Pensar a História Profile picture
Aug 22 27 tweets 10 min read Twitter logo Read on Twitter
Há 232 anos, em 22/08/1791, negros escravizados e libertos iniciavam uma grande rebelião contra o domínio colonial francês em São Domingos, dando início à Revolução Haitiana. A insurreição resultou na independência do Haiti — primeiro país das Américas a abolir a escravidão

1/27 Image
A colonização do atual território do Haiti teve início em 1492, quando os espanhóis reivindicaram a posse da Ilha de São Domingos. Em 1697, com a assinatura do Tratado de Rijswijk, a Espanha cedeu para a França o domínio sobre a porção ocidental da ilha.

2/27 Image
Após exterminarem quase toda população nativa, os europeus começaram a levar africanos para serem usados como mão de obra escrava nas plantações. A principal atividade econômica no Haiti era a produção de açúcar, uma das mercadorias mais valorizadas no mercado internacional

3/27 Image
O Haiti logo se tornou a mais rentável da colônias francesas, produzindo 45% de todo o açúcar consumido no mundo — fato que lhe rendeu a alcunha de "Pérola das Antilhas". Mas essa abundância beneficiava apenas a metrópole europeia e uma minúscula elite de colonizadores.

4/27 Image
Os africanos escravizados, que compunham mais de 80% da população do Haiti, eram submetidos a um tratamento perverso e a uma exploração brutal, o que se refletia na alta taxa de letalidade — uma das maiores do continente.

5/27 Image
Entre escravagistas e escravizados, encontrava-se a chamada "elite crioula" — uma classe de negros e mestiços livres que prestavam serviços aos colonizadores ou que haviam prosperado através do comércio.

6/27 Image
A luta dos negros contra o sistema escravagista desembocou em uma série de revoltas ao longo do século XVIII, todas violentamente reprimidas. Fugindo da opressão nas fazendas, os negros fundaram as "aldeias maroons", ou palenques, semelhantes aos quilombos do Brasil.

7/27 Image
Esses agrupamentos se tornaram importantes focos de articulação da resistência e engendraram a ascensão de revolucionários como François Mackandal, guerreiro maroon que liderou uma grande sublevação de escravizados e que foi queimado vivo pelos franceses em 1758.

8/27 Image
A eclosão da Revolução Francesa em 1789 inflamou ainda mais a luta antiescravagista no Haiti. Após tomaram conhecimento da aprovação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, mestiços livres defenderam que a colônia deveria adotar os mesmos princípios iluministas.

9/27 Image
A sugestão foi negada e desestimulada com o uso da violência. "Não trouxemos meio milhão de escravos da costa da África para transformá-los em cidadãos franceses", declarou o presidente da assembleia colonial. Mas a virulência dos colonizadores não intimidou os haitianos.

10/27 Image
Justificando estar respaldado pela Declaração dos Direitos Humanos, Vincent Ogé, um mestiço livre, formou uma milícia e iniciou uma revolta em Cap-Français. Ogé foi preso, torturado e assassinado em fevereiro de 1791, mas a semente da insurreição já começara a germinar.

11/27 Image
Em 14 de agosto do mesmo ano, o sacerdote vodu Dutty Boukman convocou os cativos das plantações para uma grande cerimônia em Bois Caïman e profetizou o início de um levante dos escravizados. Inflamados pela pregação, os haitianos começaram a se preparar para a insurreição.

12/27 Image
Em 22/08/1791, sob a liderança de Jeannot Bullet, Jean-François Papillon e Georges Biassou, negros escravizados e libertos iniciaram uma gigantesca rebelião, incendiando fazendas, destruindo engenhos e tomando as instalações da administração colonial.

13/27 Image
A adesão foi massiva e em pouco tempo os rebeldes já tinham o controle das províncias ao norte do Haiti. Em 1792, um terço da colônia já estava sob domínio dos revolucionários.
Os franceses elaboraram então uma estratégia para tentar conter e dividir o movimento.

14/27 Image
A Assembleia Francesa propôs que as liberdades e direitos civis assegurados aos cidadãos franceses fossem estendidos para todos os negros e mestiços livres da colônia — excluindo, contudo, os escravizados. Os revolucionários recusaram a proposta.

15/27 Image
A rebelião atraiu a cobiça da Inglaterra e da Espanha, que, tentadas pela fertilidade das terras haitianas, despacharam tropas na esperança de tomar a ilha. Mas os rebeldes sabiam que continuariam sendo escravizados com a eventual troca do poder colonial.

