Rudá Ricci Profile picture
Sociólogo, trabalho com educação e gestão participativa. Presido o Instituto Cultiva

Jan 4, 2022, 25 tweets

Boa tarde. Vou postar o roteiro - ou argumentação-base - e as principais teses do livro que estou escrevendo para a Editora Kotter, cujo tema é a ascensão da extrema-direita no Brasil. Vamos lá:

1) Começo pela distinção entre DIREITA e EXTREMA-DIREITA. DIREITA é um ideário político que sustenta que a humanidade possui diferenças individuais naturais, como inteligência, esforço e obstinação, que levaria à desigualdade social. Propõe a liberdade individual como padrão

2) Já Extrema-direita é o ideário político que refuta qualquer outra força política contrária ao seu projeto através da ameaça ou uso da força para coibi-la.

3) Uma segunda distinção importante é entre NAZISMO e FASCISMO. Nazismo é uma ideologia exclusivista e excludente. Impermeável, seu foco é a eliminação do outro e autoafirmação racial.

4) FASCISMO é a ideologia cambiante focada na coação social. Permeável, agrega outros elementos culturais que reforçam o discurso totalitário (mobilização social + exclusão de divergência política)

5) Como se percebe, a extrema-direita brasileira está mais para o fascismo, mais bonachona e permeável, embora tão perigosa quanto qualquer extrema-direita.

6) A tese central do livro é que a extrema-direita se formou a partir de três ondas que se sobrepuseram. A primeira onda foi promovida pelas articulações empresariais. Tudo começou com a organização da intervenção política na Assembleia Nacional Constituinte

7) Na década de 1990, os empresários transitaram da proposta de “Estado Mínimo” para organização de agenda estatal, ou seja, a disputa do Estado brasileiro. As figuras principais neste momento foram: Paulo Rabello de Castro e Jorge Gerdau.

8) Entre 2000 a 2015 houve financiamento empresarial de organizações juvenis ultraliberais que se articularam com think tanks estrangeiras e Institutos Liberais para promoverem ações pró-impeachment de Dilma Rousseff e ataques à institucionalidade democrática.

9) Esta é a etapa de radicalização do ativismo empresarial brasileiro, em especial, de empresários paulistas, cariocas e gaúchos. Momento em que jornalistas e ativistas com destaque nas redes sociais assumiram papel de destaque nas organizações empresariais.

10) A segunda onda foi criada pela Operação Lava Jato que estabeleceram vínculos com o Ministério da Justiça dos EUA (DOJ) para coibir concorrência empresarial através da ofensiva contra corrupção. A força-tarefa desta operação empregou o mesmo modus operandi adotado pelos EUA

11) Para quem ainda tem dúvidas sobre esta relação da Operação Lava Jato com o DOJ (Ministério da Justiça dos EUA), leia o livro "Arapuca Estadunidense".

12) A Operação Lava Jato criou o clima propício para a radicalização do discurso contra o PT e movimentos sociais brasileiros e projetam ideário de extrema-direita a partir do uso e permutas com a grande imprensa brasileira, em especial, a Rede Globo.

13) A terceira onda foi o bolsonarismo ou a tomada de poder pela extrema-direita. Não se atém, portanto, à figura de Jair Bolsonaro. Vai além e se fundamenta na ação de quatro forças - ou blocos - políticos: os militares, os evangélicos, o baixo clero e os empresários.

14) o segmento das FFAA que se forjou bolsonarista se constituiu a partir da mudança de ideário (nacionalista para ultraliberal) durante a gestão do ministro Viegas à frente do Ministério da Defesa e através da experiência de intervenção militar no Haiti

15) O Haiti ressuscitou o "haitianismo", uma ideologia das elites brasileiras disseminada no século XIX fundada no temor de uma revolta de pobres negros como a ocorrida no Haiti.

16) A partir daí, comandantes da missão desenvolveram a tese - há inúmeros depoimentos colhidos em pesquisas acadêmicas - da vigilância permanente e repressão ostensiva para conter o caos social. Uma peculiar forma de "defender a democracia" ao estilo norte-americano.

17) Quanto aos empresários, o apoio inicial foi do setor varejista e empresas de pequeno porte (primeiro turno), passando para negociação de agendas de reformas ultraliberais e anistia de ilegalidades cometidas (segundo turno) liderada pelos grandes empresários.

18) Os evangélicos começaram cautelosamente. Muitas igrejas, como a Universal (IURD) apoiaram os governos lulistas. No primeiro turno, 40% dos evangélicos votaram em Bolsonaro. Mas, no segundo, saltaram para mais de 60%.

19) Não há o propalado alinhamento automático da base evangélica para os líderes das igrejas. O alinhamento ocorre em momentos de excitação ou comoção nacional e sempre a partir da defesa da pauta de costumes. Foi exatamente isso que foi acionado em 2018.

20) Há inúmeras pesquisas revelando que a grande maioria dos participantes das Marchas para Jesus não se alinham com a agenda da "Bancada da Bíblia" no Congresso Nacional

21) Finalmente, o baixo clero. O baixo clero cresceu politicamente a partir da eleição de Severino Cavalcanti para a presidência da Câmara de Deputados defendendo aumento de verbas e salário para parlamentares

22) Mas, dá um salto, em 2015, com a eleição de Eduardo Cunha para a mesma presidência. É o momento do "profissionalismo" na condução do baixo clero: vínculos com o alto empresariado e ação agressiva para tirar vantagens do governo federal.

23) Bolsonaro sempre foi - e sempre admitiu - ser membro do baixo clero. Obteve apoio deste bloco político desde o início de sua campanha. O baixo clero é formado por deputados sem grande expressão pública, mas que batalham para conseguir verbas e obras para sua base eleitoral

24) Essa é uma breve história - e a base política - por onde se consolidou a extrema-direita brasileira. Há, ainda, o apoio social difuso, não organizado, formando nichos. Fico por aqui. (FIM)

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