Sobre as conversas dos assessores do Ministro @alexandre: a montanha pariu um rato. Mas ratos são pestilentos. Segue o fio.
1. A Justiça Eleitoral é particular em diversos aspectos. Um deles é que os juízes têm expressivo poder de polícia (cf. art. 41 da Lei Eleitoral, p. ex.).
O que isso quer dizer, na prática? No exercício de poder polícia o juíz não precisa ser provocado pelas partes; ele/ela pode tomar providências, ativamente.
2. A forma de elementos “entrarem nos autos” depende fundamentalmente da natureza desses elementos. A quebra de sigilo bancário depende de autorização judicial; a de documentos, em regra, de provocação das partes. E informações públicas, como posts de jornalistas?
Depende; em contexto puramente judicial, por atividade das partes. Em contexto de poder de polícia, como fruto de comunicação de qq um, inclusive do juízo.
3. Assim, AM encaminhar conteúdo que ele recebeu, no contexto do poder de polícia, não tem nenhuma irregularidade.
4. Bem verdade que a formalização dessa entrada nos autos diz, genericamente, que a informação chegou “pelos canais do TSE”, ou algo do gênero. Uma meia verdade.
É uma irregularidade, mas não é ato ilícito. Se ele poderia determinar a juntada de maneira direta, então não houve bypass ao poder de juntar a “disfarçada” via texto genérico. Não foi o modo mais transparente, mas não se deu a partir de abuso do poder (de juntar).
E, na medida em que não houve alteração de “fato juridicamente relevante”, não faz sentido falar em falsidade ideológica.
5. Diferente da Lava Jato, trata-se de poder de polícia, e não de exercício judicial puro; trata-se de comunicação entre servidores do Judiciário, e não de partes; as informações não foram produzidas com violação de direito, porém estavam públicas.
6. Provavelmente, as informações vazadas foram obtidas ilegalmente. Se não por acesso de tipo hackeamento, por violação ao dever de sigilo, ou acesso indevido.
Tal qual na Spoofing, não pode gerar repercussão jurídica CONTRA os implicados.
Ao contrário do que alguns afirmam, ninguém foi juridicamente responsabilizado pelas informações o todas na Spoofing. Mas o uso delas na anulação dos casos do Lula?
Evidente que (1) foi usada em favor de um investigado em processo penal, o que é possível mesmo quando a prova é ilícita; e (2) anulação por imparcialidade não é punição do juiz, porém garantia do acusado.
7. A montanha pariu um rato, no plano jurídico. Mas o rato é pestilento, no plano político. Sem atentar a todos os vetores jurídicos acima, haverá a busca por igualar Alexandre a Moro e, assim, Bolsonaro a Lula.
8. Não houve abuso por parte da imprensa, no vazamento. É legítimo. Deve, porém, encarar com maturidade as consequências dessa decisão jornalística: energizar a extrema-direita em tema que, no mérito, é pífio.
É absolutamente previsível o uso desse episódio mesclado a desinformação. Se se tratasse de ilegalidade, estaria 100% de acordo; nesse caso, honestamente, só consigo compreender como temerário.
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Meus pitacos sobre a censura a entrevistas dadas por investigados.
Há 6 anos, publiquei texto na Folha criticando a cassação arbitrária pelo Min. Fux de decisão do então Min. Lewandowski, que autorizava Lula, naquela ocasião preso em Curitiba, a dar entrevistas.
Presos os mandantes do homicídio de Marielle e de Anderson, li no @X alguém dizendo que a vereadora salvaria o Rio de Janeiro postumamente. Ledo engano.
Os fatos implicavam, direta ou indiretamente, todos os poderes estaduais do Rio de Janeiro. Colocava a Polícia Civil em xeque, em especial a divisão de homicídios.
As propostas de "segurança pública" elaboradas pelos Governadores são o puro suco do direito penal (e p penal) simbólico. Típico de anos pares. Segue o fio.
Como é comum no tema de "segurança pública", apela-se ao pânico moral (a eterna emergência de Moccia e Ferrajoli), fazendo sugerir que situações desenhadas como graves sejam corriqueiras.
1. Mudar audiência de custódia por causa de "crimes graves" e quando "há reincidência". Subtexto: pessoas perigosas são soltas nas audiências de custódia. Realidade: raramente não se converte em preventiva preso por crime grave, sobretudo reincidente.
O eterno falso debate das saídas temporárias de presos. Uma abordagem pragmática. Segue o fio.
Algumas informações iniciais importantes. A Constituição veda pena de morte e prisão perpétua. São cláusulas pétreas, ou seja, não podem ser mudadas. Assim, todo preso que não morrer no sistema penitenciário um dia voltará à vida comunitária.
Por que o Estado pode prender alguém? A Constituição não fala nada, mas o Código Penal, sim: para a) reprovação do crime (componente retributivo, de castigo); e b) prevenção. Além disso, a Lei de Execução Penal adiciona um terceiro vetor: c) (re)integração na sociedade extramuros.
A versão de Bolsonaro sobre a minuta resolve a questão? Segue o fio (spoiler: penso que não).
Em discurso ontem, Bolsonaro afirma que o decreto era de estado de sítio, figura prevista na Constituição. Logo, não era golpe. A premissa está correta (existe tal figura na CF); a conclusão, não.
Peço ajuda aos constitucionalistas (@wallacecorbo @elomachado1 @RMafei @conradohubner @davidsobreirabm), mas o estado de sítio é, segundo o art. 137 uma alternativa a um estado de defesa mal sucedido (salvo nos casos de guerra, que não é o caso).