16/27 Image
Toussaint Louverture, filho de escravizados que se tornara líder dos revolucionários, procurou os franceses para fazer um acordo. Prometeu que ajudaria a expulsar as tropas britânicas e espanholas, contanto que os franceses se comprometessem a abolir a escravidão no Haiti.

17/27 Image
O líder jacobino Léger-Félicité Sonthonax concordou com a condição. As tropas de Louverture conseguiram expulsar os ingleses e espanhóis e Sonthonax manteve sua palavra. Assim, em 1794, o Haiti se tornou o primeiro território das Américas a abolir a escravidão.

18/27 Image
Louverture lideraria outra expedição rumo aos domínios espanhóis na Ilha de São Domingos, libertando os escravizados no território da atual República Dominicana.
O acordo com os franceses, todavia, seria anulado durante o período do Diretório.

19/27 Image
Em 1799, Napoleão Bonaparte ascendeu ao poder na França com um golpe de Estado e reverteu a abolição da escravatura, além de ordenar a prisão de Toussaint Louverture.
Os haitianos se recusaram a retornar ao status de escravizados.

20/27 Image
Sob a liderança de Jean-Jacques Dessalines, Alexandre Pétion e Henri Christophe, os revolucionários organizaram uma aguerrida resistência e expulsaram os colonizadores. As tropas francesas foram definitivamente derrotadas na Batalha de Vertières, em novembro de 1803.

21/27 Image
Em 01/01/1804, Dessalines declarou a independência do Haiti. Surgia assim o primeiro Estado independente do Caribe e da América Latina, a primeira república negra do mundo e o único país da história a se tornar independente por meio de uma rebelião de escravizados.

22/27 Image
A Revolução Haitiana teve enorme impacto, desafiando os fundamentos da escravidão e as estruturas do sistema colonial. A insurreição influenciou diversos movimentos pela liberdade e inspirou outros levantes de escravizados, incluindo a Revolta dos Malês no Brasil.

23/27 Image
Os haitianos, entretanto, pagaram um preço alto por buscarem a liberdade — mais elevado do que os milhões de francos repassados à França ao longo de 80 anos como "indenização".
A nação de negros livres causava espanto e medo em um continente dominado pela escravidão.

24/27 Image
O país foi isolado diplomaticamente e sofreu um severo boicote econômico. Receoso da influência subversiva que o Haiti poderia exercer sobre os escravizados, o presidente dos Estados Unidos, Thomas Jefferson, recusou-se a reconhecer a independência da nação caribenha.

25/27 Image
O Congresso dos Estados Unidos proibiu o comércio com a ilha e determinou a criação de um embargo econômico contra o Haiti que durou quase um século. Ao término do embargo, o Haiti ainda sofreria uma prolongada ocupação militar comandada pelo exército estadunidense.

26/27 Image
As sucessivas intervenções, boicotes e sanções insuflaram a instabilidade política e agravaram os problemas socioeconômicos do país, levando o Haiti a se tornar uma das nações mais pobres das Américas.

27/27 Image

• • •

Missing some Tweet in this thread? You can try to force a refresh
 

Keep Current with Pensar a História

Pensar a História Profile picture

Stay in touch and get notified when new unrolls are available from this author!

Read all threads

This Thread may be Removed Anytime!

PDF

Twitter may remove this content at anytime! Save it as PDF for later use!

Try unrolling a thread yourself!

how to unroll video
  1. Follow @ThreadReaderApp to mention us!

  2. From a Twitter thread mention us with a keyword "unroll"
@threadreaderapp unroll

Practice here first or read more on our help page!

More from @historia_pensar

Aug 21
"O Anjo Caído", pintado em 1847 pelo francês Alexandre Cabanel. A obra é uma das mais conhecidas representações de Lúcifer na história da arte, notabilizando-se pelo olhar expressivo e pela humanização do controverso personagem.

1/25 Image
Alexandre Cabanel tinha 24 anos de idade quando pintou "O Anjo Caído". O jovem era então um dos talentos mais promissores da Escola de Belas Artes de Paris, produzindo obras de grande beleza e refinamento, estritamente conformadas aos cânones do neoclassicismo acadêmico.

2/25 Image
Em 1844, Cabanel expôs no Salon de Paris e atraiu a admiração do público. O sucesso alimentou a pretensão de conquistar o Prix de Roma — prestigioso concurso promovido pela Academia de Belas Artes da França, que premiava o vencedor com uma bolsa de estudo em Roma.

