Sobre o vídeo psicanálise e políticas identitárias:
A fala dele, a que tava preparada, foi até interessante. Não falou de clínica, falou do social. Questionou a própria premissa da política identitária, já que não há representação que seja universal.
E apontou que toda política é de algum modo identitária, justamente porque não há universal. O que foi tomado como universal - na política, na ciência - é a identidade cisheteronormativa branca. Sobre lugar de fala, propõe que não há lugar de fala potente sem lugar de escuta.
E aí foi muita esperteza metodológica, porque “escuta” fez parecer que tava falando de clínica, mas não tava. Tanto que usou até acolhimento como sinônimo.
Até aí tudo bem.
Mas aí chegou a hora do debate. Ferrou-se tudo.
Em resposta a um questionamento sobre branquitude, ficou possesso. Se disse acusado de ser branco. Contou que teve uma bisavó negra que foi estuprada. Que o babaca (sim, ele xingou) que o acusa de ser branco desconsidera sua história familiar. E saiu da reunião.
E assim, afora tudo que pode ser dito: branquitude não é isso, né? Branquitude não é raça, é lugar de privilégio. Que tem a ver com fenótipo mais do que com genótipo. Ele se diz acusado de ser branco e se defende de ser branco recorrendo a uma história genética.
Mas branquitude não é gene. Branquitude é o lugar social q uma pessoa branca tem, que difere muito em oportunidades e privilégios do lugar que uma pessoa negra tem. Em outras palavras, branquitude diz respeito propriamente ao modo como ele é visto e o lugar q ele ocupa por isso.
E aí assim, né? Não sabe bem o que é branquitude. E ninguém é obrigado a saber nada não, mas se você se propôs a falar sobre, escolheu essa pergunta entre outras pra responder, poderia ser no mínimo cuidadoso com o conceito.
Já ela começou a fala de um jeito clinicamente interessante até: mostrando que analista é um lugar vazio de identidades, e que desse lugar de analista é possível escutar qualquer pessoa. Não passa pela identificação, pela compreensão, pelo entendimento. Isso é importante demais
na esfera política, mas na clínica o lugar do analista é sempre vazio. Ok. Só que durou dois minutos. E começou a falar das políticas propriamente ditas.
Aí, retomando ainda a colunista que criticou a Beyoncé, começa aquela crítica clássica ao lugar de fala:
“Então ninguém pode falar nada nunca, então é preciso ser negro pra falar de negritude?, é preciso ser mulher pra falar de feminino?, então o lugar de fala é pra ninguém mais conversar, é um lugar de cale-se?”
E de novo, lugar de fala não é isso, né? Até entendo que às vezes ele seja interpretado/apropriado/utilizado dessa maneira. Mas não é isso. Esse tipo de noção é o básico do básico: lugar de fala, bem resumidamente, tem muito mais a ver com o discurso do mestre.
Ninguém que está de fora de uma reivindicação ou discurso que parte de um lugar identitário específico pode falar o que a pessoa que está dentro tem que fazer. Se você é homem você pode falar de mulher, claro.
Mas não pode falar como uma mulher deve lutar seu feminismo, ou como ela deve se sentir ou agir diante de uma situação de opressão. Se você é branco, pode e deve falar sobre racismo. Mas não pode dizer “faça assim, faça assado”. Como se o seu discurso partisse de um lugar
universal (e não identitário) de saber. É preciso reconhecer o seu lugar e não encarnar o mestre. E a coluna lá que tá todo mundo passando vergonha pra defender tem um subtítulo assim:
“Diva pop precisa entender que a luta antirracista não se faz só com pompa, artifício hollywoodiano, brilho e cristal”. É literalmente uma branca dizendo como uma mulher negra deve ser uma racista melhor. Encarnando o lugar do mestre, de um saber universal.
Mas todo mundo que eu vi defendendo só ficava nesse argumento reativo “ah mas ninguém mais pode falar sobre nada?”
Claro que pode. Plmdds. Só não pode dizer o que as pessoas “precisam entender”.
E né, de novo, ninguém é obrigado a saber de nada. Você vai falar sobre política identitária mas não tem tempo ou não tá a fim de estudar os conceitos? Sai pela tangente, fala de psicanálise, fala de clínica. Se for falar de política tem que estudar, fazer a lição de casa.
