Eu acho muito engraçado esse discurso "a esquerda só sabe apontar culpados" porque vem justamente dos culpados, né? Essa galera acha que agora a gente precisa esquecer as diferenças, passar uma borracha e seguir em frente. Mas não é bem assim. Saber se vamos livrar de Bolsonaro não é tão importante quanto saber COMO vamos nos livrar do Bolsonaro. Porque se for pra se livrar do Bolsonaro sem que o pessoal que sustentoou esse discurso antiesquerdista patológico que elegeu Bolsonaro mude a conduta, não vai adiantar nada.

Toda vez que eu vejo essa maneira imbecil como usam lugar de fala em rede social eu lembro de uma entrevista do Eduardo Coutinho:
“Tem um monte de filmes que se aproximam do outro. Quem é o outro? O outro é o pobre miserável. O cara com defeito físico, o destituído tal, tal." "E quem filma geralmente é uma pessoa classe média, mesmo que com origem proletária. E tem mania, americano adora isso, de tratar de forma paternalista. E daí o povo adora e chora e sente culpa. Isso é coisa que eu me recuso a fazer. Isso é uma coisa proibida em meu dicionário."

Bolsonarismo se reduz a guerra de narrativa. Dentro do quadro da pandemia, pra eles que importa é como fica a narrativa. Esse papo de "coronavírus é culpa do governo chinês" é pelo fato da pandemia no Brasil ter exposto a fragilidade e incompetência do governo Bolsonaro. Como o principal problema do corona pro bolsonarismo (e pro parabolsonarismo e criptobolsonarismo) não é o perigo para o povo mas o quanto o vírus prejudica a narrativa da direita, precisam criar uma contranarrativa ligando o vírus à esquerda.

Nesse papo aí da manchete, vejo duas posições equivocadas: uma, que é a de achar que a imprensa mente sempre e outra (mais do jornalismo corporativista) que acha que a imprensa é sempre técnica e que os interesses do dono do jornal nunca se sobrepõem à técnica jornalística. A primeira está errada porque boa parte dos escândalos recentes de lado a lado vieram à tona pela imprensa. A segunda está errada porque não entende (ou finge não entender) que não importa apenas o que se mostra, mas como se mostra (jornalismo é enfase).

Na época das manifestações do impeachment quando se apontava "tem gente aí no meio pedindo tortura e ditadura" respondiam "uma minoria, etc.". Aí, foi eleito quem pra presidência? Isso mesmo: o cara falando justamente em Ulstra, ditadura, tortura, matar e prender esquerdista. Apontamos o discurso autoritário e perigoso do cara e os espertões falaram "Ah, histeria, gente, é só ARROUBO RETÓRICO" Aí o cara aparelha PGR, PF, IBGE, ICMBio, Inpe, Ancine e o pessoal "Calma, gente, ele vai entrar na linha. Nossa, vocês são muito histéricos"

Sabem o que é mais interessante nessa situação toda? É que ela IMPLODE de uma vez por todas essa ilusão de que dá pra resolver problema sérios com frase de efeito e empáfia ideológica. Ao ostentar deprezo pela ciência e pelos dados trazidos pelos órgãos com respeitabilidade reconhecida em nome da narrativa, Bolsonaro perdeu justamente o controle da narrativa, pois trata-se de um problema concreto que não se resolve por outro caminho que não o técnico-científico

Imprensa falando em "arroubos retóricos" do Bolsonaro. Quem está no cargo mais poderoso do país não tem arroubo retórico, tudo que ele fala tem consequências práticas, concretas e imediatas. Ele tem poder militar, dinheiro público e é uma liderança política. Quando ele fala NUNCA pode ser encarado como arroubo político, sempre como um ato de ESTADO.

Agora os minions tão igual uma mãezinha superprotetora"Ain, vocês estão torcendo contra, vocês criticam o presidente demais" Eu acho muito fascinante essa galera que acha que a única atitude possível em relação a seu político de estimação é levar ouro, incenso e mirra Essa galera (que, aliás, era a mesma que reclamava de petista idolatrar político, de ter corrupto de estimação) acha que o Brasil inteiro tem que se comportar como assessoria de comunicação do presidente em vez de cobrar e colocar a botina na goela dele pra ele trabalhar direito