Com todo o respeito pelo Ruy Castro e com todo o desprezo por Trump e Bolsonaro, me sinto no dever de escrever sobre isso.
Não sou psicóloga, sou jornalista. Já fiz reportagens sobre suicídio em grandes redações e atualmente cubro especificamente temas relacionados à morte. +
Antes de a gente seguir neste fio, vale lembrar que se você está passando por alguma situação delicada ou conhece quem está, o @CVVoficial é um atendimento sigiloso, gratuito e 24h. Pelo telefone 188 ou pelos canais de comunicação na internet. +
Também há o mapasaudemental.com.br, desenvolvido pelo Instituto Vita Alere - uma referência em prevenção e posvenção ao suicídio. Neste site há contatos de psicólogos e psiquiatras gratuitos em todo o Brasil, online ou presencial.

Dito isto, sigamos:
Este não é um fio sobre política, é sobre suicídio.
Independentemente de posicionamento político e sobre a flagrante condição genocida de Trump e Bolsonaro, existem protocolos para veículos de comunicação lidarem com a temática do suicídio. Claro que devemos falar a respeito, +
mas partindo SEMPRE de um ponto RESPONSÁVEL.

Apresentar o suicídio como única saída é perigosíssimo. Não para este ou aquele político, mas para o leitor. Todos nós, em algum momento, nos deparamos com situações que parecem um beco sem saída. Mas alguns estão mais vulneráveis. +
O jeito que o artigo está posto é nocivo em vários momentos, e chega inclusive a citar métodos de suicídio, com um acompanhamento de uma descrição grotesca do que acontece em cada situação.

Não custa retomar alguns pontos:
O suicídio é MULTIFATORIAL. Nunca é uma razão só que leva alguém a uma atitude extrema. Portanto, na imprensa (e na vida), não devemos utilizar construções como "se matou porque perdeu o emprego" / "tirou a própria vida porque a namorada terminou com ele ou ela". +
Não devemos fazer juízo de valor de um suicídio. Nem dizer que foi ato de coragem nem de covardia. Avaliar que "a pessoa tinha tudo, e mesmo assim..."/ "não pensou no pai e na mãe..." / "é falta de Deus no coração", entre outros. +
Sempre que possível, não devemos divulgar o método ou o local em que o suicídio aconteceu. Isso pode despertar gatilhos em pessoas que já estão na borda desta decisão ou criar os chamados "hotspots", locais que ficam conhecidos por várias incidências de morte por suicídio. +
Devemos ficar atentos à linguagem: evitar "cometeu suicídio"/ "tentativa fracassada de suicídio"/ "obteve êxito no suicídio".

Além disso, suicídio não é crime nem caso de polícia. É de saúde pública. +
Quando decidimos abordar o suicídio de maneira responsável na imprensa, devemos ouvir profissionais gabaritados, falar em prevenção e posvenção, em sinais e tratamentos, dar canais seguros de comunicação. +
Por muito tempo, acreditou-se que o simples fato de falar sobre suicídio nos veículos de comunicação era um problema. Na verdade, é o contrário: devemos SEMPRE falar, não só durante o Setembro Amarelo, mas partindo de premissas básicas de responsabilidade. +
Em tempos tão duros - não só de pandemia, mas sociais e políticos -, é difícil encontrar quem esteja com a saúde mental 100%. É dever da imprensa, e também individual, zelar pelo que se diz e como se diz. +
Aqui, uma cartilha simples e direta sobre como abordar o tema:
portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/201…
+
Eu sinto muito se você que está lendo isso já pensou no suicídio como saída ou já perdeu alguém por esta razão. A palavra mal colocada pode despertar as mais diversas sensações.
Você não está sozinho. Retomo abaixo sugestões de canais de ajuda:
O @CVVoficial é um atendimento sigiloso, gratuito e 24h. Pelo telefone 188 ou pela internet. Também há o mapasaudemental.com.br, desenvolvido pelo Instituto Vita Alere. Há contatos de psicólogos e psiquiatras gratuitos em todo o Brasil, online ou presencial.

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