Bom dia. Vou socializar aqui minha análise sobre os resultados das eleições. Lá vai:
1) Lula venceu as eleições. Nos mapas abaixo podemos perceber como a votação do candidato do PT aumentou no sudeste e norte do país ao compararmos 2018 com 2022.
2) O PT recuperou vários redutos que havia perdido para Bolsonaro em 2018. Lula venceu em 3.378 municípios (aumentando em 764 em relação a 2018) e Bolsonaro venceu e 2.192 (perdendo 660 em relação a 2018)
3) Lula obteve um recorde de votos num primeiro turno presidencial. Em termos proporcionais, foi de 17% (1989) para 48% neste ano. Lula é a principal liderança política do país.
4) Contudo, a extrema-direita se firmou como a segunda força política nacional. Não o partido de Bolsonaro (que flutua ao seu próprio interesse), mas o bolsonarismo (as forças que se articulam a partir de uma agenda extremada de direita).Esta força está localizada no centro-sul
5) O que ocorre é uma decadência importante no sudeste e o reforço de uma cultura de extrema-direita histórica no sul do país, em especial, envolvendo Paraná (que um dia foi parte de São Paulo) e Santa Catarina. A decadência econômica do sudeste abalou o PT na região.
6) Em MG, onde o PT governou o Estado e várias vezes a capital, a decadência é significativa. Nas eleições municipais de BH, a bancada do PT caiu de 7 para 2 vereadores. Nesta eleição, não conseguiu apresentar candidatos ao governo estadual e senado.
7) No RJ, a candidatura de Freixo fez um nítido movimento à direita. Mas, o PT revelou, mais uma vez, fragilidades. Vejam que há leitura sobre o perfil do eleitor, mas não há resposta adequada para falar com este eleitor. As forças de centro-esquerda procuram se situar à direita
8) No ES, o governador, do PSB, resistiu o quanto pode para seu partido não ingressar na Federação Partidária montada pelo PT. E tinha em seu secretariado lideranças vinculadas à Moro.
9) Em São Paulo, Haddad e Márcio França venceram a eleição na capital. Mas, levaram uma surra do interior paulista. A cultura interiorana no Estado é country: ostentação, crença no sucesso individual, valores ultraconservadores ou reacionários.
10) Enfim, o lulismo não perdeu as eleições, mas não consegue se achar no centro-sul do país, onde o bolsonarismo cresce. Não consegue dialogar com esta cultura da ostentação, do self-made man e da vergonha de ser pobre.
11) A polarização lulismo-bolsonarismo vem esmagando todas forças próximas ou satélites a eles. PSDB e PDT encolheram. PSTU, PCB e outras forças de esquerda são inexpressivas. O problema é que o bolsonarismo se enraizou e tem substitutos do Jair; já o lulismo...
12) Uma palavra sobre as pesquisas. Há três problemas aqui que podem ajudar a compreender o que ocorreu. Os institutos erraram na dimensão real (e movimentação) do voto de direita. Por quais motivos?
13) Um motivo é a base de dados para estratificar a amostra. Explico: uma pesquisa quantitativa se organiza por amostras que têm relação com a distribuição dos brasileiros em função do sexo (se há mais mulheres, elas fazem a maior parte da amostra), renda, região e instrução
14) Datafolha adotou como base para estratificação a PNAD de 2018. Outros institutos adotaram a PNAD 2021. Foi uma aposta. Muitos diziam que a PNAD 2021 estaria contaminada pela pandemia (desestruturação do mercado de trabalho e renda e interferência dos militares).
15) Pode ter ocorrido um problema por aí. 2018 está muito distante de 2022 e o eleitor que enfrentou a pandemia pode ter um "recall" dela em 2022, ou seja, não mudou de opinião de lá para cá. Enfim, todo pesquisador tem suas hipóteses e o resultado nunca é a verdade por inteiro
16) Outra discussão de fundo são as variáveis de estratificação de amostra. Será que conseguimos capturar o posicionamento do eleitor de direita com as variáveis clássicas (renda, sexo, instrução e região)? Será que não seria importante incluir variáveis de alinhamento cultural?
17) O fato é que para Lula vencer no primeiro turno precisaríamos ter reduzido o número de abstenções. Contudo, ficou no índice histórico das eleições presidenciais: 20%. Houve migração de eleito de Ciro para Bolsonaro e uma parcela pequena dos que declaravam voto nulo ou branco
18) Esta movimentação do eleitor que migrou para a direita se deu na passagem de sábado para domingo. É algo que ocorreu em diversas eleições recentes. Talvez, não no volume que aconteceu neste ano. O que isso nos diz? Que não basta pesquisa quantitativa.
19) Se não temos pesquisa qualitativa, não sabemos as motivações do eleitor. Perguntar quem gosta da cor azul não indica os motivos de alguns gostarem da cor em função do uniforme do seu time de futebol ou da paz que a cor lhe proporciona.
