Tava passando o olho no discurso que o Putin fez ontem. Ali ele repete o que falou em outros momentos e defende essa restauração de uma "grande Rússia" - meio que uma mistura do Império dos Tsares e algo da URSS.
O argumento de "a Rússia é onde estão aqueles que são etnicamente russos é algo que ele já falou publicamente várias vezes". O que sempre vem a reboque das histórias sobre "as várias rússias" do antigo Império .
É um argumento literalmente imperial e usado na promoção do "nacional-conservadorismo" que o Putin representa. Esse discurso ganha uma organicidade internacional justamente por conseguir se mesclar à discussões sobre o imperialismo pós-Segunda Guerra, encabeçado pela OTAN.
E aqui eu digo que ficou mais fácil comprar esse absurdo discurso "defensivo" do Putin enquanto ele engaja num conflito por causa do absoluto ESTRAGO que foi a política internacional encabeçada pelos EUA nos últimos 20 anos. Vide: Afeganistão, Iraque, Síria e Líbia.
Em todos esses casos guerras foram declaradas em nome da "liberdade" e da "democracia". Afeganistão hoje está de volta ao Talibã. O Iraque pós-guerra é um país mais arrasado do que aquele sob pesadas sanções depois da guerra do Golfo.
A Síria caiu numa guerra civil (onde a parte "rebelde" era basicamente a Al Qaeda) que facilitou a ampliação da atuação da Turquia e da Rússia. A Líbia foi do país com o maior IDH do continente africano para uma zona de guerra permanente com mercados de escravos ao ar livre.
Tudo isso facilitou a emergência e o armamento de grupos terroristas, dos quais o mais notório foi o Daesh. No caso Líbio, parte significativa da força rebelde que queria depor Muammar al-Gaddafi era de fundamentalistas islâmicos, que por sua vez contaram com o apoio da OTAN.
No caso ucraniano o Euromaidan foi repetidamente vendido como uma "revolução democrática" quando na verdade serviu de plataforma para a ascensão de milícias neofascistas e neonazistas - que TAMBÉM contam com o reconhecimento oficial da Ucrânia e recebem apoio internacional.
Depois do que aconteceu na Líbia ninguém se engana mais com o caráter "defensivo" da OTAN. E não é nenhuma surpresa que os russos estejam de cabelo em pé com a possibilidade de outro vizinho se juntar à aliança.
Mas o discurso de Putin de não reconhecimento da soberania Ucraniana, mais do que o apoio e presença militar nas províncias separatistas, pode servir para que outros países se agarrem à OTAN. Pode também ajudar a tacar fogo na pilha de gasolina que está ali nos leste Europeu.
Afora isso, eu não acho que essa Rússia contemporânea tenha algo de bom a oferecer. Só não tenho nenhuma ilusão com relação às intenções de quem foi responsável por criar e manter as maiores guerras das últimas décadas.
Enfim.
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O nível das merdas da política dos EUA: hoje os Republicanos ficaram acusando o Biden de ser "fraco" e não ir pro pau com a Rússia ao mesmo tempo em que o Trump ficou elogiando as ações do Putin e dizendo que a invasão da Ucrânia foi genial. 🤡
Se tem uma coisa que eu acho surreal na política internacional da Rússia é como ela cultiva esses pólos de apoio simultaneamente nas esquerdas e nas direitas. Sei que nada disso é novidade mas é bizarro ver isso funcionando ao vivo. Haja Vladislav Surkov.
Já no caso do Partido Republicano, faz um bom tempo que os caras estão trabalhando por uma democracia nada representativa e alas próximas ao Trump falam da Rússia de Putin como um modelo. Mesma coisa com a Le Pen e mais um punhado de direitas extremas na Europa.
"Testemunhas disseram que os policiais tiraram Lucas do carro já agredindo o jovem. Imagens gravadas por quem passava pelo local mostram policiais chutando um homem negro no chão. Pouco depois, outra viatura da PM chega e pelo menos um tiro é disparado." g1.globo.com/sp/sao-paulo/n…
"Lucas tinha acabado de sair da casa da mãe e estava indo para um churrasco, de carro, junto com a esposa, os dois filhos pequenos e uma adolescente. Ele foi parado por policiais, que pediram para checar os documentos dele e do carro."
"O policial estava bem alterado mesmo, e o movimento que ele fez começou a agressão. Ele só olhou para o lado assim, e o policial perguntou o que ele estava olhando. Ele disse que não estava olhando para lugar nenhum e aí já começou a discussão e a briga"
No longínquo ano de 2018 este que vos escreve publicou um capítulo intitulado "A nova direita e a normalização do nazismo e do fascismo", dentro do excelente "O Ódio como Política" organizado pela pesqusadaora Esther Solano e publicado pela @editoraboitempo.
Era um texto pequeno, mais ou menos improvisado, que tentava versar sobre o que eu tinha aprendido em dois anos observando a organização essa "direita de internet" aqui e nos EUA - sobretudo, em torno das campanhas de Donald Trump e Bolsonaro.
A conclusão, na época, foi que essa direita já usava inúmeros artefatos do discurso nazista e fascista, e também já contava com inúmeros simpatizantes dessa ideologia em cargos ou alta evidência.
No @viracasacas dessa semana recebemos o historiador @frankthepaula para uma conversa sobre a Ucrânia. Começamos discutindo o Euromaidan, retratado pela mídia ocidental como uma “revolução democrática”, quando na realidade foi um levante neofascista. castbox.fm/episode/260---…
Consideramos as questões geopolíticas e econômicas por trás do Euromaidan e como ele resultou numa escalada de tensões entre a Ucrânia e a Rússia. Com a anexação da Crimeia pela Rússia e a tentativa de separatismo de regiões etnicamente russas a Ucrânia mergulhou num conflito.
Essa guerra, Euromaindan e o armamento de paramilitares passaram a ser usados como uma espécie de exemplo ideal do que seria uma “revolução fascista” por membros da extrema direita mundo afora - daí o “ucranizar” do neofascismo brasileiro.
Os Democratas são um partido fraco. Biden se submeteu a todo tipo de ataque absurdo quando executou o plano de retirada das tropas do Afeganistão feito pela administração Trump. Agora corre pra agradar o colunismo pró-guerra que o esfaqueou repetidamente no ano passado.
Cada vez mais engessados, e incapazes de acionar a mobilização popular que votou neles pra tentar reverter a terceiro-mundização dos EUA, os Democratas vão cavando a cova onde serão enterrados nas midterms de novembro desse ano.
Não adianta muito enviar tropas pra Europa. O colunismo pago pela Raytheon nunca vai estar satisfeito. Os Republicanos estão comendo o governo por dentro e sabotando qualquer esboço de uma agenda democrática mínima - incluindo aí a garantia do direito ao voto.
Já que passou o hype de comentar a morte do guru, vou dar aqui meus 2 centavos - e como são dois centavos de real não valem lá muita coisa. Primeiro eu começo dizendo que achei bem inocentes algumas eulogias críticas que repetiram a própria mitologia olavista.
Olavo de Carvalho não foi marginal, não foi perseguido e não fundou essa extrema-direita brasileira sozinho. Pelo contrário viveu e morreu cercado de generais, empresários, religiosos, diplomatas e outras figuras do poder. Nunca faltou quem bancasse suas aventuras.
Outra coisa lamentável foi a insistência em comparar quem operava uma espécie de seita bizarra com quem quer produzir conhecimento. Confundir farsa e intelectualidade só serve para legitimar picaretas e sofistas que traficam a mentira em troca do poder. theintercept.com/2022/01/25/ola…