O novo chanceler fez um bom discurso de posse, pontuou temas urgentes ao 🇧🇷 e ao 🌎, foi pragmático e, acima de tudo, não se rendeu ao léxico conspiratório do antecessor, o ex-Ernesto.
Mas sigo cético. As coisas não ficarão piores, mas dificilmente melhorarão, sabe por quê? 🧵👇
1) A política externa já não é monopólio do Itamaraty há muito tempo. Até os anos 70, todas as relações do Brasil com o mundo passavam pelos diplomatas, até mesmo temas econômicos.
Na queda de braço com os tecnocratas da Fazenda, o MRE frequentemente ganhava. A diplomacia... 👇
2) ...era grande fiadora do projeto nacional-desenvolvimentista, com seus vícios e virtudes.
Nos anos 80, a globalização e a redemocratização vieram mudar esse cenário.
A pressão pela abertura e modernização econômica forçaram governos como @Collor e @FHC a dinamizar... 👇
3) ...a burocracia ligada a comércio exterior, resultando na criação da Camex, a Apex e o MDIC, com agendas e estratégias próprias.
Mais recentemente, o ingresso do 🇧🇷 na OCDE foi agenda tocada primordialmente pela turma do @meirelles.
Essas são só ilustrações de um setor... 👇
4)...fundamental da política externa que saiu (ainda que parcialmente) das mãos do Itamaraty.
Da mesma forma, a redemocratização trouxe desafios à diplomacia: a política externa passou a sofrer pressão da sociedade civil, sindicatos, empresariado, evangélicos.
Aos poucos... 👇
5)...a política externa tornou-se + relevante para a opinião pública e, como consequência, + politizada.
A sobreposição (e concorrência) entre política interna e externa atrapalhou a coerência e linearidade da ação internacional do 🇧🇷.
Outrora criadores de uma narrativa...👇
6)...grandiloquente sobre o lugar do 🇧🇷 no "concerto das nações", a diplomacia passou a reagir à maneira como o noticiário internacional retratava o país.
E o crescente protagonismo presidencial submeteu o MRE, naturalmente, aos interesses pessoais, políticos e partidários...👇
7)...do presidente do momento.
C/o aprofundamento da democracia, a tão celebrada "política de Estado" feita pelos diplomatas foi, aos poucos, normalizando-se em política de governo.
Outros ministérios, agências públicas e governos locais passaram a jogar o jogo internacional 👇
8) De formulador, o Itamaraty passou a ser coordenador da política externa. Foi tragado pelas disputas burocráticas, orçamentárias, legislativas.
No governo @LulaOficial, dividiu espaço com os interesses históricos do PT.
No governo @dilmabr, foi eclipsado pelo desinteresse 👇
9)...presidencial pela política externa, perdendo espaço na Esplanada.
No governo @MichelTemer, o MRE foi inicialmente entregue às ambições eleitorais de @joseserra_.
Sob @jairbolsonaro, a diplomacia foi substituída por uma política externa populista, familiar e conspiratória👇
10) Todas essas transformações inauguraram, na feliz expressão do amigo @dbelemlopes, uma política externa pós-diplomática.
Hoje, a posição (e a imagem) do Brasil no mundo está condicionada cada vez menos ao que fazem os diplomatas, e cada vez mais a como se portam governos 👇
11)...diante dos desafios globais. A política externa é uma política pública cujo sucesso está condicionado a outras políticas públicas.
A digressão foi longa, mas se justifica: a troca do chanceler foi bem-vinda. Mas ela não é suficiente. O novo ministro, sozinho, não mudará 👇
12)...a essência do governo Bolsonaro: a incompetência, o projeto reacionário de destruição institucional, o autoritarismo mambembe e os delírios persecutórios do núcleo famili-ciano do presidente.
Não mudará os sinais terríveis dados pelo governo brasileiro em diversas áreas 👇
19) O chanceler terá muito trabalho pra ajudar o 🇧🇷.
Deverá combater as pressões vindas do próprio governo e trabalhar junto a governadores, congressistas e sociedade p/mitigar os efeitos domésticos e globais da nossa catástrofe sanitária e ambiental.
Sorte é o que lhe desejo.
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Muita gente negando que o titio @elonmusk seja de extrema direita. "Ele só está defendendo a liberdade de expressão!", dizem.