20) Conclusão: ainda não conseguimos entender bem o Brasil do século XXI. Ele é muito diferente do final do século XX, quando a maioria dos partidos de esquerda e centro-esquerda se forjaram. A cultura coletiva foi substituída pelo individualismo e o empreendedorismo.
21) Para este segundo turno, Bolsonaro está eleitoralmente atrás. Lula tem uma vantagem de 5 pontos percentuais e ficou por menos de 2 pontos para vencer no primeiro turno. O problema do centro-esquerda é mais político que eleitoral. (FIM)
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Bom dia. Para aqueles que, como eu, não gostam de muvuca, posto um fio sobre o desagradável momento de Trump com Zelensky no Salão Oval da Casa Branca. Minha intenção é sugerir que Trump não é nada parecido com a extrema-direita europeia. E não lidera para além dos EUA. Lá vai:
1) Trump, como afirmou Steve Bannon, é despreparado. Um bufão. Para Bannon, ele cumpria o papel de desmantelar a hegemonia ocidental e abrir as portas para a "fase de ouro" da humanidade, também identificada como a "Era dos Sacerdotes".
2) A cena decadente protagonizada por Trump/Vance e Zelensky foi classificada como "briga de bar" pela grande imprensa dos EUA. Imagino que o alvo é pressionar e testar a Europa. Esta é a primeira diferença do trumpismo para a extrema-direita europeia.
Bom dia. Venho alertando para um certo oba-oba que envolve o campo progressista brasileiro (em especial, a base social-militante do lulismo, que vai além do PT) com a denúncia da PGR contra Bolsonaro et caterva. O fio é sobre isso: uma explicação sobre este alerta.
1) Quanto ao julgamento pelo STF, a grande imprensa ventilou a possibilidade de tudo ser finalizado ainda neste semestre. Considero um desatino típico da linha editorial sensacionalista em busca de likes. O mais provável é a sentença ser proferida em setembro ou outubro.
2) Se minhas projeções são razoáveis quanto ao calendário de julgamento, teremos um longo intervalo de 7 a 8 meses de muita turbulência pela frente. Já se esboçam algumas frentes da ofensiva bolsonarista: uma de massas e outra política, além da jurídica.
Bom dia. Postarei um fio sobre o "equilíbrio dinâmico" da política nacional. A fala de Hugo Motta sobre o ato terrorista de 8 de janeiro gerou grande agitação nas redes sociais. Contudo, a intenção não parece ter sido muito além disso: agitação. Vamos ao fio:
1) Vou começar com a "régua ideológica" da política brasileira. Para tanto, começo diferenciando esquerda de direita e ambas do extremismo. Esquerda é denominada a força (ou forças) política que luta pela igualdade social.
2) Já a direita enfatiza a diferença entre indivíduos (forte de fracos, inteligentes de pouco inteligentes, ambiciosos de indolentes) que eles classificam como base da "liberdade individual". Por aí, direita justifica a desigualdade social como fundada na diferença.
Bom dia. Inicio um fio sobre o livro de Leonardo Weller e Fernando Limongi, “Democracia Negociada”, que trata do período que vai do final da ditadura militar à queda de Dilma Rousseff. Lá vai:
1) O livro se constitui numa ilustração da encruzilhada que vive a sociologia brasileira. No século passado, grande parte da produção sociológica voltava-se para a leitura dos pares. Já no século 21, ficou patente que ser reconhecido pelos pares não bastava.
2) Dada a banalização da carreira, sociólogos passaram a buscar o grande público, cortar os excessos em citações, adotar títulos e capas chamativas, para além dos muros das universidades e think tanks muito especializados.
Bom dia. Prometi um fio sobre os atos terroristas de 8 de janeiro. E, também, sobre a origem de certo descaso popular em relação aos riscos à nossa democracia. Acredito que a fonte para as duas situações é a mesma. Lá vai:
1) Acredito que o ponto de convergência é o legado de 300 anos de escravidão no Brasil. De um lado, forjou uma elite nacional socialmente insensível e politicamente violenta, sem qualquer traço de cultura democrática
2) Nosso empresariado é autoritário e autocrático, como demonstram tantos estudos acadêmicos. Além de majoritariamente com pouca instrução, nosso empresariado desdenha eleições e procura se impor pelos escaninhos dos parlamentos e governos
Bom ida. Começo o fio sobre o futuro presidente do Senado, Davi Alcolumbre. Mais um que tem seu poder local pavimentado pelas emendas parlamentares, a base do poder do Centrão. Lá vai:
1) Alcolumbre tem 47 anos e nasceu em Macapá. Trabalhou no comércio da família. Se elegeu vereador pelo PDT em 2000. Foi secretário de obras do município e em 2002 foi eleito deputado federal, sendo reeleito por 2 vezes. Em 2006, foi para o DEM
2) Em 2014, conseguiu a proeza de se eleger senador pelo Amapá, até então, um quase-protetorado dos Sarney. Aí começa sua saga nacional. Em 2019 é eleito presidente do Senado Federal, se reelegendo em 2022.