O esquema de abuso sexual de menores realizado pelo fundador da Casas Bahia:
Samuel Klein nasceu na Polônia, em novembro de 1923. Em 1939, ele e sua família foram levados a campos de concentração. Ele conseguiu escapar em 1944 e emigrou com a esposa e filho para o Brasil em 1952. Em São Caetano do Sul (SP), trabalhou como mascate até fundar a Casas Bahia.
A vida do “rei do varejo” é lembrada saudosamente em solo brasileiro. Após sua morte, Klein recebeu homenagens de políticos, empresários, banqueiros e jornalistas. Seu nome foi usado no batismo de ruas, edifícios e até de um instituto de trabalho social junto a crianças.
Ainda, é celebrado por ter sido um homem trabalhador e generoso com comunidades e indivíduos mais carentes; contudo, esse filantropismo teria sido motivado pela lascívia sexual de Klein, particularmente dirigida a menores, conforme descrito por excelente artigo da Agência Pública
O primeiro artigo relatando o envolvimento de Klein com jovens “garotas de programa” foi publicado pelo UOL no fim de 2020. O post evidenciava que a Casas Bahia foi condenada em, pelo menos seis causas, ao pagamento de danos morais a funcionários constrangidos pelas moças.
Os empregados descreviam situações semelhantes: adultas e jovens “bonitas”, na faixa dos 16 e 17 anos, adentravam determinada filial e exigiam a entrega de dinheiro e/ou mercadorias, geralmente munidas de bilhetes com ordens de pagamento assinados pelo próprio Samuel.
Às vezes, nem mesmo um bilhete era mostrado. Em tais casos, era comum a alegação de que teriam autorização de Klein para despedir qualquer funcionário que não as atendesse. Elas chegavam a levar mais do que o salário dos empregados. Em um caso, foram retirados R$ 150 mil.
Mais de 35 fontes, incluindo mulheres que alegam ser vítimas de crimes sexuais, advogados que as representaram, seguranças, ex-funcionários, motoristas de táxi, assistentes pessoais de Samuel, vizinhos de prédio e lojistas, foram ouvidas para a formulação da reportagem da AP.
O esquema foi conduzido em diferentes localidades: na sede da empresa, em São Caetano do Sul; em apartamentos em Santos (SP) e São Vicente (SP); em casas de veraneio em Guarujá (SP) e em Angra dos Reis (RJ); e numa mansão no condomínio Alphaville, em Barueri (SP).
Era comum que um espaço fosse reservado para os abusos: na sede, havia um quarto anexo ao seu escritório; na casa do Guarujá, uma construção nos fundos apelidada de “motelzinho”; em Angra, um iate, no qual grupos de meninas embarcavam e eram violentadas em alto-mar.
O modus operandi do esquema envolvia o aliciamento de jovens mediante promessa de ou recompensa material imediata, na forma de dinheiro ou produtos. Um dos métodos era a distribuição de dinheiro em bairros populares, quando Klein apontava as de sua preferência.
Mais comum, entretanto, era que as próprias jovens o procurassem, geralmente por recomendação de amigas ou parentes próximas, que não compreendiam a gravidade da situação, mas sabiam que Klein presenteava as menores que o encontrassem pessoalmente.
Karina Lopes Carvalhal, de 40 anos, conta que sua irmã, à época com 12 anos, a contou que poderia ganhar um tênis novo se encontrasse Klein na sede. Ademais, lhe deu um aviso: “Ká, não se assuste porque ele vai te dar um beijinho”. Por não possuir calçados próprios, ela foi.
O “beijinho” se manifestou no acariciamento dos peitos de Karina, que tinha apenas 9 anos. Ela saiu aliviada, com dinheiro e um tênis novo. Ela retornou, na esperança de receber mais bens, mas foi submetida a sua primeira exploração sexual por Klein, que ficariam rotineiras.
O motivo de haver voltado era o mesmo que de muitas outras meninas: as recompensas. A maioria delas vinha de famílias pobres — algumas sustentavam as mães com o dinheiro que recebiam —, e Samuel se aproveitava dessa situação para mantê-las em seu ciclo de exploração.
