A arqueologia brasileira e os Sambaquis:
Sambaquis categorizam sítios arqueológicos pré-coloniais compostos pelo acúmulo, sobreposição e descarte de muitas camadas de material orgânico e calcário, principalmente conchas de moluscos, que formam estruturas em forma de montes.
São geralmente compostos por camadas de conchas, em meio as quais estão restos materiais e esqueletos que passaram por fossilização química já que a chuva deforma as estruturas das conchas e dos ossos, difundindo o cálcio pela estrutura e petrificando os detritos e ossadas.
Mais de mil sambaquis estão inclusos no registro nacional de sítios arqueológicos e são um dos sítios mais antigos do litoral brasileiro, representando uma ocupação humana que se iniciou há pelo menos 8.000 anos.
A maioria deles, no entanto, são datados entre 4.000 e 2.000 anos.
Em território brasileiro, os sambaquis estão distribuídos ao longo de toda a faixa litorânea, desde o Rio Grande do Sul ao Amapá, embora os estudos estejam concentrados no sul e sudeste e localizados junto a corpos d’água como lagoas, mangues, marismas e às costas do Atlântico.
Em algumas regiões como Amazônia, São Paulo e o norte de Santa Catarina, existem também sambaquis localizados próximos aos rios, chamados sambaquis fluviais.
Em ecótonos, a mistura de água salgada e doce apóia a vegetação de mangue e a abundância de mariscos, peixes e pássaros.
Embora os sambaquis sejam de escala variável, enormes montículos de conchas são característicos da costa sul do Brasil, principalmente na região de Santa Catarina, onde chegam a atingir mais de 30 metros de altura, sendo nestes casos considerados sambaquis monumentais.
Os maiores montes normalmente tem estratigrafia horizontal e complexa, incluindo sequências alternadas de depósitos de conchas, camadas mais estreitas e escuras de carvão e osso queimado que marcam superfícies de ocupação e grupos de sepulturas e lareiras.
A maioria dos povos sambaquieiros eram sedentários e se encaixam no que chamamos de “culturas marítimas”, possivelmente moravam em palafitas, dominavam técnicas de navegação, pesca e caça, produziam ferramentas e artefatos e desenvolviam suas atividades de maneira coletiva.
Uma características notórias dos grupos sambaquieiros é a importância do contexto funerário, notável pelos vestígios de sepultamentos, já que grande quantidade de esqueletos foram encontrados no interior de sambaquis, assim como artefatos e outros acompanhamentos funerários.
Os estudos funerários em sambaquis nos revelam aspectos culturais ligados a morte, ao cerimonial e à prática de sepultar o morto, também trazem informações a respeito da sociedade a qual o morto pertencia e entendimentos a respeito da cosmologia, ritos e cerimônias destes grupos.
Associados a esses contextos e ritos estão os “banquetes funerários”, tais cerimônias mortuárias consistiam no consumo prolífico de animais e o descarte como oferendas ao redor de ‘túmulos’ individuais e/ou em toda uma área funerária, durante ou em visitas após o sepultamento.
Ainda no contexto funerário estão zoólitos encontrados em sítios sambaquis que evocam um significado iconográfico e simbólico incluindo efígies de espécies como baleias, golfinhos, tubarões, pinguins, morcegos, felinos, águias, aves e peixes variados e, ocasionalmente, humanos.
Esses artefatos poderiam ter representado entidades pertencentes simultaneamente aos mundos material e espiritual, os zoólitos também podem representar ancestrais fundadores, heróis da cultura, ou mesmo divindades de uma cosmologia compartilhada entre os povos sambaqueiros.
No contexto arqueológico, os padrões de sambaquis funerários e o estilo padronizado dos artefatos associados a eles é compatível com o surgimento de uma ideologia pan-regional e sugere uma expressão cultural unificada ao longo de toda a costa sul.
O cerimonialismo envolvendo redes de grupos de afinidade, também se encaixa nessa interpretação já que enormes montículos eram marcos inequívocos, visíveis a longas distâncias tornando-os uma presença constante nas comunidades circunvizinhas e reafirmando direitos territoriais.
Monumentos funerários codificavam um sistema simbólico compartilhado por essas comunidades pesqueiras em todo o antigo litoral brasileiro e sua construção incorporou as bases ideológicas das sociedades que duraram por milênios.
A longa permanência dos sambaquieiros se interrompeu com a chegada de populações vindas de longe, os Tupis, oriundos da Amazônia, que avançaram por quase toda a extensão do atual território brasileiro até chegar ao litoral onde eventualmente se colidiram.
Os registros arqueológicos e a análise dos esqueletos de populações sambaquieiras demonstram que não era comum embates e confrontos nessas sociedades, ao contrário dos Tupis, que eram uma nação guerreira, o que facilitou o processo de expansão e incorporação dessa sociedade.
De qualquer forma, os sambaquieiros foram grupos complexos, com cultura material diversa, e que, apesar do conhecimento atual acerca desses povos e dos sambaquis, ainda há muito a se descobrir sobre os grupos que ocuparam o antigo litoral brasileiro.
Arte: Mariana Massarani.
Fontes:
edisciplinas.usp.br/pluginfile.php…
researchgate.net/publication/33…
teses.usp.br/teses/disponiv…
google.com.br/amp/s/arqueolo…
researchgate.net/publication/28…
“Uma História Antes do Brasil" é um jogo desenvolvido por pesquisadores do grupo ARISE, membros da USP e da Unisul-SC, com o intuito de levar ao conhecimento do público a importância dos Sambaquis.
Você pode fazer o download do jogo através desse link:
arise.mae.usp.br/sambaquis/
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