Vamos finalmente entender por que precisamos de ensaios clínicos randomizados para dizer se um tratamento funciona?
Spoiler: Não é médico famoso, político ou "tradição milenar" que garante essa eficácia.
Vem comigo que vou te contar uma historinha legal nesse fio.
Você certamente já ouviu falar de um "tratamento" bizarro de antigamente chamado Sangria. Ele consiste basicamente em cortar a pele, romper vasos sanguíneos para curar qualquer tipo de doença.
"Nossa André, que absurdo, quem é o idiota que acha que isso funciona?
Já chego lá...
A sangria começou lá na Grécia Antiga. Achavam que doenças eram causadas por desequilíbrio entre 4 fluidos: sangue, bile amaralea, bile negra e fleuma.
Como o sangue era associado à boa disposição, quando alguém ficava doente, pensavam que era porque o sangue tinha estagnado.
Então obviamente a "cura" era a remoção desse sangue. Como a tradição médica grega era forte, a galera achou que era uma ótima ideia fazer isso, sem questionar muito, por centenas de anos. Quando não era com bisturis, faziam isso com sanguessugas.
E tinha médico famoso que adorava recomendar isso, como Ambroise Paré, tipo um Lair Ribeiro que cuidou de 4 reis da frança o século XVI.
Os Europeus colonizaram outros lugares e levaram a sangria, que não foi questionada, já que os médicos americanos admiravam os médicos europeus
Só que aí o presidente George Washington ficou resfriado em Dezembro de 1799. Ele tinha sobrevivido à varíola, várias malárias, 4 tiros de mosquete etc.
"É só um resfriado, já sobrevivi a coisa pior". Mas ele estava com dificuldade pra respirar e seu amigo resolveu fazer sangria.
Fizeram tanta sangria nele, que drenaram quase metade do seu sangue em 24h. E é provável que isso o tenha matado.
Absurdo? Mas a galera da época com certeza falou: "melhor isso do que nada", "pelo menos fizemos o tratamento precoce", "não dá pra ficar de braços cruzados".
Uns 10 anos depois, Alexander Hamilton resolveu avaliar isso de modo mais racional. Ele pegou 366 soldados doentes e os dividiu em 3 grupos. Os soldado foram divididos aleatoriamente e ficaram sob as mesmas condições gerais de cuidados.
Os grupos 1 e 2 foram tratados de modo básico por Hamilton e seu amigo Mr. Anderson. E o terceiro grupo teve o tratamento convencional, juntamente com a sangria feita por um médico "experiente na área".
Outros mostraram resultados semelhantes de que a sangria não era eficaz e era na verdade prejudicial,
mas muita gente não aceitou essa visão numérica, porque acreditavam mais na sua "experiência pessoal".
Qualquer semelhança com o que estamos vivendo hoje não é mera coincidência
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