Will, 22 anos, trabalhador de uma loja de conserto de celulares, pai de duas filhas, que retornava do aniversário de sua mãe e morava na Ocupação Valdice Teles, no Santa Maria em Aracaju foi executado pela PM numa "operação" antidrogas
Isso é um fio ⬇️
A ocupação Valdice Teles é organizada pelo @mtst no Bairro Santa Maria e Will era uma de suas lideranças
A ocupação tem hoje 350 famílias e existe um processo de Reintegração de Posse suspenso, a região passa por processo de gentrificação
Na noite da última terça, 15/03, Will retornava da comemoração do aniversário de sua mãe e para seu azar cruzou com a PM que invadia o local já efetuando disparos de arma de fogo a ermo, tendo atingido Will este vai ao chão.
Moradores da ocupação que testemunharam a ação dizem que Will implorou pela vida antes do tiro fatal.
Não sei se vocês frequentam ocupações populares mas lá o vínculo comunitário é algo inexplicável e se confunde com o próprio instinto de sobrevivência dessas famílias
Diante da violência, ninguém se escondeu
Badá, líder comunitário, começou a gritar para pararem, pegou sua câmera pro e celular e passou a filmar a ação antes que mais fossem atingidos e assim fizeram outras pessoas começaram a filmar
A PM passa a agredir fisicamente
Mulheres tomam tapas na cara, celulares são confiscados...
Badá vai ao chão com um PM, outros vão em cima e passam a espanca-lo
Os moradores se desesperam "vocês vão matar ele"
4 são mais efetivos para impedir a ação da PM jogam seus corpos na frente, questionam a PM
Esses 4 vão presos por crime de desacato.
Corta para narradora: Enquanto tudo isso acontece está no conforto do seu lar
Colocou sua criança pra dormir em seu quarto com ar condicionado
Está rindo comentando BBB com seus amigos no celular
Resolve dormir cedo.
Por volta das 22h20 telefone toca e acorda desorientada
Mensagem de áudio: Qualquer pessoa venha pra Delegacia invadiram a Valdice Teles, uma pessoa foi ferida e levada num lençol, pessoas presas...
Não consegui raciocinar. "Ok tô indo"
Qdo eu chego na Delegacia a ficha caiu
Badá (que já conhecia como o líder que é) no chão algemado gemendo rasgado e sujo
Me contaram que PM pisou no pescoço dele e fez ele comer areia
Apanhou tanto que se cagou
Luciana presa, esta minha amiga, resenhamos juntas aqui em casa
Diego, um jovem negro calmo de olhar cansado
Priscila, uma jovem linda de cabelos rosa em pé de braços cruzados
Nenhum advogado teve acesso aos presos na Delegacia
PM transitam livremente e prestam suas declarações
Badá passa mal, muito mal.
Não foi dado atendimento médico antes de apresentá-lo a autoridade policial.
Pergunto a minha amiga que foi a 1a a atender o chamado.
Quem foi atingido?
Ela "Foi Will"
Meus olhos enchem de lágrimas. A imagem de Will me vem a mente... nos atos sempre prestativo
Muitas vezes acompanhados de Carol, outra companheira do MTST.
O que mais me marca é a lembrança de alguém dizendo no meio dos atos #ForaBolsonaro "Cadê Will?"
Isso ecoa forte agora...
Liberaram Badá pra atendimento médico
Iza vai na viatura com ele, eu vou no carro atrás, seguimos pra UPA
Badá muito debilitado não foi aceito naquela unidade
"Levem pro HUSE"
Iza me pede pra ir com ele na viatura, sussurra veja como eles são ...
Entrei na viatura da PM. O cheiro de Badá de suor e fezes, ainda me assombra, seguro ele com força. Ele tá com muita dor e o PM anda em alta velocidade fazendo manobras bruscas sem se importar
O motorista liga o Rádio, passa a cantar um sertanejo, completamente indolor a minha dor e a dor de Badá, sinceramente acho que ele nem percebe o qto está sendo inadequado.
Chegamos no HUSE, Badá foi prontamente atendido, fico no acompanhamento dele até a alta.
Retornamos a Delegacia. Todos os presos liberados, a imputação é de desacato (crime de JeCrim)
Dois moradores e duas moradoras da ocupação foram detidos sob a acusação de desacato (art. 331 do Código Penal) deixando a mensagem aos que tem sua casa invadida, a vida dos seus vizinhos e amigos vilipendiadas que aos pobres não é garantido, nem mesmo, o direito de questionar.
O silenciamento vem na forma da criminalização de sua conduta, qualquer interpelação é vista como ato de afronta a autoridade.
Mesmo diante de uma pessoa sofrendo espancamento pelos policiais.
Mais um jovem negro jaz morto por violência policial, seu nome é Will e sua mãe nunca mais abraçará seu filho no seu aniversário nem mesmo haverá mais aniversário
Sua esposa pede Justiça pq Will não tem nem mesmo direito a memória.
As autoridades que ceifaram sua vida dizem que ele era "Chefe do Tráfico" e que portava arma
Um enredo já conhecido. Como se isso justificasse uma ação de execução sumária
O discurso da PM denota que parcela da sociedade acha isso aceitável né? - Se for traficante pode matar
E assim se segue a matar trabalhadores em ações desproporcionais, sem que esses agentes entendam que a vida não é GTA e aquelas pessoas que sucumbem a seus tiros são reais
Ontem houve ato em apoio a família de Will após o velório.
Várias entidades de direitos humanos presentes, movimentos sociais, agentes públicos, Defensoria se fez presente também.
Espero que os fatos sem apurados da maneira devida e os responsáveis responsabilizados.
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A minha trajetória profissional tem momentos muito lindos e hoje eu acrescento mais um: Estou recebendo diversos cumprimentos e mensagens de solidariedade de Policiais Militares pela minha atuação.
Nunca abri mão de dialogar com os policiais, sempre me refiro a eles respeitosamente como trabalhadores da segurança pública e hoje após falar na televisão veementemente contra a atuação da PM no caso da Valdice Teles em vez de ataques, recebi carinho.
Que alegria saber que minha mensagem não é entendida como animosidade contra os trabalhadores, mas contra a política de Estado que precipita a todos para o matar ou morrer.
A polícia que mais mata é também a que mais morre.