Tive a sorte de fazer a revisão técnica da tradução do livro do @PikettyLeMonde e assim de le-lo em primeira mão no fim do ano passado e início desse ano. Finalmente agora com o lançamento, faço esse fio pra chamar atenção pra alguns elementos 
Ao contrário de outros leitores que respeito, que se interessaram sobretudo pelas propostas do final do livro, gosto especialmente da parte inicial sobre as ideologias que justificaram as desigualdades em diferentes sociedades e momentos históricos.
A análise das formas de perpetuação de privilégios na sociedade francesa após a revolução é fenomenal. Os dados obtidos nos registros de herança são riquíssimos. Quando aborda a história da desigualdade em outros países o livro é menos preciso, mas isso me parece natural
Ainda assim, aprendi muito sobre o papel do Império britânico em reforçar o sistema de castas na Índia, por exemplo.
A parte do livro sobre a trajetória do voto na centro-esquerda ao redor do mundo também é bastante rica em dados. Talvez ali Piketty traga menos novidades para quem tem acompanhado a literatura sobre a perda do voto da classe média pós-globalização
A parte de propostas é para mim a menos convincente. Sim, é interessante a ideia de uma dotação universal de capital financiada pela tributação de altos patrimônios — ataca a concentração de riqueza e assim um importante mecanismo de perpetuação das desigualdades
A participação dos trabalhadores em conselhos de empresas e a democratização da educação superior também podem ser importantes vetores de redução da desigualdade. Mas essas soluções ficam parecendo utópicas sem a análises dos conflitos distributivos que permeiam o sistema
As ideologias que justificam e perpetuam desigualdades não são desconectadas das estruturas de poder. Por isso as propostas de Piketty acabaram sendo consideradas ingênuas por tanta gente. De todo modo: leiam que vale muito a pena!
