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Saúde Indígena e políticas públicas: apontamentos iniciais

analisecovid19.org/2020/04/21/625/
Desde 2010, o Brasil conta com uma Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) que atende povos nas Terras Indígenas (TI) e aldeias por todo o território nacional.
As especificidades e modos de vida dos povos indígenas, suas diferentes relações com o corpo, com a saúde e com doenças torna a SESAI e o atendimento especial um mecanismo fundamental para a asseguração de direitos indígenas à saúde e à vida, como consta na Constituição de 1988.
Entretanto, os indígenas que vivem em cidades costumam ser atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e outros sistemas não-específicos, o que acaba gerando dificuldades nos atendimentos.
Por não darem conta das especificidades da saúde indígena, mesmo quando ocorrem atendimentos satisfatórios, os registros que daí derivam terminam por ser incompletos, não evidenciando o estatuto indígena do paciente atendido +
e falhando em colaborar para que as políticas públicas voltadas à saúde (indígena e universal) tenham um diagnóstico mais preciso das realidades da população brasileira, indígena e não-indígena.
No caso da crise sanitária, essa falha de registro pode ainda intensificar casos de subnotificação, aumentando o tempo entre diagnósticos, cruzamento de dados e alimentação de bancos de dados relacionados ao Covid-19 – e ao impacto do vírus sobre povos indígenas.
Em 03 de abril de 2020, por exemplo, a própria SESAI assumia que indígenas residentes em cidades que apresentassem quadro de Covid-19 não ficariam sem assistência, mas em tais casos a responsabilidade seria do SUS , e não da Secretaria Especial de Saúde Indígena.
Considerando o Censo de 2010, há 896.917 pessoas indígenas no Brasil, dentre as quais 324.834 vivem em cidades. Isso significa dizer, num quadro de pandemia como o atual, que uma porção considerável de indígenas estaria desassistida em seu direito a um sistema específico de saúde
Políticas públicas voltadas à saúde indígena existem há muito tempo e têm passado por diversas reformulações. Atualmente, em meio à crise sanitária global, o Estado brasileiro parece emitir inais conflitantes sobre o que entende como medida sanitária a ser tomada.
Por um lado, no caso indígena, o Ministério da Saúde elaborou medidas de conduta para evitar a disseminação do Covid- 19 entre os povos. Tais medidas incluem “a necessidade de quarentena para profissionais de saúde membros da FUNAI” antes do acesso a povos isolados.
Entretanto, segundo relatos de lideranças indígenas, as comunidades não têm recebido da SESAI material de proteção individual, como máscaras e outros equipamentos que permitiriam aos indígenas transitar dentro e fora da aldeia.
Por outro lado, a SESAI tem tentado assegurar esses materiais para as Equipes Multidisciplinares de Saúde Indígena, e estas têm feito visitas domiciliares orientando a população indígena sobre a situação de crise e a necessidade de se resguardarem, observando o isolamento social.
O Instituto Socioambiental criou uma plataforma para acompanhamento de casos de Covid-19 entre povos indígenas, para a divulgação de ações que estão sendo realizadas por todo o país. Há campanhas como #FiqueEmCasa e #FiqueNaAldeia sendo promovidas pelo próprio movimento indígena.
A despeito das orientações do Poder Executivo do governo federal, que reiteradamente tem minimizado a gravidade da situação, há relatos de que a SESAI, por meio dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI), +
vem colaborando para que o isolamento social mantido pelos povos indígenas seja respeitado.
Para que se pensem políticas públicas voltadas aos povos indígenas no Brasil neste tempo de pandemia, é fundamental que os diversos níveis de governança estejam afinados em suas ações.
Para além de um sistema de saúde universal, tal qual o SUS, o Estado brasileiro deve se manter comprometido com ações voltadas à saúde indígena e ao atendimento específico que ela exige.
E, sobretudo, deve se ater ao que reza a Constituição, garantindo condições para que os povos indígenas mantenham seu isolamento social e voluntário, se assim o desejarem, e garantindo recursos materiais para que sua sobrevivência não se veja ameaçada nesta crise global.
Texto de Leandro Durazzo @durazzo

Etnólogo, doutor em Antropologia Social (UFRN), membro do grupo de Pesquisas Macondo (UFRPE/UAST).
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