Thread by @usebrusinhas

Com toda a polêmica do Guaraná Jesus, que é cor-de-rosa e foi criado por um comunista lá no Maranhão, trouxe de volta esse mimo: o refrigerante vermelhinho de framboesa que foi criado por um anarquista aqui no Paraná, na minha cidade. Aliás, essa é a história que vou contar agora

Giovanni Rossi, um anarquista estudioso de comunidades experimentais italiano, decidiu um dia de 1889 que ia pro Uruguai montar uma comuna anárquica. E essa decisão tem TUDO a ver com esse refrigerante que a gente manda de mimo pra vocês de todos os cantos do Brasil.

Giovanni chegou com 40 a 50 famílias no Rio e acabou ficando aqui pelo Brasil mesmo. Tem gente que diz que a viagem pro Uruguai flopou porque tava tendo deposição de presidente lá, outros dizem que deu uma puta caganeira em todo mundo no navio tornando impossível seguir a viagem.

Uma outra versão diz que o Rossi conhecia o maestro Carlos Gomes, que ficava hospedado em Milão na casa de um parente e ouviu a maior propaganda do Brasil... foi a VOZ DO BRASIL quase que literalmente kkkkkk*
*Gomes é autor da ópera O Guarani que é a música da Voz do Brasil

Pausa pra quem quiser ouvir a música da voz do Brasil TAN TAN TANTANTAN TAM TANTANTAN TAN TAN TAN TANTANTATNAYATWHGWA TAN

Rossi escrevia para vários jornais anarquistas e inclusive mandava notícias sobre a colônia para eles. Essa foi a carta que mandou falando do grupo para o francês Le Révolte:

O grupo acabou desembarcando no Porto de Paranaguá. Compraram 300 alqueires onde hoje é a cidade de Palmeira, no Paraná. Existem muitas colônias aqui, terras que foram vendidas pela Inspetoria de Terra e Colonização a preço baixo pra imigrantes majoritariamente europeus.

Existe uma outra versão que diz que Dom Pedro II, que era amigão do Carlos Gomes, adorou a ideia e deu as terras de presente pro Rossi fazer o experimento, só que em novembro de 1989 foi proclamada a república e eles precisaram pagar pelas terras. Bom, eu sei lá.

Eles precisaram fazer tudo do zero: a terraplenagem do terreno, construir um barracão, as casas, providenciar ferramentas. A colônia chegou a ter 200 pessoas vivendo lá dividindo os meios de produção, alimentação, colheita e... os contatinhos. Pois é, rolava poliamor na colônia.

Só que a colônia Cecília ficava do lado de outra colônia de imigrantes poloneses extremamente católicos. Sabe quando de 2 em 2 meses rola treta na timeline sobre poliamor? Então, isso acontecia lá em Palmeira também.

Além disso, os anarquistas eram ateus... fora a barreira do idioma, pra ajudar. Isso prejudicava a capacidade da colônia de fazer transações comerciais com a comunidade vizinha.
E lá na colônia tinha problemas internos, também.

Muitos dos moradores eram operários, intelectuais... nunca pegaram numa enxada e carpiram um lote na vida. Pareciam o tuiteiro médio. Então a produtividade da colônia era baixa. Rolou falta de comida, desnutrição e consequentemente, doenças. A galera começou a ir embora.

Em 1893, a colônia Cecília acabou de vez. Uns dizem que foi porque o poliamor dava muita treta interna, outros dizem que todo o dinheiro deles ficava numa caixinha... que por sua vez foi roubada por um espanhol, impossibilitando financeiramente a continuidade da colônia.

Desanimados, já que em 1892 tinham tido sua melhor colheita e foram roubados, muitos dos principais membros da colônia foram embora. O tiro de misericórdia foi dado pela revolução federalista, que destruiu boa parte da estrutura física da colônia, que precisaria ser reconstruída.

Independente do motivo, intelectuais, médicos, agricultores e operários foram para Curitiba e São Paulo, agregando pensamento revolucionário nas camadas trabalhadoras do Brasil, movimento que deu origem à Federação Operária do Paraná em 1906 e à Greve Geral de 1917 em São Paulo.

Ah, ainda na linha do poliamor, curiosamente o autor de Dona Flor e seus Dois Maridos, Jorge Amado, era casado com uma ~~neta dos anarquistas que não conseguiram matar~~, Zélia Gattai, que até escreveu um livro sobre a colônia Cecília e seus avós: Anarquistas, graças a Deus.

O terreno da colônia foi comprado por uma das famílias que moravam lá, que é proprietária da terra até hoje. Com medo da terra ser desapropriada pelo governo pra fazer um parque ou museu, eles destruíram todos os resquícios físicos da colônia, que virou plantação de soja.

Existe, em algum canto, vários mortos da colônia enterrados sob a soja, inclusive sete crianças que morreram de uma epidemia de crupe, já que os ateus não podiam ser enterrados no cemitério católico da comunidade de Palmeira. Esse é chamado de “cemitério dos renegados”.

Entre as pessoas que vieram da Itália para a colônia Cecília estava Egízio Cini. Em 1899, após a dissolução da colônia, ele escrevia um jornal anarquista em Curitiba. Junto com um amigo, Carlos Celli, começou a produzir cerveja (birra) e água com gás em 1904.

Hugo Cini, filho de Egízio e Aldina, a quem conheceu na Cecília, começou a ajudar a diferenciar as bebidas, fazendo versões com sabor como a gengibirra (ginger ale), que é uma bebida gasosa com sabor de gengibre que hoje é patrimônio imaterial da cidade de Palmeira.

Com o sucesso da empreitada, foi aberta em São José dos Pinhais a cervejaria Esperança, que tinha um primor técnico na produção de bebidas carbonatadas artesanais. Depois Hugo Cini passa a ser dono de toda a empresa, que vira a Cini, como conhecemos atualmente.

Gengibirra, Cini Framboesa, Wimk, Cini Abacaxi são clássicos da infância de quem cresceu em Curitiba e região há mais de 115 anos. Quando a gente manda esse refrizinho de brinde, na verdade está te chamando pra tomar um gole de gasosa gelada e fazer parte dessa história.

Qual a regra pra receber o refrizinho Cini?

Pois eh rapaziada apesar da temática e da sincera simpatia isso não é uma anarquia existe uma regra que é comprar 2 brusinhas e levar o refrizinho de brinde 🤝