“uma branca dizendo como uma mulher negra deve ser uma antirracista melhor” maldito corretor edição de tuítes quando que vai vim
Ando chatona aqui reclamando de tudo, mas acho que não explique direito ainda, de forma organizada, o tratamento que tô fazendo né
Eu estou cuidando de um câncer de tireoide, do tipo mais comum: carcinoma papilífero
Vamos supor que meu pescoço seja um mamão papaya
E esse mamão papaya tá com pontos de mofo
O que a gente faz é cortar fora a parte mofada e comer o resto, né? O que todos os especialistas mandam fazer é jogar a fruta toda fora, pq se já tá com um ponto visível de bolor significa que ela tá toda contaminada microscopicamente
Digamos que a minha tireoide estava com cinco pontos diferentes de bolor, e além disso tinha duas metástases em linfonodos do pescoço - o mamão tava na fruteira e ainda deixou lá uns pontos brancos no prato
Prometi que não seria daquelas mães que jogam coisas fora sem perguntar, porque ficava super brava quando a minha mãe fazia isso
“Qual a dificuldade de não jogar minhas coisas fora?”, eu me perguntava
Agora estando do outro lado digo que é difícil pra cacete 😂
Olha isso:
Isso aqui eu não posso jogar fora porque ele junta pra levar pra escola
(até aí tudo bem)
Isso aqui eu não posso jogar fora porque ele ainda precisa confirmar com alguém que saiba (pq na cabeça dele eu obviamente não sei) se também serve pra juntar aos lacres recicláveis que serão transformados em cadeiras de rodas
Lacan uma vez* falou que a relação de filiação só se dá na psique da criança a partir da incidência do Desejo Não Anônimo (dá até pra inferir um trocadilho com DNA rs)
O que seria isso? Resumidamente (quase grosseiramente), significa dizer que há uma particularidade necessária:
Não basta amar um ideal de filho. Um filho, uma criança. Aquela que segue um script, que vai bem na escola, é gentil, obediente, etc, qualquer coisa que caiba nesse ideal mais generalista. Tomar esse artigo indefinido “um filho”, “uma criança”, e se relacionar só com esse ideal.
A filiação vai se dar quando você amar e se relacionar não com “um filho”, com seu sonho de ter filho, com um ideal de filho, com o lugar de filho. A filiação vai se dar quando você amar e se relacionar com aquele filho em particular.
Quando a gente fala coisas como “é preciso considerar o gozo nessa equação, é preciso olhar pra satisfação pulsional desse sintoma”, muitas vezes somos lidos como “você tá culpando a pessoa??? Você tá igual Nelson Rodrigues dizendo que mulher gosta de apanhar???”
Desde sempre isso foi muito difícil na psicanálise. Quando Freud começou lá nos primórdios a dizer “veja bem, talvez exista um ganho secundário no sintoma” metade da galera reagiu com “olha lá sabia que essas histéricas eram tudo filhadaputa, safoda elas então, elas que querem”
E outra metade reagiu com “Freud está culpando a vítima!!!”
E o ponto da satisfação pulsional sempre deixado de lado, tangenciado. Acho que parte de uma confusão muito grande entre os conceitos de indivíduo e sujeito, um nó sempre meio caótico.
Hoje a gente chegou um pouco mais cedo na escola. As crianças todas espalhadas no pátio correndo, olhando o lago, dando folha pro bode comer, se pendurando nas árvores
Deu a hora de subir e a prof apenas foi pro portão e começou a cantar “essa é a história da serpente”
Imediatamente TODAS as crianças largaram o que estavam fazendo, correram pra pegar as mochilas e fizeram uma fila atrás dela pra subir
Três palavras e todo mundo correu sorrindo
A prof parecia uma encantadora de crianças, uma flautista de Hamelin. Eu fiquei impressionada.
E aí fiquei viajando o quanto essas tarefas impossíveis do Freud são semelhantes né
Como fazer com que crianças parem de brincar? Impossível. Por ser impossível, ela teve que inventar: três palavras do primeiro verso de uma música, plim, todas em fila
aliás é tão bizarro isso de eu ter começado a trabalhar com 15
eu hoje vejo umas pessoas de 22, 23 anos e acho uns nenéns. mas eu com 17 já me enxergava adultona, eu honestamente acho que já tinha o mesmo senso de responsabilidade que tenho hoje em dia
mas é como se só valesse pra mim
outras pessoas com 25/26 anos: BEBÊS
eu com 16/17: adulta responsável capaz igual uma pessoa de 40, sem diferença nenhuma
não sei se é por causa da enteada. vai fazer 26 anos (amanhã inclusive) mas é total minha neném, uma criança indefesa
quando eu lembro que na idade dela eu já tinha mudado de cidade e tava quase me divorciando do 1o casamento mddc. eu ok, mas pensar nela fazendo isso é ABSURDO