Não é sobre liberdade, mas sobre ideologia. Nesse campo, Musk vem jogando pela direita de maneira cada vez mais aberta. Vamos falar disso em 10 exemplos?
O mito da liberdade de expressão já foi elegantemente derrubado por esse fio do @XadrezVerbal e outros tantos que comentaram sobre as inconsistências do dono do antigo Twitter.
1. Ainda em 2020, Musk fez um tweet jocoso sobre o golpe que destituiu Evo Morales na Bolívia. "Vamos dar golpe em quem a gente quiser! Lidem com isso", disse o dono da Tesla. O posicionamento foi entendido como legitimação de intervenção estrangeira por recursos (no caso, lítio)
Acabei de ouvir o discurso de Lula na ONU. Li mais cedo, meio correndo, mas agora posso comentá-lo com calma.
A impressão geral é uma só: foi um ótimo discurso, de estadista. Há muito tempo um presidente brasileiro não se posicionava tão claramente diante dos problemas globais.
1. E, vejam, não estou falando somente das falas constrangedoras (e muitas vezes mentirosas) de Bolsonaro.
Temer, e sobretudo Dilma, fizeram discursos acanhados, voltados para questões domésticas, sem oferecer uma leitura sofisticada da ordem global - e das posições brasileiras.
2. O discurso de Lula se organizou em 4 eixos. O primeiro, e mais importante, foi um diagnóstico dos problemas do mundo a partir da dimensão da desigualdade.
Na visão do 🇧🇷, a raiz de muitos conflitos e tragédias está na disparidade de renda e oportunidades. E faz sentido.
Sobre as recentes polêmicas de Lula a respeito da guerra na Ucrânia, vou tentar organizar um pouco a bagunça.
Um resumo do fio a seguir: o Brasil acerta nas ações, erra no discurso e, com a visita de Lavrov, se coloca (involuntariamente) numa posição complicada.
Venha comigo 👇🏼
1. Política externa sempre foi uma força de Lula como presidente: sua reputação está muito ligada à imagem que construiu em seus anos de governo.
Mas 20 anos atrás, o Brasil e o mundo eram muito diferentes. Eram desafios de outra ordem, que não exigiam que o país tomasse lados.
2. A visão brasileira era clara: a hegemonia americana era insustentável e o futuro era multipolar. O grande ativo brasileiro era saber transitar bem entre ricos e pobres, grandes e pequenos.
Nossa posição irritava, mas não antagonizava os EUA. As relações foram boas, no geral.
Quando decidi entrar pro Twitter e produzir conteúdo por aqui, em 2018, temia o julgamento de colegas acadêmicos.
Muitos acham a divulgação científica uma atividade menor, incompatível com o rigor metodológico e a complexidade dos fenômenos.
Não é verdade, claro, mas acho que explica pq parte da comunidade científica não se engaja na comunicação mais ampla com a sociedade.
Há outros fatores. Na universidade, são poucos os incentivos para atividades além de ensino e pesquisa. Zero remuneração e pouco reconhecimento.
Dar entrevistas, escrever artigos para jornal, postar nas redes sociais, oferecer cursos de extensão: tudo isso demanda uma quantidade de tempo e esforço que quase sempre vem em prejuízo da pesquisa (ou da qualidade de vida).
Muita gente não entendeu a proposta de Lula de criar um órgão para promover a paz entre Rússia e Ucrânia.
"A ONU já existe!", "isso nunca vai funcionar!", disseram os críticos quando a iniciativa foi aventada, na visita do chanceler Olaf Scholz.
O que Lula quer com essa ideia?
1. Lula entende que tem 4 anos para deixar um grande legado ao país. Ou legados, quem sabe.
O caminho + seguro é o da política externa. Diante de um país dividido, a diplomacia presidencial torna-se instrumento poderoso de legitimidade.
E o melhor: depende pouco do Congresso.
2. Ao assumir em 2003, Lula tinha minoria legislativa e governabilidade frágil. Naquele ano, visitou 30 países. Era tão querido dentro quanto fora do 🇧🇷.
Bolsonaro fez coisa parecida. Em 2019, sem maioria, fez uma agenda externa focada na guerra cultural de Trump e Netanyahu.