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D. Pedro II e a escravidão.
Em meio as visitas de praxe, questões envolvendo a abolição e o tratamento dado aos escravos em São Paulo em 1886, chamaram a atenção do imperador durante sua passagem pelas cidades da província. #DomPedroII #escravidao #abolicionismo
Além de contribuir financeiramente para comprar alforrias e assinar os Livros de Ouro com os quais comitês abolicionistas o saldavam nas estações ferroviárias, aumentando ainda mais as dívidas da deficitária Casa Imperial, o imperador exerceu uma espécie de fiscalização.
D. Pedro II passou a conferir de perto como a polícia era usada pelos senhores de escravos. O jornalista Múcio Teixeira o acompanhou e deixou registrado em artigos enviados para jornais no Rio algumas cenas que presenciou.
Na cadeia de Taubaté o imperador viu um alçapão:
"[...] cautelosamente fechado com a precisa antecedência, indagou o que é que havia lá em baixo... Ao saber que nesse antro jaziam cinco escravos ali enterrados por ordens dos respectivos senhores, convidou-me a descer, e vimos, então uns miseráveis pretos, que na frase sintética
do inconsciente carcereiro 'eram atrevidos e incorrigíveis'."
A contrariedade de d. Pedro com o uso da máquina do Estado usada particularmente por senhores de escravos, levou-o a uma conversa com o presidente da Câmara Municipal. O imperador lhe perguntou se achava que as
autoridades deveriam auxiliar os donos dos escravos a corrigi-los. Dizendo em seguida: "Entendo que o senhor de escravos não pode castigá-los fora de sua casa". Em outra cadeia, viu, outro escravo preso a mando do seu senhor. Dessa vez d. Pedro disse ao escravo:
"Espere, meu preto, tenha paciência, que eu já vou tratar da sua liberdade". Voltou-se ao presidente da câmara e mandou que este tratasse da alforria do escravo, afirmando que pagaria a quantia da indenização ao senhor. Como o vereador continuou acompanhando o imperador esse se
voltou para o político e ordenou: "Ande, que eu tenho pressa, e não quero sair daqui sem ver isso feito". Em um quartel de polícia, libertou um passarinho preso numa gaiola e disse sorrindo: "Eu não gosto de gaiolas em quartéis, nem de alçapões em cadeias".
Obviamente que as
histórias enviadas por Múcio Teixeira para o jornal O País falando sobre o descontentamento do imperador em ver escravos nas cadeias, fez com que, na cidade de Piracicaba, d. Pedro não encontrasse nenhum aprisionado, assim como nas demais localidades por onde passou.
Mas o imperador, apesar de tentar, não era onisciente nem onipresente. As leis para a emancipação gradual existiam, mas o seu cumprimento era outra questão.
A primeira lei, a do Ventre Livre deixava de ser cumprida por falta de fiscalização.
Inclusive com denúncias, como a da venda de um garoto escravizado de 10 anos de idade. O menino foi posto à venda em um leilão em 1882 na cidade de Valença, Rio de Janeiro, quando, pela lei de 1871, já era um liberto. Não havia gente suficiente para verificar se os filhos dos
escravizados estavam efetivamente recebendo algo para trabalhar, ou não, e se estavam sendo criados para serem libertos.
Em relação a segunda lei, a dos sexagenários, pela quantidade de escravos que efetivamente chegavam aos sessenta anos, a liberdade servia para pouca coisa.
A não ser para os senhores, que, mesmo sem indenização como desejavam, se livravam do ônus de manter, cuidar e tratar dos escravos até o fim de suas vidas.
Joaquim Nabuco, um dos principais tribunos abolicionistas, acusava o governo de tentar com essas leis, que considerava
protelatórias, adiar a verdadeira abolição e, com isso, tentar esvaziar o movimento. Nabuco, e o engenho André Rebouças, entre outros, eram partidários de um projeto de Brasil em que a abolição e a igualdade social pudessem alicerçar o Terceiro Reinado com a princesa Isabel.
A coroa deu diversas sinalizações, ao longo de décadas, de seu interesse na causa abolicionista e tentou por diversas vezes pressionar o governo e os políticos para a realização da emancipação gradual. Os membros da casa imperial agiam de maneira pública contra a escravidão.
Em oposição ao flerte entre a coroa e o movimento abolicionista, os escravocratas começaram a estreitar laços com o movimento republicano. Esse não tocava na questão da abolição; era formado pela elite e não tinha caráter popular. O movimento passou a simbolizar para os senhores
de escravo uma possibilidade de manutenção de seus privilégios sem precisarem lidar com uma reforma social necessária para integrar os libertos à sociedade. A ideia, no geral, era que a libertação ocorresse da maneira mais morosa possível e que eles fossem indenizados pelo que
entendiam ser a abolição uma tomada, por parte do Estado, de sua propriedade, os escravos.
Fontes:
Paulo Rezzutti: D. Pedro II a história não contada
Emília Viotti da Costa: A Abolição
Múcio Teixeira: O imperador visto de perto
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