3/25 Image
Read 25 tweets
Aug 17
Isso era Cracolândia no governo Haddad. Essas pessoas são ex-dependentes químicos, que recebiam tratamento médico, casa, comida e emprego pelo programa De Braços Abertos, que reduziu em 2/3 o nº de frequentadores da Cracolândia. Chamaram de "bolsa crack" e acabaram com o programa Image
2015, governo Haddad. Image
Image
Read 4 tweets
Aug 17
O Brasil perdeu nesta terça-feira a atriz Léa Garcia. Referência da luta antirracista, Léa Garcia militou por décadas em prol da igualdade de oportunidades na dramaturgia nacional. Destacou-se igualmente por seu enorme talento e por sua expressividade cênica singular.

1/25 Image
Léa Garcia nasceu no Rio de Janeiro em 11 de março de 1933, filha de Stela e José dos Santos Garcia. Manifestou na adolescência o interesse pela arte, sobretudo pela poesia, dedicando-se a ler obras de Cruz e Sousa e Langston Hughes.

2/25 Image
Órfã de mãe aos 11 anos, Léa passou a viver com a avó materna, Dona Constança, que trabalhava como governanta de uma família abastada de Copacabana. Convivendo em meio à elite carioca, a jovem foi alvo de manifestações de racismo e discriminação social.

3/25 Image
Read 25 tweets
Aug 15
Há 90 anos, em 15 de agosto de 1933, nascia o metalúrgico e sindicalista Virgílio Gomes da Silva. Integrante da luta armada contra a ditadura militar, Virgílio foi primeiro brasileiro a desaparecer nos porões do regime após a promulgação do AI-5.

1/23 Image
Virgílio Gomes da Silva nasceu em Sítio Novo, no interior do Rio Grande do Norte. Ainda criança, mudou-se com a família para o Pará, onde seus pais trabalharam nos seringais pertencentes à companhia estadunidense Ford.

2/23 Image
Aos 11 anos, retornou à sua cidade natal com a mãe e dois irmãos, passando a viver da agricultura de subsistência em um pequeno lote de terra. O pai permaneceria no Pará com uma de suas irmãs.

3/23 Image
Read 23 tweets
Aug 12
Há 40 anos, em 12 de agosto de 1983, a líder sindical Margarida Alves era assassinada a tiros na porta de sua casa em Alagoa Grande, na Paraíba. Margarida Alves se destacou por sua luta em prol dos direitos dos trabalhadores rurais durante a ditadura militar.

1/25 Image
Margarida foi a primeira mulher a presidir o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande, por meio do qual moveu mais de 600 ações contra latifundiários. É a inspiradora da Marcha das Margaridas, principal manifestação das trabalhadoras rurais do Brasil

2/25 Image
Margarida Alves nasceu em 05/08/1933 em Alagoa Grande, interior da Paraíba. Era a caçula dos 9 filhos de Manoel Lourenço Alves e Alexandrina Inácia da Conceição, casal de lavradores. Margarida começou a trabalhar aos 8 anos de idade, o que a impediu de frequentar a escola.

3/25 Image
Read 25 tweets
Aug 11
Lee Merlin, a Miss Bomba Atômica, posando para foto no Deserto de Mojave. Nevada, Estados Unidos, 1957. As "pin-ups atômicas" estão entre as mais inusitadas iniciativas de glamourização das armas nucleares promovidas pelos Estados Unidos desde o fim dos anos 40.

1/16 Image
Único país da história a utilizar armas nucleares contra alvos civis, os Estados Unidos embarcaram em um verdadeiro "frenesi atômico" após efetuarem os bombardeios que mataram mais de 250 mil pessoas em Hiroshima e Nagasaki.

2/16 Image
A gigantesca capacidade destrutiva das armas nucleares e o potencial da nova tecnologia para alterar o curso da história despertaram assombro, curiosidade e fascínio.

3/16 Image
Read 16 tweets

Did Thread Reader help you today?

Support us! We are indie developers!


This site is made by just two indie developers on a laptop doing marketing, support and development! Read more about the story.

Become a Premium Member ($3/month or $30/year) and get exclusive features!

Become Premium

Don't want to be a Premium member but still want to support us?

Make a small donation by buying us coffee ($5) or help with server cost ($10)

Donate via Paypal

Or Donate anonymously using crypto!

Ethereum

0xfe58350B80634f60Fa6Dc149a72b4DFbc17D341E copy

Bitcoin

3ATGMxNzCUFzxpMCHL5sWSt4DVtS8UqXpi copy

Thank you for your support!

Follow Us on Twitter!

:(