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Bom dia. Recebi algumas críticas pelo texto que escrevi ontem sobre uma possível explicação deste modo de ser da quase totalidade dos brasileiros, fingindo que a maior pandemia em 100 anos não é tão grave e que temos "corpo fechado" para este vírus. Vou explicitar as críticas
1) A crítica mais frequente foi de que eu estaria adotando uma linha culturalista, buscando traços estruturais e ancestrais do nosso comportamento. Uma ou outra crítica desta natureza vinculava o comportamento à falta de liderança nacional - ou governamental - no combate ao vírus
2) A segunda crítica se relaciona à característica que citei dos indígenas brasileiros que se vincula ao valor supremo da liberdade de ir e vir. Perguntaram se este valor não seria de outros povos e nações.
3) Houve quem criticasse uma explicação focada na passividade brasileira como algo atávico e estrutural. Citaram vários movimentos e ações de revoltas populares no Brasil.
4) É muito importante que as divergências sobre uma explicação sociológica sejam divulgadas e tratadas á sério. Mesmo porque, apresentei hipóteses e não afirmações cabais. Aliás, sociologia e ciência é sempre assim: hipóteses, não verdade absolutas ou interditamos novas pesquisas
5) Farei uma ou outra observação, não no sentido de refutar as críticas, mas de ampliar a discussão. Começo sobre o traço atávico indígena. Sabemos que estes traços de alegria e liberdade dos indígenas brasileiros são registrados por inúmeras pesquisas antropológicas.
6) E, não, os europeus nem de longe têm este traço em seu caráter cultural ou comportamental. A tristeza portuguesa, por exemplo, é conhecida mundialmente. Nossa herança cultural é muito forte: Anísio Teixeira procurou recuperar traços desta cultura indígena com as Escolas-Parque
7) A forma como nos organizamos nas salas de aula e em auditórios indica este traço atávico: por mais que os gerentes ou organizadores de evento orientem para ocuparmos os lugares de maneira ordenada, sempre nos sentamos por afinidade, em grupos de conhecidos, numa ordem peculiar
8) Em algumas universidades europeias, a primeira fila é ocupada por professores catedráticos, a segunda fila, por professores assistentes e as filas seguintes, pelos estudantes. Podemos imaginar algo assim aqui no Brasil?
9) Sobre o traço culturalista da minha análise. É fato. Não devemos absolutizar este viés de análise porque há outros fatores contribuintes. Mas, também, não devemos negar. Os estudos sobre imaginário, ideário e representação social são fartos nas ciências sociais.
10) Estudos sobre cultura política são referências mundiais de análise comportamental. Sem esta vertente, ficaríamos presos aos determinismos de toda ordem, econômica, política e outros, numa concepção estruturalista empobrecida: seríamos fruto de fatores exógenos à existência
11) O último argumento é sobre o papel do líder na definição de um comportamento fugidio dos brasileiros. Não há como negar. Há muitos estudos. Assisti uma entrevista de Átlia Iamarino com a psicóloga Cecília Dassi a respeito. Cecília expôs o papel do líder em situações de crise
12) Nos períodos de forte comoção, tragédia, crise ou falta de perspectiva, o líder assume um papel de bússola e organização, inclusive mental. Na ausência desta liderança organizadora, as reações são múltiplas, inclusive a fuga da realidade e a construção de um mundo imaginário
13) Ora, é evidente que este é o caso do Brasil. A ausência de um líder sério, responsável, que assuma esta tarefa organizadora joga uma multidão de angustiados ou sem perspectiva na aventura de "testar" a crise. Pode ser um caminho sem volta, mas é uma aposta nesta fuga
14) Não há como refutar esta hipótese explicativa. Hipótese que não refuta as outras hipóteses de explicação de nosso comportamento como traço nacional. Enfim, é fundamental que façamos este balanço e exercício de explicação. Se não nos entendemos, não dialogamos entre nós. (FIM)
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