Thread by @leoffmiranda

Domènec Torrent colocou Pedro, Vitinho e Michael no segundo tempo contra o Atlético-MG. O Flamengo jogou num 5-1-4 ou um 2-3-5?

No fim, não importa. Mais importante que entender esquema é entender uma ideia e o tempo que ela leva para virar um time. Segue 👇

Torrent explicou que queria deixar cinco atacantes contra a defesa do Galo, que naquele momento também tinha cinco jogadores. O técnico queria criar situações de "1 a 1". Faz sentido, já que Bruno Henrique e Gabigol são rápidos e bons para driblar e fazer o gol.

Para equilibrar o meio-campo, Rafinha e Filipe Luís foram para o lado.

É a ideia dos laterais por dentro, que Guardiola tanto usou com a ajuda de Dome no Bayern. Lahm e Alaba jogaram muito assim e esse posicionamento inspirou diversos times no mundo. A inversão da pirâmide.

Filipe joga bem por dentro, Rafinha conhece Dome, Michael e Vitinho abertos podem driblas laterais e Pedro sabe se virar entre os zagueiros.

Tudo faz sentido! Você consegue entender a lógica de cada coisa. Uma coisa leva à outra, soa natural.

Chamamos isso de uma boa ideia.

Ideia vem de ideal, algo tão certinho...que não existe. Por isso o futebol não é feito só de ideias, mas sim da execução delas. Quando sai do papel e vai pra realidade, a ideia muda. Se adapta ao lugar, tempo, pessoas e situação em que ela está.

Isso se chama contexto.

Ter cinco atacantes em campo não te faz ser mais ou menos ofensivo. O que faz o time ser ofensivo é saber desorganizar uma defesa e CRIAR ESPAÇO para que a bola chegue ao gol.

Como se cria espaço?
- movimentos com e sem a bola
- corridas
- passes
- cruzamentos

Com dinâmica.

O 5-1-4 ou 2-3-5 te mostra apenas um desenho inicial que serve como base. Mas não te a forma como o time cria espaço para atacar e diminuir eles para se defender.

O treinador não "tem" ou coloca esquema tático. Ele estimula os jogadores a cumprirem uma determinada dinâmica.

Se esquemas não são importantes, então vamos falar de posição. Bruno Henrique é atacante e Léo Pereira é zagueiro.

Ok, mas eles se movimentam em campo e a posição não fala onde e com quem acontece o movimento. Léo Pereira pode dar um passe de 30m ao atacante. Ele vira meia? Não!

Aqui entra uma palavra muito repetida, que é função. É o conjunto de tarefas que um jogador deve fazer ao longo da partida.

Melhora, mas um jogador pode ter muitas funções no campo. Pode atacar e defender conforme o momento do jogo ou o adversário.

Qual é o esquema do Flamengo se o time se defendeu com uma linha de quatro quando tinha cinco atacantes? Qual a função do Vitinho, que ora aparecia por dentro e ora pelo lado?

A pergunta certa é: qual é a ideia de jogo do Fla e quantos % o time conseguiu aplicar?

Para uma ideia dar certo ela precisa ser passada com clareza, compreendida pelos jogadores, colocada em prática no treino e nos jogos e ir se ajustando àquele monte de coisas que falamos de contexto para criar dinâmicas e ir abrindo espaços no adversário. É um processo.

Por estar no início do processo, o Flamengo se postou com cinco atacantes e não entendia uma coisa básica: precisava se movimentar. Vitinho recebia a bola sozinho.

Se aproximar do jogador com a bola faz o adversário sair do lugar e abre espaço para outro jogador aparecer ali.

A coisa fica mais complexa: a dinâmica tem variáveis, como bola, espaço, companheiro, time e adversário. Num nível maior, o tempo do jogo e estado emocional também afetam. Absolutamente tudo é contexto.
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A falta de movimentação faz o Flamengo ir tocando pra trás até a bola chegar em Léo Pereira. O time continuou totalmente estático, e enquanto Léo conduz, Vitinho faz um movimento de fora para dentro, procurando o espaço nas costas de Hyoran.

Ele até identificou a movimentação, mas foi tão lento que, quando recebe a bola, Jair já posicionou o pé pra não deixar ele dominar. Vitinho tenta girar e a jogada cai em falta. O Flamengo recomeça, toca de um lado a outro e não dá em nada.

É completamente natural o Flamengo estar desconectado e fora de ritmo porque Torrent teve MENOS DE UMA SEMANA de treino.

Lembra que criar dinâmica no time é um processo? Processo significa tempo.

Tempo é a coisa mais importante na vida humana.

É finito, passa rápido e o que você faz nele é o que define quem você é e se você consegue realizar seus sonhos ou não.

No fim é como futebol: o que define um time é como ele usa o espaço e o tempo que tem em campo.

Não dá pra analisar uma ideia ou um time sem levar em conta o TEMPO de trabalho, o tempo de vida dos jogadores e o tempo em que o técnico desenvolve suas ideias (que é maturidade). Não existe ideia boa ou ruim. Existe ideia com mais ou menos tempo para ser entendida.

Ok, então em quanto tempo o Torrent colocará suas ideias, que são BEM diferentes da do Jesus, no time? Quantos dias leva pra todo mundo entender tudo?

É aí que tá a graça do futebol: não existe uma resposta certa.

Jorge Jesus levou 20 dias, o período de pausa para a Copa América para colocar suas ideias no Flamengo. Levou gols nos seis primeiros jogos e quase foi eliminado pelo Emelec. Com a saída de Cuellar, ajustou o time em um mês e ganhou cinco títulos pelo Flamengo em 13 meses.

Jurgen Klopp ficou 4 anos no Liverpool e só perdeu. Levou goleada do West Ham e do Burnley, ficou de fora da Liga dos Campeões por vários anos até finalmente chegar numa final e...perder. Tentou de novo noutro ano e finalmente venceu num dos times mais espetaculares da década.

Um levou dias, outro levou anos. Quem é melhor? Quem é pior?

Depende do tempo que você avalia eles!

O técnico pode controlar o treino, a didática que ele tem para passar sua ideia, sua forma de convencimento...mas não controla o tempo que leva para colocar dinâmica num time.

Por isso que a pergunta que todo mundo deve se fazer é: quanto tempo estou disposto a dar para que as boas ideias do Torrent, como o Jogo de Posição e os laterais por dentro, se transformem num time? E não só num time que joga bem, num time que vence?
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Quanto tempo a torcida do Corinthians está disposta a dar ao Tiago Nunes?

Quanto tempo você estaria disposto a dar a um treinador como o Dorival, que tem ótimas ideias e sempre pegou times na metade da temporada?

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Tempo é importante, mas a gente usa mal demais ele.

Discutimos qualidade individual, julgamos pessoas que sequer conhecemos e não entendemos a ideia de cada técnico e o tempo que elas precisam para virarem realidade. Ou porque elas não deram certo e precisam ser descartadas.

Seria mais inteligente se a gente não apontasse o dedo por aí, como cruelmente fizeram com Bruno Henrique, e buscasse entender o como e os porquês das coisas.

E, é claro, o tempo. Quanto tempo o Flamengo dará a Domènec? Ou ele terá que vencer antes para ter tempo?