra evitar que outras pessoas caiam nessa narrativa 👇🧵
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O vídeo é de um cara (sei lá quem é) falando que quem está por trás das mudanças climáticas são os vulcões, e os humanos jamais seriam capazes de se comparar a essa força da natureza.
Logo no início ele diz que 1 vulcão emite mais CO2 do que toda a humanidade em 1 ano. Será?
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Essa daí é antiga, mas vamos lá. O mundo todo emitiu em 2022 um pouco mais de 37 bilhões de toneladas de CO2. Desde 2001 as emissões sempre estiveram acima de 25 bilhões de toneladas.
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Quando a gente vai comparar coisas, a gente frequentemente fala de médias. "Em média as pessoas de X são mais ricas que de Y. Por isso Y é melhor que X".
Comparar coisas dessa forma é um grande problema, na minha opinião. As médias trazem um problema com elas. Explico 🧵👇
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Para ilustrar esse problema, vamos supor dois países, 1 e 2. Imagine que nosso interesse é descobrir em qual país as pessoas são mais ricas.
Geralmente, para debater isso as pessoas vão recorrer à média de renda dos países. O que parece ser uma boa métrica, certo?
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Só que é claro que a renda na moeda local de cada país não vai ser uma boa métrica. Para tentar fazer a comparação mais justa, usamos alguma moeda fictícia que inclui a inflação e o custo de vida dos dois países. Vou chamar essa moeda de *moeda internacional"
1/16
O mundo já esteve mais quente no passado recente? "Porque nos preocupamos com o aquecimento global atual, quando na era medieval a temperatura era maior?"
Bem, na verdade não era. Vamos explorar um pouco a respeito do Período Quente Medieval.
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Em um fio no passado eu já cobri o argumento de que o sol é o causador das mudanças de temperatura, e o porque esse argumento não é verdade:
Agora vamos olhar para o argumento a respeito do período quente medieval.
1/4 A primeira vista, parece que aqui só tem um monte de círculos em cima de círculos com ponteiros de movendo de forma caótica e desordenada…
Mas o segundo tweet mostra o que eles de fato estão fazendo 👇
2/4 O que parece ser totalmente desordenado e caótico, na verdade é algo extremamente organizado.
O que está acontecendo é uma visualização da série de Fourier complexa. Neste caso eu usei ela para desenhar a imagem de um alce.
A série de Fourier é uma forma de se decompor +
3/4 Um sinal em uma soma de oscilações em frequências e amplitudes diferentes. Nesse caso, a frequência é a velocidade de rotação de cada ponteiro, e a amplitude é o tamanho dele.
Aqui eu usei uma expansão de 121 frequências para desenhar uma folha de monstera.
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Hoje vi um vídeo onde um cara questionava o fato de não existir nenhum experimento que prove a atração entre massas.
E apesar do cara estar enganado, medir a força gravitacional entre duas massas é uma tarefa de fato extremamente complicada. Mas foi feita já em 1797...🧵👇
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Quando Newton formulou a descrição da gravidade no Principia, ele já propôs uma forma de se medir a constante da gravitação universal (G). Que determina a intensidade da força de atração gravitacional entre massas.
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A ideia do Newton era medir o desvio de um pêndulo perto de um morro grande. A atração gravitacional da massa do morro iria gerar um pequeno desvio na oscilação do pêndulo.
Acontece que o próprio Newton achava que o efeito seria tão pequeno, que não seria mensurável