As “meninas do Samuel” eram apelidadas de “samuquetes”. Ele priorizava a juventude: tinha fetiche por desvirginar mocinhas inocentes. “Quando ele pegava uma [...] virgenzinha mesmo, nossa, ele enlouquecia. Dava carro pra família, fazia qualquer coisa”, contou uma vítima.
Uma agenciadora de Klein, Káthia Lemos, apontada como uma das “aliciadoras de meninas”, confirmou a preferência do empresário por meninas mais novas: “Era a fantasia dele”, mas negou que menores de idade frequentavam os eventos promovidos pelo varejista.
Todavia, admitiu que Klein tentou abusá-la quando ela tinha 13/14 anos e já trabalhava para ele: “Eu nunca deitei com ele. Um dia ele tentou, mas falei: ‘Você nunca mais faz isso’. E ele nunca mais tentou nada”. Além disso, ela teria aliciado dezenas de meninas para uma festa.
Num vídeo de uma festa na casa do Guarujá, em 1994, Klein é filmado agradecendo Káthia pelo esforço em organizar “essa festa maravilhosa para 150 amigas minhas”. “Ô, ô, ô, o Samuca é o terror” era repetido por diversas adolescentes e crianças de biquíni e fantasiadas.
A demora para a repercussão das denúncias e processos judiciais contra Samuel Klein foi devida ao manejo dos casos pela defesa do empresário e pela morosidade da Polícia Civil e do Ministério Público (MP) de SP em mover os inquéritos e ações que apuravam as alegações.
As ações trabalhistas, ajuizadas em face das Casas Bahia, concluíram em indenizações de R$ 10 a R$ 15 mil aos funcionários constrangidos. Nas áreas penal e cível, por outro lado, nenhuma ação contra Samuel teve êxito, pelas razões supramencionadas e pela anuência de acordos.
Um advogado, representante de seis mulheres que alegaram terem sido abusadas por Klein enquanto menores, afirmou ter fechado um acordo judicial, com pacto de confidencialidade. As moças foram indenizadas, mas foi acordado que as provas apresentadas seriam destruídas.
Essa última condição foi devida à incontestabilidade do material, que continha vídeos explícitos dos abusos sexuais das menores, incluindo os termos humilhantes que Klein dirigia a elas, afirmou o advogado. Outros acordos foram firmados, tanto judicial quanto extrajudicialmente.
Em 2010, Karina e Vanessa Carvalhal, assim como outras duas vítimas de abuso por Klein, também foram indenizadas. As irmãs afirmaram que cada uma recebeu R$ 150 mil. Em 2002, a mesma prática de pagar as denunciantes antes que o processo passasse a tramitar foi empregada.
Além de os acordos, em muitos casos, o direito das jovens exploradas prescreveu. Em outros, a defesa de Klein empregou táticas para evitar a intimação para as oitivas até que se esgotasse o prazo para sua realização, sem ações mais enfáticas da Polícia Civil ou MP.
Em 2008, um inquérito criminal foi aberto para a investigação de crimes no Estatuto da Criança e do Adolescente cometidos por Klein. O caso foi arquivado em 2014, após sua morte. Atualmente, apenas um caso tramita judicialmente, mas que também poderá ser extinto por prescrição.
Associados e ex-advogados de Klein se negaram a prestar depoimento relativamente às acusações. João da Costa Faria, que representou Klein judicialmente, apenas acusou a autora da ação em trâmite de ser uma estelionatária, sem nada para fazer e que desrespeita a memória de Samuel.
O Instituto Samuel Klein, fundado em 2014 e focado — numa perversa ironia — na educação de crianças e ao fortalecimento de vínculos com a comunidade judaica, suspendeu suas atividades após a repercussão do escândalo, conforme nota publicada em sua página:
Créditos principais: @agenciapublica 👈
Acesse também o link direto para a matéria que foi utilizada como fonte: apublica.org/2021/04/as-acu….

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