Thread by @rodrigodasilva

Quem nasce nos Estados Unidos da América é "estadunidense" ou "americano"?

A thread:

Não dá pra responder essa pergunta, claro, sem recorrer à História.

Diferentemente do Brasil, que recebeu este nome diretamente de seus colonos portugueses logo nos primeiros anos de sua fundação, os Estados Unidos da América não se chamavam Estados Unidos da América até 1776.

Antes disso, o espaço de terra que viria a se chamar Estados Unidos da América era uma coleção de 13 colônias.

Essas colônias não eram referidas como uma entidade única com um nome oficial. Pelo contrário: cada uma tinha um nome próprio.

Elas faziam parte da América Britânica.

Esse aqui, por exemplo, é o mapa da Província da Pensilvânia, uma colônia proprietária de um inglês chamado William Penn (o nome da colônia homenageava o pai dele).

A Filadélfia era a capital desta colônia. Foi nesta cidade que o nome Estados Unidos da América nasceu.

Mas não se engane. Nem todas as colônias da América Britânica integraram o pedaço de terra que viria a se tornar os Estados Unidos da América.

As colônias de Nova Escócia, Terra Nova e Quebec, por exemplo, rejeitaram a inclusão à independência.

Hoje elas preenchem o Canadá.

Em 1775, as 13 colônias rebeldes decidiram chamar a união de seus territórios de Colônias Unidas.

Em 1776, na Declaração de Independência, rebatizaram o espaço, ao deixar o status de assentamentos estrangeiros para virar estados: os Estados Unidos da América.

Em 1783, ao vencer a Guerra da Independência, os Estados Unidos da América se tornaram o primeiro país independente da América.

O Haiti, o segundo da lista, só ganharia esse status em 1804.

A Colômbia, liderada por Simón Bolívar, só faria isso em 1810.

O Brasil em 1822.

Um problema, no entanto, perseguia os Estados Unidos da América: seus habitantes falavam como britânicos, se vestiam como britânicos e se enxergavam britânicos.

Um orgulho "americano" precisava ser despertado para fortalecer os ideais da independência.

George Washington, o primeiro presidente da nova nação, fez um pedido especial à população - que se sentisse "americana":

"O nome 'americano', que pertence a você em sua capacidade nacional, deve sempre exaltar o justo orgulho do patriotismo mais do que qualquer denominação."

É daí que nasce a quase devoção à "América". Não havia "estadunidenses". Havia "americanos": esse sentimento de reverência à América, que agora constituía seu primeiro país livre.

A América livre era uma tábula rasa pronta para a aplicação dos ideais daquela geração.

Quando o país que conhecemos como México ganhou sua independência, em 1821, seu nome oficial também passou a representar as entidades que formavam seu território.

Esse é o nome oficial do México até hoje: Estados Unidos Mexicanos.

Eles também não se sentem estadunidenses.

"Estados Unidos", isoladamente, não é nome de país. Assim como "República Federativa".

Estados Unidos do Brasil foi o nome oficial do nosso país entre 1889 e 1968 - e nunca fomos estadunidenses.

Esse foi o caso também dos Estados Unidos da Colômbia, da Indonésia e da Venezuela.

E veja: há outros exemplos de países que carregam o gentílico de uma região.

"Sul-africano" pode se referir tanto aos habitantes do sul da África quanto aos da África do Sul.

"Centro-africano" pode se referir tanto à região central da África, quanto à República Centro-Africana.

Embora o dicionário permita "estadunidense", não é comum o seu uso na nossa língua.

É a razão por que chamamos "cinema americano", "música americana" ou "economia americana" em alusão aos Estados Unidos da América.

Essa aqui, por exemplo, não se chama Samoa Estadunidense.

Dito tudo isso, você pode continuar utilizando, claro, a palavra "estadunidense" para se referir aos Estados Unidos da América (e não aos Mexicanos), com a benção de Houaiss.

Eles continuarão abreviando o nome de seu país como América. Com a benção da História.